28 de abr. de 2014

Era uma vez uma menina que virou palavra – entrevista co Eliane Brum

Em Meus desacontecimentos, a jornalista e escritora Eliane Brum revisita a infância e encontra ali a matéria-prima do que é feita: a escrita

Por Cristine Gentil

Que palavra poderia definir você, leitor? Seria ela composta, abstrata, adjetivo, plural? Poderia ser uma frase curtinha ou um período com um tanto de orações, cheios de sujeitos, predicados, verbos? Definir-se, investigar-se, escrever sobre si próprio não é fácil. Não foi para Eliane Brum. E olha que a jornalista, documentarista e escritora tem um histórico recheado de prêmios — mais de 40 nacionais e internacionais, não mais importantes do que os textos e os livros que a fizeram merecedora.

Depois de penetrar profundamente no mundo de tantas pessoas em seus trabalhos jornalísticos e enveredar pela ficção com um romance (Uma Duas), ela volta o olhar a si própria, mais precisamente para a menina que foi um dia — e que muito provavelmente é. Mesmo assim, ela encontra o outro. Mãe, pai, tias, avó, empregada são deliciosamente descritos no recém-lançado Meus desacontecimentos. Todos eles contribuíram para o que Eliane se tornaria: “um corpo de letras”. Ao voltar a infância para investigar como a escrita tornou-se parte indissociável de seu corpo, de sua vida e de sua história, a autora nos premia com uma prosa que é pura poesia.

A convite da Revista do Correio, Eliane comenta algumas passagens do livro. E vai além: “Nesses 25 anos de reportagem me aprimorei especialmente em escutar silêncios, expressões e entrelinhas. Mas o que busco, a grande pergunta que move a minha escuta, é compreender como cada um inventa uma vida”.

Os trechos em itálico foram extraídos do livro Meus desacontecimentos

 (Lilo Clareto/Divulgação)

“Hoje, ao lançar meus anzóis no lago nebuloso do passado, em busca de um mapa cujo único destino sou eu, percebo que escrever me salvou de tantas maneiras e também desta. Desde pequena, eu tenho muita raiva — e quase nenhuma resignação. A reportagem me deu a chance de causar incêndios sem fogo e espernear contra as injustiças do mundo sem ir para a cadeia. Escrevo para não morrer, mas escrevo também para não matar.”


É perceptível que a escrita é, para você, um caso de vida ou morte — de uma coisa e outra, na verdade. Depois dessa descoberta, em algum momento não conseguiu escrever? Já teve um bloqueio?

Sim. Esse livro é, em parte, uma busca por retomar os sentidos da palavra escrita, depois de ter tido um bloqueio. Em 2011, logo depois de enviar meu romance, Uma Duas, para a editora, eu fui fazer uma reportagem na Bolívia, em um projeto dos Médicos Sem Fronteiras (MSF) na área da doença de Chagas. Eu estava arrebentada pela escrita do romance e parti para uma exterioridade muito brutal. Estive em aldeias onde 70% das pessoas tinham Chagas, o barbeiro era um inseto-conceito onipresente e tudo isso só acontecia porque eram pobres demais para que a indústria farmacêutica se interessasse por eles. Morriam porque eram os invisíveis entre os invisíveis. Ao mesmo tempo, eram pessoas muito doces, falantes de uma língua muito delicada, que é o quéchua. Em meio à brutalidade daquela realidade, tinham um estar no mundo poético, que me capturou para sempre. Ao final da viagem, fui me despedir da família cuja história contei. Tinha me conectado muito fortemente com a filha mais nova, Sonia, de 11 anos, que também tinha Chagas. Ao me despedir, ela me agarrou pelos dois braços e disse: “Não me deixe morrer”. Eu já tinha estado em realidades ainda mais brutais, em situações-limite ainda mais acentuadas, mas esta foi a primeira vez que alguém fez este pedido para mim, diretamente para mim. Era de pessoa para pessoa, porque a morte era concreta, não uma discussão filosófica. Uma criança com medo de morrer por uma doença negligenciada é algo que faz a gente ter vergonha do mundo em que vivemos, vergonha de nós mesmos. Percebi ali que, contar a história de Sonia não seria suficiente para salvar a vida dela. Voltei para o Brasil e, pela primeira vez, paralisei. Não conseguia escrever uma linha.

Por quê?

Sempre acreditei profundamente — e continuo acreditando — na narrativa como instrumento de transformação da vida e, em especial, das realidades injustas. Mas, naquele momento, duvidei. Se escrever não a salvaria, de que adiantava escrever? Tive de fazer um profundo movimento interno para compreender que, se escrever era pouco, também era muito. Era o possível. E o possível é suficiente e insuficiente ao mesmo tempo. Caminhar sobre esse fio da navalha é, afinal, a delicadeza da vida. Depois de duas semanas de paralisia (e 7kg perdidos), nas quais nenhuma letra saiu de mim, voltei a escrever. A história de Sonia e sua família é um capítulo do livro Dignidade!, que marca os 40 anos dos MSF. Mas, a partir deste momento, passei a sentir uma necessidade profunda de buscar os sentidos da palavra escrita na minha vida. Buscar também para poder perdê-los, já que a vida é essa constante reinvenção dos sentidos. Eu já tinha escrito uma parte de Meus desacontecimentos, na qual contava o papel das pessoas anônimas na minha história. Mas, desde o meu grande confronto com a impotência, passei a ficar obcecada por entender como a palavra escrita me salvou. Mas, ao mesmo tempo que me salvou, no passado, e me salva, no presente, também me lança constantemente no vazio, me obrigando a viver uma vida viva. Me salva e também me “dessalva”, porque nada nos salva de fato. Meus desacontecimentos é o percurso dessa busca.

Que momento de uma reportagem (ou artigo ou livro) é alegria e que momento é sofrimento?

Acho que é sempre uma mistura dos dois. Sempre que escrevo, alterno epifanias e abismos. Sou um tipo dramático (riso).

“Eu sempre fui uma criança que olhava e olhava e olhava. A melhor forma de me descrever nessa primeira infância era com dois olhos castanhos observando o mundo de um canto. Acho que até hoje só mudei de tamanho.”

No livro, você voltou os olhos a si própria. É mais difícil escrever sobre a própria vida do que sobre a vida dos outros?

Acho que não. Eu tenho tanta empatia pelas pessoas cujas histórias eu conto, porque para contá-las tive de habitá-las por algum tempo, que sempre me sinto muito tomada. A diferença maior, me parece, está sendo na hora de publicar. Tem sido bem complicado, muito mais do que eu esperava que fosse. Me sinto tão nua que, em alguns momentos, não sei como sair de casa. Tipo: Se tirei a minha roupa, se até mesmo arranquei a minha pele, como me apresento ao mundo?

Você diz “Me percorri”. Esse caminho tem volta? Visitará outros momentos de sua vida?

Não sei. Tenho um projeto, mas é sobre a vida de um outro. E ainda é um projeto. Escrevo por absoluta necessidade. Por enquanto estou encerrando essa escrita dos Meus desacontecimentos, lançando o livro. A gente bota o livro no mundo e nunca sabe que caminhos o livro vai seguir, como será lido, em que se transformará. Depois, vem o vazio. É preciso viver o vazio. É dele que nasce o que precisa nascer, mas está lá no fundo do fundo.


“Dizem que meu pai quebrou um vaso do hospital ao saber do meu nascimento. Meu pai, tão sério, tão contido, quebrou. Eu era o vaso quebrado? Quinze anos depois, quando eu mesma me abri para parir uma menina loira de olhos azuis, me senti um vaso quebrado.”

 

 (Lilo Clareto/Divulgação)

Gravidez na adolescência é uma experiência (quase) indescritível. Pensa em escrever sobre esse momento da sua vida? Por que “um vaso quebrado”?
Às vezes eu escrevo sobre a experiência da gravidez e do parto, como numa coluna chamada O Bebê Alien, que está no meu livro A menina quebrada. Essa experiência, a de ganhar um corpo de mãe antes de ter um corpo de mulher, também atravessa alguns capítulos de Meus desacontecimentos, mas de forma sutil. Há muito dela na minha ficção, tanto no romance como em contos, de formas enviesadas. Acho que ela sempre estará, de alguma forma, naquilo que escrevo, porque é uma parte muito forte do que me constitui, ainda que eu vá dando outros sentidos para as minhas memórias. Por que um vaso quebrado? Porque tenho uma literalidade muito forte, quase assustadora. Só quem me conhece intimamente alcança o quanto eu misturo o corpo de letras com o corpo de carne. Quando fiz sexo e engravidei, me senti um vaso quebrado. Era uma sensação literal. A imagem estava na minha. Achava estranho que, quando me olhava no espelho, via lá uma adolescente de cabelos pela cintura — e não um vaso rompido. Levei muitos anos para perder essa autoimagem e essa sensação de ser em cacos. Um dia percebi que continuava sendo em cacos, mas esses cacos formavam um vitral. O que faz toda a diferença. Hoje, sou um vitral que está sempre mudando, mas sou um vitral.

“Com este livro, um corpo morreu, é preciso encontrar a forma de outro. Um percurso que, em mim, se faz com palavra e carne.”

Que forma (ou que palavra) tem ‘esse novo corpo’, depois do ponto final deste livro?

Ainda não sei. Esse livro está tendo um parto difícil. Andava me batendo pela casa, literalmente, porque não estava sabendo muito bem quais eram os contornos do meu corpo. Faz algumas semanas que parei. Mas ainda está muito confuso pra mim quem serei depois desse livro. Eu tinha uma expectativa de alcançar maior liberdade depois desse percurso tão fundo pelas minhas memórias de infância. Achei que teria uma possibilidade maior de reinvenção de mim mesma — e também da minha escrita. Mas a liberdade é um desejo — e é da natureza do desejo nos escapar. Ainda está tudo muito nebuloso. Talvez eu tenha uma resposta melhor daqui a alguns meses.

“Ela (a avó) era cheia de contos e eu tinha ouvidos gulosos. Desde pequena, sou capaz de permanecer horas só escutando, sem a necessidade de falar de mim mesma.”

Qual é o maior aprendizado dessa escuta atenta?

É pela escuta que alcançamos o mundo que é o outro. E eu sou fascinada pela vida dos outros. O que escuto também ilumina partes escuras de mim mesma. Embora eu escreva sobre vários assuntos, e quando escrevo sobre algum assunto estudo muito para me autorizar a abordá-lo, acho que o que eu entendo mesmo é de gente. Pode ser uma pretensão absurda dizer isso, mas acho que a escuta de gente me ensinou a conhecer gente. Nesses 25 anos de reportagem me aprimorei especialmente em escutar silêncios, expressões e entrelinhas. Mas o que busco, a grande pergunta que move a minha escuta, é compreender como cada um inventa uma vida. Com tão pouco, tão nu! Acho essa capacidade humana, a de fazer da própria vida uma ficção, de uma beleza tão pungente, que quando falo nisso me dá vontade de chorar.

“Enquanto escrevo, minha avó me observa sem nada dizer. Instalei minha escrivaninha-xerife bem ao lado de sua máquina de costura. Mantenho as linhas, as agulhas e os dedais intactos, na impecável organização que ela deixou ao morrer. Invento para mim mesma que ela se orgulha de mim. E confidencio, malvada: ‘Vó, tirei o acento do nome dele no livro que estou escrevendo. Homem como ele não merece chapéu’.”

“Minha avó descendia de uma família que falava com os mortos. Não como algo assustador ou sobrenatural, não havia fronteiras entre o mundo de cá e o de lá. Nem grandes revelações. Eram fantasmas bem domésticos.”

 

 (Lilo Clareto/Divulgação)

Você descreve sua avó de uma forma adorável. O que ela ainda conta e como “seus ouvidos gulosos” a escutam hoje?

Ah, minha avó é uma pessoa muito especial pra mim. Então, dei um jeito de ela continuar viva. Trato ela como se viva fosse. Ela vive na minha escrita, vive dentro de mim, vive ao meu redor, pela casa. Agora mesmo, ao responder sua pergunta, enchi os olhos de lágrimas aqui. Eles ainda boiam enquanto te escrevo. Porque ela teve uma vida muito bruta, como eu conto no livro. Uma vida sem palavras. E o que ela mais valorizava era a escrita, as histórias, os livros. Ela morreu antes de saber que eu viraria uma escritora. Ela morreu antes de poder ler minhas histórias. E eu queria tanto que ela tivesse sabido que eu escreveria. Então, invento que ela sabe. Sigo a tradição dos fantasmas da família, da minha maneira. Agora mesmo minha vó me olha com aquele olhar de ternura infinita que ela tinha quando me espiava. Mas ela não me conta mais histórias, agora sou eu que as conto pra ela. Hoje minha vó é uma presença. Minha casa é impregnada dela, dos seus móveis, do seus objetos, mas transformados pela minha ânsia de que a vida dela tivesse continuado, mas continuado com palavras, com desejo. Então ela dá a volta ao mundo, vive aventuras, através de mim. Transformei ela em ausência, como naquele poema do Drummond. Não falta, mas ausência. Uma ausência presente. Assim, nós duas dançamos pela casa, pelo mundo.

A morte em vida é constante na narrativa, em várias passagens do livro, e uma vivência no seu trabalho. Até que ponto há vida na morte e morte na vida?

Acho que vivemos várias vidas numa só. Ou pelo menos temos essa possibilidade. Desde que tenhamos a coragem de constantemente recriar nossos sentidos. Se os sentidos de uma vida permanecerem imutáveis, estáticos, acredito que vivemos uma vida morta. Mas, se conseguirmos perceber o que já deixou de fazer sentido e conseguirmos deixar essas partes mortas para trás, se tivermos a ousadia de aguentar ficar no vazio por um tempo, porque ser é perder-se, se enfrentarmos essa tarefa árdua que é reinventar a vida, arriscando-se ao novo e conscientes de que não há garantias, acho que essa é uma vida viva. A vida é justamente esse movimento em que aquele que é se move duvidando do que é. Assim, acho que morremos várias vezes para renascer de outras maneiras. Não acredito em outras vidas após a morte física, concreta. Acho que vivemos várias vidas nesta vida. E essa é uma possibilidade fascinante. É essa certeza, a única que temos, de que vamos morrer um dia que nos dá a perspectiva de que precisamos viver cada dia com intensidade, fazer de cada dia uma aventura nesse mundo. Não digo intensidade e aventura como algo grandioso, como ter de atravessar o Saara ou subir a parede sul do Aconcágua todo dia, mas me refiro a não perder de vista o encantamento, a delicadeza que é um dia humano. Ser capaz de olhar para o mundo, para os outros e para nós mesmos com a percepção do mistério que é tudo isso. E não adiar, porque só temos o hoje para tentar viver a melhor vida que podemos. A morte, tanto como a figura sempre presente na minha infância, como conto no livro, e a morte como algo que investiguei como repórter, por anos, me deu essa consciência. A de estar presente no dia, a de perceber a grandeza das pequenas coisas, a de me esforçar para ser o melhor que posso ser para quem está perto de mim e me transformar em letras com o máximo de verdade possível na minha escrita, que é minha expressão no mundo. A consciência da morte me ajuda a ter uma vida viva.

“Eu era rodeada de mulheres bondosas demais, e tristes, muito tristes. No mundo onde eu nasci ser mulher era suportar a vida. O fardo, a cruz, dia após dia. Essas eram as santas, as putas não me foram apresentadas.”

No mundo em que vive hoje, as mulheres são felizes? Os fardos não são mais tão pesados?

Não sei se é uma questão de felicidade. Hoje a felicidade virou um produto de consumo, e nesse formato ela não me interessa. Acho que os desafios de criar uma vida são sempre grandes. E são maiores para uma mulher. Parte desse desafio, hoje, é não se deixar encaixotar numa narrativa padrão sobre o que é ser uma mulher, que vai desde a quantidade de sexo por semana até a forma de se vestir. Não se deixar encaixotar num padrão do que é ter sucesso na vida. Não deixar que os outros definam como a gente vai viver. Dá muito mais trabalho, porque tudo isso tem de ser construído cotidianamente. A liberdade demanda enorme esforço, porque nos obriga a questionar nossas escolhas o tempo todo, assim como a assumir nossas perdas e equívocos, porque não há mais ninguém para culpar, já que nos responsabilizamos totalmente por nós mesmos. Dá muito trabalho não se deixar conduzir por dogmas, assumir o protagonismo da própria vida, habitar-se. Não é um caminho fácil, porque tudo está em aberto. Mas acho que vale a pena. E acho que esse caminho é hoje uma possibilidade para um número muito maior de mulheres. Na época da minha avó e também da minha mãe e das minhas tias os limites eram muito mais cimentados e os espaços, mais apertados. Um casamento era para sempre, uma mulher casar e não ter filhos era inaceitável, trabalhar fora e se expressar fora de casa era uma conquista para poucas, o sexo era extremamente reprimido. Acho que avançamos, sim, mas insistimos em criar padrões que nos prendem e confinam. É preciso se perguntar de onde vem o fardo que supostamente carregamos. Será que ele é mesmo nosso? Será que não somos nós que o inventamos ou que pelo menos o aceitamos? Acho que viver para descobrir como se quer viver é, sim, uma possibilidade. E é também um ato de resistência. Mas tem um custo, que muitas mulheres e também homens não querem pagar. Nesse caminho, sabe-se que não há garantias. De fato, em nenhum caminho há garantias. Mas, no caminho em que se busca a liberdade de ser e de se inventar, não há mais a possibilidade de ilusão de garantia e também de segurança. Acho que muitos reclamam do que os aprisiona, mas, de fato, não querem se arriscar porque acreditam não conseguir viver sem a ilusão do controle sobre a vida.

Uma vez, num artigo sobre uma discussão sobre prostituição na França, você disse que a prostituição é um debate que precisa ser enfrentado no Brasil. Continuamos no mesmo patamar?

 (Divulgação)

Continuamos. E a França, por exemplo, só regride. Acho impressionante como as pessoas têm dificuldade, ainda hoje, de respeitar a escolha de uma mulher por ser prostituta. Aí vão me dizer que muitas não tiveram escolha. É verdade. Se formos por aí, podemos fazer uma pesquisa em todas as profissões para ver quem de fato acha que teve total escolha sobre o que faz. Mas isso é bem diferente de trabalho escravo. No caso das trabalhadoras domésticas, por exemplo, ninguém nunca se preocupou se limpar, passar, cozinhar e cuidar dos filhos dos outros era a sua escolha de vida. É muita hipocrisia, quase má fé. E há também as mulheres que escolheram, as que gostam, as que se realizam na prostituição. Estas incomodam muito mais essa sociedade ainda tão reprimida. (Como assim, uma mulher é tão dona do seu corpo que inclusive vende uma relação sexual?) Enquanto permanece esse embate, extremamente perverso, as prostitutas ficam na marginalidade, sem direito a ter condições melhores e mais seguras de trabalho, sujeitas à violência, desprotegidas. A quem isso serve? A questão de fundo ainda é o controle sobre o corpo das mulheres. E especialmente sobre a sexualidade. Basta ver o quanto a “vagina”, mesmo como imagem e como palavra, ainda é censurada, como aconteceu tempos atrás, na transmissão de uma palestra na Academia Brasileira de Letras e também no título do livro de Naomi Wolf, na livraria virtual da Apple. Escrevo bastante sobre isso na minha coluna. Toda essa questão do parto e mesmo do número absurdo de cesarianas no Brasil é uma questão do controle e intervenção no corpo da mulher. O parto normal é tão marginalizado no sistema de saúde brasileiro por vários motivos, mas também porque passa, literalmente, por uma vagina. Enfim, cada um desses temas têm seu histórico e suas particularidades, mas é atravessado pela questão do controle sobre os corpos pelo Estado.

“As cartas de amor da minha avó provam que não há reparação para a palavra escrita. Essa foi uma lição definitiva para a neta que um dia se tornaria repórter e contaria histórias de gente. Eu sempre soube que, se errasse — e algumas vezes errei —, não haveria maneira de reparar.”

Qual o pior erro que alguém (repórter, editor…) pode cometer no exercício do jornalismo, em especial quando contamos histórias de pessoas?

Acho que o maior erro, ou o erro de base, é não escutar. Quando me refiro a escutar, não me refiro a algo simples. Escutar qualquer um escuta. Mas escutar, de fato, é uma escolha profunda. Uma escolha de vida, mesmo. Essa escuta a que me refiro, mesmo surdos, no sentido da não audição, são capazes de fazer. Pessoalmente, não acredito que seja possível fazer uma reportagem sem fazer a escolha da escuta. Escutar é empreender o movimento arriscado de se esvaziar de si, de suas visões de mundo, de seus preconceitos, de seus julgamentos, para ir o mais vazio possível em direção ao mundo do outro, ao mundo que é o outro. E depois fazer esse caminho de volta preenchido por uma outra experiência de estar no mundo. Escutar é se desabitar por um momento para ser habitado pelo outro. É isso que eu chamo de escuta e acho que essa escuta é o principal instrumento de trabalho do repórter. Nosso primeiro ato, na reportagem, é interno. Antes de encarar as ruas concretas do mundo de fora, onde vivem as pessoas e as histórias, cada uma delas um mundo singular, precisamos fazer esse gesto de atravessar a rua de nós mesmos. Se a reportagem não começa assim, acho que não a alcançamos. Podemos geograficamente atravessar o mundo, viajar até o Sudão do Sul, por exemplo, mas voltaremos de lá contando sobre o que já sabíamos, contando sobre teses prévias, contando sobre nossa ideia prévia sobre aquele país, sobre nós mesmos. Vamos até bem longe sem sair do lugar. Porque não fizemos o movimento essencial da escuta, que exige muito, mas muito mesmo, de nós.

“Sou uma moradora de rua com casas temporárias carregando pela vida uma bagagem da qual não consigo nem quero me livrar”

Podemos descrevê-la de certa forma como uma andarilha que fixou residência na transitoriedade das histórias? Nesse caso, que bagagem é fundamental levar de um lugar a outro, de uma história a outra?

Que linda essa descrição. Fico honrada com ela. Acho que, sim, eu vivo nesse movimento, sou um ser em trânsito. A bagagem sou eu mesma. E às vezes ela é pesada. Nesse livro, busquei reconstituir um corpo de sentidos para deixá-lo para trás, num movimento constante pela busca da liberdade de ser. Espero sempre que a bagagem que sou eu mesma fique menos pesada. Como sou muito literal, perdi sete quilos nos últimos meses de escrita. Essa é uma curiosidade. Sempre que perco peso por conta de alguma experiência transtornante da escrita, perco sete quilos de uma vez. Aconteceu quando voltei da Bolívia, e aconteceu agora de novo. Parece que volto a um certo peso corporal. Neste livro também perdi cinco teclas do meu teclado – três vogais e duas consoantes. Por ordem: e, a, o, s, t. Eu ia escrevendo, e elas iam se suicidando (risos). O pessoal da assistência técnica da Apple achou muito divertido. Por fim, quando descobri que, por um erro de finalização editorial haviam sido suprimidas cerca de duas linhas do meu livro, o que levou a uma reimpressão imediata, perdi um dente. Sempre que escrevo, perco alguns pedaços literais pelo caminho. Como você vê, estou mais leve. (risos)

Além da escrita, o que é capaz de fixá-la no mundo, de fornecer equilíbrio e serenidade? Espiritualidade, meditação, amigos, família?

A coisa que mais me fixa no corpo (e portanto no mundo) é o sexo. Acho que sexo é o que me deixa mais presente em mim mesma. E o amor, que me fixa no outro de outra maneira. Preciso muito tocar as pessoas, quando abraço alguém, abraço mesmo. Estou sempre acariciando as pessoas que amo, seja marido, filha, amigos. Meus lançamentos de livros duram horas porque eu toco em todo mundo. Mas todo dia eu preciso sair de mim por algum tempo, para me centrar de novo, porque a realidade é um pouco excessiva pra mim. Todo dia eu preciso ler literatura, entrar no mundo de um outro, um mundo que ecoa em mim, mas é de um outro. E, ultimamente, ando viciada em seriados. Totalmente viciada. Posso falar horas sobre seriados. É um outro jeito de sair da realidade, entrando na realidade pela ficção. Vejo pelo menos um episódio por dia de algum seriado pelo qual estou obcecada no momento. Então, livros, seriados e cinema fazem parte do meu cotidiano. Se eu não tiver esse espaço diário, tenho dificuldade de me centrar. Também faço muitas coisas com o corpo. Pilates e dança, principalmente. Sem essas encarnações cotidianas minha cabeça escapa e é difícil trazê-la de volta.


Enviado pela generosa Helenilza Texeira, que sempre me envia presentes preciosos.

Fonte: Correio Brasiliense – publicação: 27/04/2014 08:00 Atualização: 25/04/2014 16:05

27 de abr. de 2014

Beba a delícia da manhã

Amanhecer no Jalapão

 

"Não aprofundes o teu tédio. Não te entregues à mágoa vã. O próprio tempo é o bom remédio: bebe a delícia da manhã."
Manuel Bandeira

 


 

Manhã de Carnaval – Trilha sonora do filme “Orfeu Negro”

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Dedico essa postagem ao amigo Rezende Bruno Avelar


 

Foto do amanhecer no Jalapão pacturada no site VIAGENS CINEMATOGRÁFICAS

O filme foi inspirado na peça de Vinícius, 'Orfeu Negro' levou o Oscar e a Palma de Ouro

25 de abr. de 2014

Seminário de Políticas Públicas – Goiânia 28 a 30 de abril

SeminarioPP

O Conselho Regional de Psicologia 9ª Região realiza o IV Seminário de Psicologia e Políticas Públicas, nos dias 28, 29 e 30 de abril, na Unip, em Goiânia (GO). Este ano o tema será “Desafios e conquistas na 2ª década do século XXI”.

A comissão organizadora do evento quer superar o grande público que compareceu na edição passada. “Este ano nós ampliamos a programação para atender um maior número de profissionais e estudantes de Psicologia. O nosso objetivo é o acesso ao conhecimento das práticas psicológicas relacionadas às políticas públicas”, explica o presidente do CRP-09, Wadson Arantes Gama.

 

As inscrições já estão abertas e são gratuitas. Haverá certificado de participação.Para se inscrever, basta acessar os links abaixo.

 

Atenção! Haverá atividades simultâneas! Para se inscrever nos Grupos de Discussão basta clicar no nome da atividade que está no quadro abaixo da programação.

Inscrições para a abertura do Seminário e Conferências (todos devem fazer) – clique aqui.

Programação

UNIP - Rodovia BR 153, Km 503, Fazenda Botafogo, Goiânia - GO, CEP 74845-090

28 de abril – Teatro da UNIP

19h – 20h30 - Abertura com o Vice-Presidente do CFP, Rogério de Oliveira – Conferência “Desafios e Conquistas na 2ª Década do Século XXI"

20h30 – 22h - Mesa Redonda: Políticas Públicas para mulheres: desafios de práticas psicológicas em saúde mental - Professoras da Unip/GO Ionara Vieira de Moura Rabelo (CRP-09/1609) e Cristina Vianna (CRP-09/2862)

29 de abril

Período Matutino – Teatro da UNIP

8h30 – 10h – Conferência “A atuação do psicólogo na política pública da Saúde - Atenção Básica” - Dr. Gilberto David Filho, representante do Departamento de Atenção Básica do Ministério da Saúde

10h15 – 11h45 – Conferência “A atuação do psicólogo na política pública da Educação Básica”

Período Vespertino – Teatro da UNIP

14h – 15h – Mesa Redonda “A atuação do psicólogo na política pública do Trânsito” – Gardênia de Souza Furtado Lemos – CRP 09/2140, representante do DETRAN/GO e representante do Programa Educando e Valorizando a Vida - UEG
15h20 – 17h – Grupos de Discussão em Salas de Aula (quadro abaixo)

30 de abril

Período Matutino – Teatro da UNIP

8h30 – 10h – Mesa Redonda “A atuação do psicólogo na política pública da Justiça” – Saulo Bezerra (promotor) e Orion Tadeu de Amorim (psicólogo – CRP 09/0523)

10h15 – 11h45 – Conferência “A atuação do psicólogo na política pública da Assistência” – Marcela Norman, representante do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS).

Período Vespertino – Teatro da UNIP

14h – 15h – Conferência “A atuação do psicólogo na política pública do Esporte” – Dra. Adriana Bernardes Pereira - CRP 09/1944
15h20 – 17h – Grupos de Discussão em Salas de Aula (quadro abaixo)

 


Divulgando o Grupo de Discussão

Ferramenta de Diálogos – Aquário “Práticas psicológicas de grupo em políticas públicas”.

Wadson Arantes Gama (CRP-09/1523) e Cida Alves (CRP-09/1289)

Local: sala 2
Horário: das 15h20 – 17h


 

Acesse o QUADRO DE GRUPOS DE DISCUSSÃO do período vespertino (29 e 30/04) AQUI

Informações Úteis:

Afim de auxiliar os participantes do Seminário que não moram em Goiânia, a estudante de Psicologia da Unip, Jordana Matias, destacou algumas informações úteis sobre locais de hospedagem, alimentação e transporte público próximos ao local do evento.

Confira:

"Ao sair da Unip, atravessando a BR-153, encontra-se a rua Recife (antes da Av.Segunda Radial). Nessa rua existem dois restaurantes. O primeiro é todo vermelho por fora e mais a frente localiza-se o outro. O primeiro tem desconto para estudantes da Unip e imagino que o segundo possa ter também.

Depois de atravessar a rodovia e ter passado o restaurante vermelho, virando à direita (Rua Vitória) e seguindo em direção ao Shopping Flamboyant, há uma pizzaria e o restaurante La Biritas, que é um restaurante que fica em uma esquina, ao final desta rua. Em frente ao Shopping Flamboyant existe vários restaurantes e também o Oitis Hotel (Rua Terezina). Ao lado oposto do Shopping, fica o Comfort Suites Flamboyant (Av. Dep. Jamel Cecílio).
Em relação aos ônibus que passam pelo Shopping Flamboyant, destaco as seguintes linhas:

* 193-Alto da Glória - Centro - via Flamboyant.

* 325 Aruanã, Flamboyant.

* 021 - Flamboyant - terminal Praça da Bíblia.

* 023 - Flamboyant - Campinas (Passa na Praça Tamandaré - Setor Oeste).

* 026 - Terminal Bandeiras, Flamboyant, via T-10."

Veja mais:

Para acessar site com indicações de linhas de ônibus, clique aqui.

Site com indicações de hotéis em Goiânia, acesse aqui.

 

 

21 de abr. de 2014

Morreu Hurricane Carter: o pugilista que enfrentou a injustiça americana

hurricanecarter

“O ex-pugilista Rubin “Hurricane” Carter, que passou quase vinte anos da sua vida preso por três assassinatos que não cometeu e cuja história inspirou uma célebre música de Bob Dylan, morreu este domingo em Toronto. Hurricane Carter, como era conhecido, faleceu aos 76 anos depois uma longa luta contra um cancro na próstata”.

Veja reportagem completa AQUI

 

No curso da campanha pela libertação de Rubin Hurricane Carter, Bob Dylan compôs a extraordinária canção que vocês podem apreciar no clip abaixo

 


“O sistema penal hoje é predominantemente um sistema racista”

“Eu tenho dito que o sistema penal hoje é predominantemente um sistema racista. E quando eu digo que é um sistema racista, não é necessariamente que aquele profissional que está atuando aí, delegado, promotor, juiz, que ele seja na sua essência um racista, que ele não gosta de negro. Não é isso. É que ele opera dentro de um sistema que ele não se da conta de que é racista. E ele cai na vala comum da atuação funcional dele. O que isso significa dizer? Você tem um sistema em que, de cada três mortos hoje no Brasil, duas são de negros. Você tem um sistema em que segundo estudos do IBGE, de 2013 a 2016 715 jovens entre 12 a 18 anos vão morrer assassinados [por mês], sendo que todos eles são negros. 715 pessoas por mês significa dizer três aviões Boeing caindo com cerca de duzentos e poucos negros todo mês e nós não nos damos conta disso. (...) isso é um extermínio, isso é uma política de extermínio. E que as pessoas dizem que isso não é racismo, isso é um problema social, isso é um problema que não tem nada a ver com racismo. Não tem a ver, quando essa moça é jogada na viatura, ela é jogada como um porco. Eles levaram ela como ela não fosse um ser humano. E isso ocorre todos os dias! O ator que nós acabamos de ver, o Vinicius Romão, ele foi tratado numa situação que se fosse um indivíduo branco não agiriam daquela forma. Ele estava no lugar errado na hora errada (...)” (Paulo Rangel,  desembargador do TJ-RJ - programa 3a1 da TV Brasil).

 

O programa 3 a 1 discute o racismo enraizado na sociedade brasileira

19 de abr. de 2014

“La palabra más hermosa” - Margaret Mazzantini

“Nada puede silenciar la palabra más hermosa

 


Aurora
Ventre
Mar
Ternura
Azul
Poesia
Sereno
Jasmim
Redemoinho
Saudade
Luar....


Alrededor
Niña
Beso
Manzana
Corazón
Sábanas
Rojo
Coraje
lluvia
Gracias
Amistad...

No puedo elegir una, hay muchas palabras hermosas en mi pecho.

 

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Un regalo para los amigos que hice en Barcelona

Visite “La palabra más hermosa” de Margaret Mazzantini en PDF haciendo clic en la foto del libro de arriba

 


Sinopsi el libro de Margaret Mazzantini

Margaret MazzantiniEs de noche en Roma, todos duermen, pero el teléfono suena de repente? Una voz que llega de lejos invita a Gemma a un viaje a Sarajevo, la ciudad donde nacieron y murieron las emociones más hondas de su vida. Allí, entre los estallidos de una guerra cruel e inútil, hace dieciséis años nació Pietro, un niño que ahora la llama mamá y es tan hermoso, sano y egoísta como cualquier otro adolescente. Pietro no conoce bien su origen y no sabe que en las calles estrechas de aquella ciudad sitiada Gemma vivió una historia de amor de esas que se te pegan a los huesos y te cambian para siempre. Ahora, de vuelta a aquellas tierras, madre e hijo tendrán que enfrentarse a un pasado que esconde secretos, a unos cuerpos que aún llevan las huellas de un dolor antiguo, pero a lo largo del viaje también aprenderán palabras nuevas, esas que nos sirven para dar un sentido a nuestros errores y seguir apostando por un nuevo comienzo para todos.


Fonte: El Corte Inglés

Foto capturada no site ALFAGUARA

 

18 de abr. de 2014

La soledad de América Latina - Gabriel García Márquez

 

“No obstante, los progresos de la navegación que han reducido tantas distancias entre nuestras Américas y Europa, parecen haber aumentado en cambio nuestra distancia cultural. ¿Por qué la originalidad que se nos admite sin reservas en la literatura se nos niega con toda clase de suspicacias en nuestras tentativas tan difíciles de cambio social? ¿Por qué pensar que la justicia social que los europeos de avanzada tratan de imponer en sus países no puede ser también un objetivo latinoamericano con métodos distintos en condiciones diferentes? No: la violencia y el dolor desmesurados de nuestra historia son el resultado de injusticias seculares y amarguras sin cuento, y no una confabulación urdida a 3 mil leguas de nuestra casa. Pero muchos dirigentes y pensadores europeos lo han creído, con el infantilismo de los abuelos que olvidaron las locuras fructíferas de su juventud, como si no fuera posible otro destino que vivir a merced de los dos grandes dueños del mundo. Este es, amigos, el tamaño de nuestra soledad.


Sin embargo, frente a la opresión, el saqueo y el abandono, nuestra respuesta es la vida. Ni los diluvios ni las pestes, ni las hambrunas ni los cataclismos, ni siquiera las guerras eternas a través de los siglos y los siglos han conseguido reducir la ventaja tenaz de la vida sobre la muerte. Una ventaja que aumenta y se acelera: cada año hay 74 millones más de nacimientos que de defunciones, una cantidad de vivos nuevos como para aumentar siete veces cada año la población de Nueva York. La mayoría de ellos nacen en los países con menos recursos, y entre éstos, por supuesto, los de América Latina. En cambio, los países más prósperos han logrado acumular suficiente poder de destrucción como para aniquilar cien veces no sólo a todos los seres humanos que han existido hasta hoy, sino la totalidad de los seres vivos que han pasado por este planeta de infortunios.


Un día como el de hoy, mi maestro William Faullkner dijo en este lugar: "Me niego a admitir el fin del hombre". No me sentiría digno de ocupar este sitio que fue suyo si no tuviera la conciencia plena de que por primera vez desde los orígenes de la humanidad, el desastre colosal que él se negaba a admitir hace 32 años es ahora nada más que una simple posibilidad científica. Ante esta realidad sobrecogedora que a través de todo el tiempo humano debió de parecer una utopía, los inventores de fábulas que todo lo creemos, nos sentimos con el derecho de creer que todavía no es demasiado tarde para emprender la creación de la utopía contraria. Una nueva y arrasadora utopía de la vida, donde nadie pueda decidir por otros hasta la forma de morir, donde de veras sea cierto el amor y sea posible la felicidad, y donde las estirpes condenadas a cien años de soledad tengan por fin y para siempre una segunda oportunidad sobre la tierra”.

Gabriel García Márquez

 

Acesse o discurso La soledad de América Latina traduzido para o português AQUI

 


 

Gabo y las mariposas amarillas

Discurso de aceptación del Premio Nobel 1982 - Texto completo

 

La soledad de América Latina

Antonio Pigafetta, un navegante florentino que acompañó a Magallanes en el primer viaje alrededor del mundo, escribió a su paso por nuestra América meridional una crónica rigurosa que sin embargo parece una aventura de la imaginación. Contó que había visto cerdos con el ombligo en el lomo, y unos pájaros sin patas cuyas hembras empollaban en las espaldas del macho, y otros como alcatraces sin lengua cuyos picos parecían una cuchara. Contó que había visto un engendro animal con cabeza y orejas de mula, cuerpo de camello, patas de ciervo y relincho de caballo. Contó que al primer nativo que encontraron en la Patagonia le pusieron enfrente un espejo, y que aquel gigante enardecido perdió el uso de la razón por el pavor de su propia imagen.

Este libro breve y fascinante, en el cual ya se vislumbran los gérmenes de nuestras novelas de hoy, no es ni mucho menos el testimonios más asombroso de nuestra realidad de aquellos tiempos. Los Cronistas de Indias nos legaron otros incontables. Eldorado, nuestro país ilusorio tan codiciado, figuró en mapas numerosos durante largos años, cambiando de lugar y de forma según la fantasía de los cartógrafos. En busca de la fuente de la Eterna Juventud, el mítico Alvar Núñez Cabeza de Vaca exploró durante ocho años el norte de México, en una expedición venática cuyos miembros se comieron unos a otros y sólo llegaron cinco de los 600 que la emprendieron. Uno de los tantos misterios que nunca fueron descifrados, es el de las once mil mulas cargadas con cien libras de oro cada una, que un día salieron del Cuzco para pagar el rescate de Atahualpa y nunca llegaron a su destino. Más tarde, durante la colonia, se vendían en Cartagena de Indias unas gallinas criadas en tierras de aluvión, en cuyas mollejas se encontraban piedrecitas de oro. Este delirio áureo de nuestros fundadores nos persiguió hasta hace poco tiempo. Apenas en el siglo pasado la misión alemana de estudiar la construcción de un ferrocarril interoceánico en el istmo de Panamá, concluyó que el proyecto era viable con la condición de que los rieles no se hicieran de hierro, que era un metal escaso en la región, sino que se hicieran de oro.

La independencia del dominio español no nos puso a salvo de la demencia. El general Antonio López de Santana, que fue tres veces dictador de México, hizo enterrar con funerales magníficos la pierna derecha que había perdido en la llamada Guerra de los Pasteles. El general García Moreno gobernó al Ecuador durante 16 años como un monarca absoluto, y su cadáver fue velado con su uniforme de gala y su coraza de condecoraciones sentado en la silla presidencial. El general Maximiliano Hernández Martínez, el déspota teósofo de El Salvador que hizo exterminar en una matanza bárbara a 30 mil campesinos, había inventado un péndulo para averiguar si los alimentos estaban envenenados, e hizo cubrir con papel rojo el alumbrado público para combatir una epidemia de escarlatina. El monumento al general Francisco Morazán, erigido en la plaza mayor de Tegucigalpa, es en realidad una estatua del mariscal Ney comprada en París en un depósito de esculturas usadas.

Hace once años, uno de los poetas insignes de nuestro tiempo, el chileno Pablo Neruda, iluminó este ámbito con su palabra. En las buenas conciencias de Europa, y a veces también en las malas, han irrumpido desde entonces con más ímpetus que nunca las noticias fantasmales de la América Latina, esa patria inmensa de hombres alucinados y mujeres históricas, cuya terquedad sin fin se confunde con la leyenda. No hemos tenido un instante de sosiego. Un presidente prometeico atrincherado en su palacio en llamas murió peleando solo contra todo un ejército, y dos desastres aéreos sospechosos y nunca esclarecidos segaron la vida de otro de corazón generoso, y la de un militar demócrata que había restaurado la dignidad de su pueblo. En este lapso ha habido 5 guerras y 17 golpes de estado, y surgió un dictador luciferino que en el nombre de Dios lleva a cabo el primer etnocidio de América Latina en nuestro tiempo. Mientras tanto 20 millones de niños latinoamericanos morían antes de cumplir dos años, que son más de cuantos han nacido en Europa occidental desde 1970. Los desaparecidos por motivos de la represión son casi los 120 mil, que es como si hoy no se supiera dónde están todos los habitantes de la ciudad de Upsala. Numerosas mujeres arrestadas encintas dieron a luz en cárceles argentinas, pero aún se ignora el paradero y la identidad de sus hijos, que fueron dados en adopción clandestina o internados en orfanatos por las autoridades militares. Por no querer que las cosas siguieran así han muerto cerca de 200 mil mujeres y hombres en todo el continente, y más de 100 mil perecieron en tres pequeños y voluntariosos países de la América Central, Nicaragua, El Salvador y Guatemala. Si esto fuera en los Estados Unidos, la cifra proporcional sería de un millón 600 mil muertes violentas en cuatro años.

De Chile, país de tradiciones hospitalarias, ha huido un millón de personas: el 10 por ciento de su población. El Uruguay, una nación minúscula de dos y medio millones de habitantes que se consideraba como el país más civilizado del continente, ha perdido en el destierro a uno de cada cinco ciudadanos. La guerra civil en El Salvador ha causado desde 1979 casi un refugiado cada 20 minutos. El país que se pudiera hacer con todos los exiliados y emigrados forzosos de América latina, tendría una población más numerosa que Noruega.

Me atrevo a pensar que es esta realidad descomunal, y no sólo su expresión literaria, la que este año ha merecido la atención de la Academia Sueca de la Letras. Una realidad que no es la del papel, sino que vive con nosotros y determina cada instante de nuestras incontables muertes cotidianas, y que sustenta un manantial de creación insaciable, pleno de desdicha y de belleza, del cual éste colombiano errante y nostálgico no es más que una cifra más señalada por la suerte. Poetas y mendigos, músicos y profetas, guerreros y malandrines, todas las criaturas de aquella realidad desaforada hemos tenido que pedirle muy poco a la imaginación, porque el desafío mayor para nosotros ha sido la insuficiencia de los recursos convencionales para hacer creíble nuestra vida. Este es, amigos, el nudo de nuestra soledad.

Pues si estas dificultades nos entorpecen a nosotros, que somos de su esencia, no es difícil entender que los talentos racionales de este lado del mundo, extasiados en la contemplación de sus propias culturas, se hayan quedado sin un método válido para interpretarnos. Es comprensible que insistan en medirnos con la misma vara con que se miden a sí mismos, sin recordar que los estragos de la vida no son iguales para todos, y que la búsqueda de la identidad propia es tan ardua y sangrienta para nosotros como lo fue para ellos. La interpretación de nuestra realidad con esquemas ajenos sólo contribuye a hacernos cada vez más desconocidos, cada vez menos libres, cada vez más solitarios. Tal vez la Europa venerable sería más comprensiva si tratara de vernos en su propio pasado. Si recordara que Londres necesitó 300 años para construir su primera muralla y otros 300 para tener un obispo, que Roma se debatió en las tinieblas de incertidumbre durante 20 siglos antes de que un rey etrusco la implantara en la historia, y que aún en el siglo XVI los pacíficos suizos de hoy, que nos deleitan con sus quesos mansos y sus relojes impávidos, ensangrentaron a Europa con soldados de fortuna. Aún en el apogeo del Renacimiento, 12 mil lansquenetes a sueldo de los ejércitos imperiales saquearon y devastaron a Roma, y pasaron a cuchillo a ocho mil de sus habitantes.

No pretendo encarnar las ilusiones de Tonio Kröger, cuyos sueños de unión entre un norte casto y un sur apasionado exaltaba Thomas Mann hace 53 años en este lugar. Pero creo que los europeos de espíritu clarificador, los que luchan también aquí por una patria grande más humana y más justa, podrían ayudarnos mejor si revisaran a fondo su manera de vernos. La solidaridad con nuestros sueños no nos haría sentir menos solos, mientras no se concrete con actos de respaldo legítimo a los pueblos que asuman la ilusión de tener una vida propia en el reparto del mundo.

América Latina no quiere ni tiene por qué ser un alfil sin albedrío, ni tiene nada de quimérico que sus designios de independencia y originalidad se conviertan en una aspiración occidental.

No obstante, los progresos de la navegación que han reducido tantas distancias entre nuestras Américas y Europa, parecen haber aumentado en cambio nuestra distancia cultural. ¿Por qué la originalidad que se nos admite sin reservas en la literatura se nos niega con toda clase de suspicacias en nuestras tentativas tan difíciles de cambio social? ¿Por qué pensar que la justicia social que los europeos de avanzada tratan de imponer en sus países no puede ser también un objetivo latinoamericano con métodos distintos en condiciones diferentes? No: la violencia y el dolor desmesurados de nuestra historia son el resultado de injusticias seculares y amarguras sin cuento, y no una confabulación urdida a 3 mil leguas de nuestra casa. Pero muchos dirigentes y pensadores europeos lo han creído, con el infantilismo de los abuelos que olvidaron las locuras fructíferas de su juventud, como si no fuera posible otro destino que vivir a merced de los dos grandes dueños del mundo. Este es, amigos, el tamaño de nuestra soledad.

Sin embargo, frente a la opresión, el saqueo y el abandono, nuestra respuesta es la vida. Ni los diluvios ni las pestes, ni las hambrunas ni los cataclismos, ni siquiera las guerras eternas a través de los siglos y los siglos han conseguido reducir la ventaja tenaz de la vida sobre la muerte. Una ventaja que aumenta y se acelera: cada año hay 74 millones más de nacimientos que de defunciones, una cantidad de vivos nuevos como para aumentar siete veces cada año la población de Nueva York. La mayoría de ellos nacen en los países con menos recursos, y entre éstos, por supuesto, los de América Latina. En cambio, los países más prósperos han logrado acumular suficiente poder de destrucción como para aniquilar cien veces no sólo a todos los seres humanos que han existido hasta hoy, sino la totalidad de los seres vivos que han pasado por este planeta de infortunios.

Un día como el de hoy, mi maestro William Faullkner dijo en este lugar: "Me niego a admitir el fin del hombre". No me sentiría digno de ocupar este sitio que fue suyo si no tuviera la conciencia plena de que por primera vez desde los orígenes de la humanidad, el desastre colosal que él se negaba a admitir hace 32 años es ahora nada más que una simple posibilidad científica. Ante esta realidad sobrecogedora que a través de todo el tiempo humano debió de parecer una utopía, los inventores de fábulas que todo lo creemos, nos sentimos con el derecho de creer que todavía no es demasiado tarde para emprender la creación de la utopía contraria. Una nueva y arrasadora utopía de la vida, donde nadie pueda decidir por otros hasta la forma de morir, donde de veras sea cierto el amor y sea posible la felicidad, y donde las estirpes condenadas a cien años de soledad tengan por fin y para siempre una segunda oportunidad sobre la tierra.

Agradezco a la Academia de Letras de Suecia el que me haya distinguido con un premio que me coloca junto a muchos de quienes orientaron y enriquecieron mis años de lector y de cotidiano celebrante de ese delirio sin apelación que es el oficio de escribir. Sus nombres y sus obras se me presentan hoy como sombras tutelares, pero también como el compromiso, a menudo agobiante, que se adquiere con este honor. Un duro honor que en ellos me pareció de simple justicia, pero que en mí entiendo como una más de esas lecciones con las que suele sorprendernos el destino, y que hacen más evidente nuestra condición de juguetes de un azar indescifrable, cuya única y desoladora recompensa, suelen ser, la mayoría de las veces, la incomprensión y el olvido.

Es por ello apenas natural que me interrogara, allá en ese trasfondo secreto en donde solemos trasegar con las verdades más esenciales que conforman nuestra identidad, cuál ha sido el sustento constante de mi obra, qué pudo haber llamado la atención de una manera tan comprometedora a este tribunal de árbitros tan severos. Confieso sin falsas modestias que no me ha sido fácil encontrar la razón, pero quiero creer que ha sido la misma que yo hubiera deseado. Quiero creer, amigos, que este es, una vez más, un homenaje que se rinde a la poesía. A la poesía por cuya virtud el inventario abrumador de las naves que numeró en su Iliada el viejo Homero está visitado por un viento que las empuja a navegar con su presteza intemporal y alucinada. La poesía que sostiene, en el delgado andamiaje de los tercetos del Dante, toda la fábrica densa y colosal de la Edad Media. La poesía que con tan milagrosa totalidad rescata a nuestra América en las Alturas de Machu Pichu de Pablo Neruda el grande, el más grande, y donde destilan su tristeza milenaria nuestros mejores sueños sin salida. La poesía, en fin, esa energía secreta de la vida cotidiana, que cuece los garbanzos en la cocina, y contagia el amor y repite las imágenes en los espejos.

En cada línea que escribo trato siempre, con mayor o menor fortuna, de invocar los espíritus esquivos de la poesía, y trato de dejar en cada palabra el testimonio de mi devoción por sus virtudes de adivinación, y por su permanente victoria contra los sordos poderes de la muerte. El premio que acabo de recibir lo entiendo, con toda humildad, como la consoladora revelación de que mi intento no ha sido en vano. Es por eso que invito a todos ustedes a brindar por lo que un gran poeta de nuestras Américas, Luis Cardoza y Aragón, ha definido como la única prueba concreta de la existencia del hombre: la poesía. Muchas gracias.

FIN


Fonte: CIUDAD SEVA

17 de abr. de 2014

Bernardo Uglione Boldrini: mais uma morte anunciada!

De joelhos

“Mortes como a do menino Bernardo me aniquilam! Penso que toda vez que um ascendente - que a meu ver possui o compromisso civilizatório de proteger sua cria - mata seu descendente, todos os homens e mulheres da terra, independente de credos ou religiões, deveriam curvar seus joelhos no chão e pedir perdão a seus deuses ou ao universo por mais um fracasso da humanidade” (Cida Alves).



 

As violências físicas contra crianças e adolescentes apresentam um elevado risco de morte, pois a natureza dessa forma de violência implica no ataque ou na destruição do corpo da vítima. Nós, educadores, profissionais da saúde e da assistência social, promotores de justiça, agentes de segurança e juízes não podemos negligenciar as denúncias de violências físicas.

Há décadas, pesquisas internacionais evidenciam a magnitude e a letalidade[1] da violência física. Um exemplo é a pesquisa realizada na Inglaterra, com base nos óbitos registrados nos Serviços de Proteção à Infância, de 1991 e 1995. Os resultados dessa pesquisa indicaram que o número de mortes decorrente da violência física predomina em relação as outras formas de violência (apud AZEVEDO; GUERRA, 1995). A tabela abaixo ilustra essa predominância.

 

MORTES POR VIOLÊNCIA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES


 

Tipo de Violência/Ano

1991

1992

1993

1994

1995

Negligência

5.600

6.200

6.800

8.300

8.900

Violência física

9.200

9.100

10.000

10.700

10.400

Violência sexual

5.200

5.600

7.100

8.100

7.500

Violência psicológica

2.600

2.800

3.500

4.400

4.700

Negligência, violência física e sexual

100

200

200

300

300

Negligência, violência física

900

1.000

1.100

1.300

1.400

Negligência, violência física

200

300

400

500

600

Violência física, sexual

400

500

600

800

800

Atenção máxima

21.100

12.900

2.700

500

300

Total

45.200

38.600

32.500

34.900

34.950


[1] Letalidade é um conceito utilizado pela epidemiologia que permite verificar a gravidade de um evento, ou seja, ela mede o risco de morte de um determinado evento. No caso em questão, a letalidade da violência física é calculada verificando-se, do total de crianças, adolescentes e jovens adultos vítimas de violência física, quantos foram a óbito por causa desse tipo de violência.

Obs.: Os casos constantes dos dados da tabela acima vão de zero a dezessete anos, cuja a população em 1992, na Inglaterra, era de 10.951.900.

Referência:

AZEVEDO, Maria Amélia; GUERRA, Viviane N. de Azevedo. Telecurso de especialização na área de violência doméstica contra crianças e adolescentes. São Paulo: Lacri/Ipusp, 1995.

Foto capturada no blog Paulo Suess


Avó Materna de Bernardo

Avó materna, Jussara Uglione, havia se oferecido para criar Bernardo. Foto: Claudio Vaz / Agencia RBS

 

Veja algumas reportagens sobre o Caso Bernardo Uglione Boldrini

Conselho Tutelar apurava desde 2013 denúncias de maus-tratos a Bernardo

Caso Bernardo: confira os passos do menino em busca de ajuda

Menino Bernardo pediu ajuda ao Ministério Público antes de morrer

Cantos do horror por – Flávia Oliveira

Ninguem Merece ser estuprada

Violência contra a mulher no Brasil é real e banal. Está na música, nas ruas e nos boletins de ocorrência das delegacias de polícia

 

Não vê quem não quer

Por Flávia Oliveira*

Se o Brasil voltasse duas semanas no tempo e os resultados da pesquisa “Tolerância social à violência contra a mulher” ganhassem as ruas sem traço de erro. Se recuasse um ano no calendário e os questionários do Sistema de Indicadores de Percepção Social não tivessem chegado aos 3.810 entrevistados. Se viajasse meio século na história, quando nem o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada existia. Ainda que qualquer das três hipóteses se materializasse, o Brasil seria um país em que a violência contra a mulher é real. E banal.

O teste, sem amostra estatística, formulários ou percentuais tabulados, está ao alcance de quem estiver disposto a enxergar um palmo adiante. Para começar, ouça a canção. Melhor dizendo, as canções. Para-raios de fenômenos sociais, compositores brasileiros eternizaram ameaças e maus-tratos em suas obras.

Rosa Maria Araujo, presidente do Museu da Imagem e do Som do Rio, tem exemplo secular. Heitor dos Prazeres compôs “Mulher de malandro”, na primeira metade do século XX. A letra, de 1932, ensinava: “Ela vive com tanto prazer/ Quanto mais apanha/ A ele tem amizade”.

 

 

O mestre João Bosco, em 1976, deu voz a “Gol anulado”, que Elis Regina gravou oito anos depois. A música, parceria com Aldir Blanc, outro deus da MPB, começava explicando: “Quando você gritou mengo /No segundo gol do Zico /Tirei sem pensar o cinto /E bati até cansar”. Ali, a violência é impulso, detonado pela decepção.

 

 

Zeca Pagodinho, em 1997, tratou da banalidade das agressões de gênero em “Faixa amarela”. Lá pelo terço final do samba, a declaração de amor se torna ameaça de espancamento e execração pública: “Mas, se ela vacilar, vou dar um castigo nela/ Vou lhe dar uma banda de frente/ Quebrar cinco dentes e quatro costelas/ Vou pegar a tal faixa amarela/ Gravada com o nome dela/ E mandar incendiar/Na entrada da favela”.

 

 

Num pré-Mercosul macabro, Sidney Magal, lá nos anos 70, cantou “Se te agarro com outro te mato”, versão de Sebastião Ferreira para a canção do argentino Cacho Castaña. O refrão começa com o título, auto explicativo, e continua com o verso “Te mando algumas flores e depois escapo”, numa evidente certeza de impunidade.

 

 

O funk não escapou. MC Martinho lançou, em 2010, “História real”, que conta como um traficante mata a companheira com uma pistola nove milímetros: “E, quando a encontrou, deu logo dois tirão (sic)/No peito que a derrubou”.

 

 

Se referências musicais não convencerem, repare as cantadas gratuitas - seguidas de ofensas - nas calçadas. Mire o efeito scanner da cabeça que vira na direção da menina que vai. Preste atenção no rapazola que toca, sem constrangimento, os cabelos da moça que passa. Abra os olhos às encoxadas nos vagões lotados de trens e metrô.

Se ainda faltarem evidências, monte o álbum de recortes com notícias de agressões, ataques, estupros, homicídios de namoradas, mulheres e ex, diariamente, Brasil afora. Um mês atrás, um jovem a cinco horas de completar 18 anos matou a ex-namorada Yorrally Ferreira, de 14, em Novo Gama (GO). Há 20 dias, em Belo Horizonte, o motoboy Gilmar Vitor da Paixão, de 37 anos, confessou numa rede social o assassinato da mulher, Fernanda Nagia, de 29, por ciúme.

São punhados de exemplos a confirmar que a violência contra a mulher está em toda parte. Reproduz-se na música. É visível nas ruas. E está atestada nos boletins de ocorrência das delegacias. Prescinde do Ipea. Não vê quem não quer.

Flavia Oliveira

 

 

 

 

Flávia Oliveira é jornalista e articulista do jornal O Globo

 

 


Fonte: Jornal O Globo

Foto capturada na reportagem Ipea desculpa-se por erro em resultado de pesquisa sobre violência contra mulher

14 de abr. de 2014

3 denúncias de violência sexual contra crianças e adolescentes são registradas por hora no Disque 100

Disque01_logo_disque_900

No ano passado, foram registradas no Brasil quase 32 mil denúncias no Disque 100, da Secretaria de Direitos Humanos. O que dá uma média de três crianças e adolescentes abusados a cada hora.

Uma vítima de abuso conta que lutou com o criminoso, mas ele fugiu. “Lutei com ele, briguei, lutei, fiz de tudo, arranhei o rosto dele e não teve jeito, me imobilizou e fez o que fez”.

Não foi fácil criar coragem para registrar a queixa. A vítima conta o que ouviu de um policial: “Também, você estava com roupa de dormir. Na delegacia especializada, uma delegacia de mulher, a pessoa virar para mim e tentar me culpar pelo que tinha acontecido? Eu esperava que todos fossem me culpar também”, conta.

Uma cartilha foi criada pela Promotoria da Infância e da Juventude no Rio de Janeiro para ajudar os policiais a identificar nas ruas sinais de violência ou de exploração sexual de menores. É uma iniciativa importante no momento em que várias cidades do país se preparam para receber muitos turistas por causa da Copa do Mundo.

“O simples fato de um policial abordar um turista que está parado conversando com essa adolescente prevenirá a prática dessa violação de direitos”, explica a promotora da Infância e Juventude, Clisânger Ferreira.

Veja reportagem completa AQUI


Ilustração capturada no site Ronilton Costa

13 de abr. de 2014

Savior – Um homem dividido pela dor e a força de sua coragem

 

"O homem é uma corda estendida entre o animal e o Super-homem: uma corda sobre um abismo; perigosa travessia, perigoso caminhar; perigoso olhar para trás, perigoso tremer e parar. O que é de grande valor no homem é ele ser uma ponte e não um fim: o que se pode amar no homem é ele ser uma passagem e um ocaso."

Nietzsche

 


O que escolhe proteger a vida!

Herói de São Luis

O “Super-Homem” de São Luiz do Maranhão - Márcio Roni da Cruz Nunes, 37,  recebe alta após 3 meses de internação em hospital de Goiânia

 

"Ele olhou para aquela criança cheia de fogo e voltou para buscar", disse a mãe de Nunes, Marinete da Cruz Nunes, de 65 anos.

"Tenho certeza de que, mesmo queimado e com tantas dores, ele não se arrependeu do que fez", afirmou a irmã, Josinete da Cruz Nunes, de 49.

 

Os que escolhem aniquilar, destruir a vida…

 

Os algozes de Ana Clara – as imagens são extremamente fortes, a exibição delas não é recomendada para crianças.

 


Veja mais:

Após mais de três meses internado, homem que retirou menina de ônibus incendiado no MA recebe alta