Paulo Afonso Garrido de Paula*
Através da Mensagem 409, de 2010, a Presidência da República encaminhou ao Congresso Nacional projeto de lei, acrescentando dispositivos ao Estatuto da Criança e do Adolescente, tendo por objeto “estabelecer o direito da criança e do adolescente de serem educados e cuidados sem o uso de castigos corporais ou de tratamento cruel ou degradante”.
Consta da exposição de motivos ao Presidente da República que “enquanto o aparato normativo vem avançando no sentido de coibir a violência praticada contra adultos, nas mais diversas formas, ainda convivemos com um quadro em que a criança e o adolescente são menosprezados, humilhados, desacreditados, ameaçados, assustados ou ridicularizados. A violência contra crianças e adolescentes tem sido, portanto, admitida, a pretexto de se constituir enquanto recurso pedagógico e educativo”.
As assertivas são de inegável procedência e apontam para a realidade da subcidadania de crianças e adolescentes, que a Constituição da República e o Estatuto da Criança e do Adolescente não conseguiram superar. Palmadas e outros expedientes causadores de dor ou desconforto são tolerados pela sociedade que ainda teima em enxergar crianças e adolescentes como meros objetos de intervenção do mundo adulto.
Assim, as violações à integridade física da criança são desculpadas sob a falsa ótica da ação pretensamente educativa, como se ensino pela dor, vexame ou constrangimento tivesse o condão de ser mais produtivo do que aquele baseado no exemplo, no repasse dos valores próprios da dignidade da pessoa humana e no convencimento.
Nenhum adulto toleraria, a pretexto de reprimenda decorrente do erro, ser admoestado com um tapa; somos, todavia, permissivos em relação à mesma violência contra a criança, notadamente no âmbito das relações familiares, escudando-nos sob o manto de uma pretensa cultura do ensino à moda antiga.
A opção pela paz, nas esferas mínimas do cotidiano, é o sinal mais claro da civilidade de um povo. Se o mundo evolui no reconhecimento da dignidade da pessoa humana, normativamente caminhando para a concepção de uma cidadania universal, sem fronteiras, onde a integridade pessoal, a liberdade, a justiça e a paz sejam atributos da existência em qualquer parte do planeta, sempre se verifica atraso em relação ao reconhecimento dos direitos fundamentais da criança.
Embora a igualdade do direito à integridade entre crianças e adultos tenha sido implicitamente proclamada no artigo 1º da Declaração dos Direitos Humanos de 1948, expressamente reconhecida pela Declaração dos Direitos da Criança de 1959 e reiterada na Convenção dos Direitos da Criança de 1.989, o Estado Brasileiro ainda carece de uma lei que a promova de forma decidida, impedindo a pretensa educação pela palmada e pela dor.
A cultura não deixa de ser uma forma de expressão de valores que se perpetuam no tempo arrimando comportamentos. Sendo desprovidos de razão, não encontrando justificativas na civilidade, devem ser coibidos pelo Estado, que tem a inquestionável obrigação de intervir na perseguição do desiderato da paz, paz que não se compraz com a indulgência às ofensas à integridade física.
E este dever é constitucional, tendo arrimo especialmente no artigo 226, § 8º, que peremptoriamente prescreve que “o Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações”. Se a lei projeta um dever-ser a proscrição de castigos corporais deve ter a eficácia de fomentar uma nova cultura, a da não-violência, contribuindo para o incondicional respeito à inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente. Assim, a iniciativa da Presidência da República deve ser louvada, propiciando ao Congresso Nacional a oportunidade de caminhar em direção à concretude do direito ao respeito.
Poderá, nesta ocasião, extirpar a idéia presente no Código Civil de 2002, herança do vetusto Código de 1916, que na educação dos filhos os pais ou responsáveis podem se socorrer dos castigos moderados, como se a pequena dor, ou o pequeno vexame, não correspondessem a ingentes experiências que marcam a moldam a existência humana. Aprender sem dor é incorporar o ambiente de paz como único propicio à solução dos conflitos, alicerce de uma sociedade sem violência.
Consta da exposição de motivos ao Presidente da República que “enquanto o aparato normativo vem avançando no sentido de coibir a violência praticada contra adultos, nas mais diversas formas, ainda convivemos com um quadro em que a criança e o adolescente são menosprezados, humilhados, desacreditados, ameaçados, assustados ou ridicularizados. A violência contra crianças e adolescentes tem sido, portanto, admitida, a pretexto de se constituir enquanto recurso pedagógico e educativo”.
As assertivas são de inegável procedência e apontam para a realidade da subcidadania de crianças e adolescentes, que a Constituição da República e o Estatuto da Criança e do Adolescente não conseguiram superar. Palmadas e outros expedientes causadores de dor ou desconforto são tolerados pela sociedade que ainda teima em enxergar crianças e adolescentes como meros objetos de intervenção do mundo adulto.
Assim, as violações à integridade física da criança são desculpadas sob a falsa ótica da ação pretensamente educativa, como se ensino pela dor, vexame ou constrangimento tivesse o condão de ser mais produtivo do que aquele baseado no exemplo, no repasse dos valores próprios da dignidade da pessoa humana e no convencimento.
Nenhum adulto toleraria, a pretexto de reprimenda decorrente do erro, ser admoestado com um tapa; somos, todavia, permissivos em relação à mesma violência contra a criança, notadamente no âmbito das relações familiares, escudando-nos sob o manto de uma pretensa cultura do ensino à moda antiga.
A opção pela paz, nas esferas mínimas do cotidiano, é o sinal mais claro da civilidade de um povo. Se o mundo evolui no reconhecimento da dignidade da pessoa humana, normativamente caminhando para a concepção de uma cidadania universal, sem fronteiras, onde a integridade pessoal, a liberdade, a justiça e a paz sejam atributos da existência em qualquer parte do planeta, sempre se verifica atraso em relação ao reconhecimento dos direitos fundamentais da criança.
Embora a igualdade do direito à integridade entre crianças e adultos tenha sido implicitamente proclamada no artigo 1º da Declaração dos Direitos Humanos de 1948, expressamente reconhecida pela Declaração dos Direitos da Criança de 1959 e reiterada na Convenção dos Direitos da Criança de 1.989, o Estado Brasileiro ainda carece de uma lei que a promova de forma decidida, impedindo a pretensa educação pela palmada e pela dor.
A cultura não deixa de ser uma forma de expressão de valores que se perpetuam no tempo arrimando comportamentos. Sendo desprovidos de razão, não encontrando justificativas na civilidade, devem ser coibidos pelo Estado, que tem a inquestionável obrigação de intervir na perseguição do desiderato da paz, paz que não se compraz com a indulgência às ofensas à integridade física.
E este dever é constitucional, tendo arrimo especialmente no artigo 226, § 8º, que peremptoriamente prescreve que “o Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações”. Se a lei projeta um dever-ser a proscrição de castigos corporais deve ter a eficácia de fomentar uma nova cultura, a da não-violência, contribuindo para o incondicional respeito à inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente. Assim, a iniciativa da Presidência da República deve ser louvada, propiciando ao Congresso Nacional a oportunidade de caminhar em direção à concretude do direito ao respeito.
Poderá, nesta ocasião, extirpar a idéia presente no Código Civil de 2002, herança do vetusto Código de 1916, que na educação dos filhos os pais ou responsáveis podem se socorrer dos castigos moderados, como se a pequena dor, ou o pequeno vexame, não correspondessem a ingentes experiências que marcam a moldam a existência humana. Aprender sem dor é incorporar o ambiente de paz como único propicio à solução dos conflitos, alicerce de uma sociedade sem violência.
*Professor de Direito da Criança e do Adolescente da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Procurador de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo, ex-presidente da ABMP (Associação Brasileira de Magistrados e Promotores de Justiça da Infância e da Juventude) e um dos co-autores do anteprojeto que deu origem ao Estatuto da Criança e do Adolescente.
Fonte: Artigo publicado no site da Rede Não bata eduque no dia 22 de julho de 2010
Excelente a exposição do Exmo. Procurador de Justiça e Professor Paulo Afonso Garrido de Paula. "Extirpar" a violência contra a criança e o adolescente é o único modo de quebrar a corrente de violência e abusos que assola o mundo de hoje. Violência gera violência, da mesma forma que tolerância gera tolerância ou generosidade gera generosidade. Saberemos do amanhã pelas escolhas que fizermos hoje.
ResponderExcluirParabéns, Cida, por lutar por um mundo melhor!
Polliana Martins assina o comentário acima.
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