25 de out. de 2019

22 de out. de 2019

Coringa e minha tristeza abissal - Cida Alves




O filme Coringa tem sido objeto de inúmeras análises desenvolvidas por diferentes áreas do conhecimento. Algumas delas buscaram interpretar o tema apresentado pelo filme de Todd Phillips a partir de perspectivas subjetivas, dando destaque à compreensão do adoecimento psíquico e da consequente necessidade e urgência de se garantir o diagnóstico precoce e a atenção em saúde de qualidade às pessoas com transtornos mentais. Outras buscaram compreender Coringa para além de sua expressão e história individual por meio de interpretações sociológicas ou estéticas. Para contribuir com o debate suscitado pelo filme Coringa destaco um elemento que considero estruturante na experiência de Arthur Fleck que é o impacto das violências em seu desenvolvimento físico e mental. 


Coringa e minha tristeza abissal

Eu que amo apaixonadamente os palhaços e os bailarinos. Eu que sinto uma admiração quase invejosa pelas atrizes e atores que arrebatam nossos corações e vísceras com suas metamorfoses magistrais. Eu que sou uma adita na sétima arte desde menina assisti Coringa como quem testemunha um desmoronamento. Do começo ao fim Coringa me fez sentir uma tristeza abissal.

Senhora tristeza oceânica, velha conhecida que me acompanha há 22 anos em meu dia a dia como psicóloga que cuida de pessoas em situação de violências. A história de Arthur Fleck me teletransportou para o interior de settings terapêuticos onde ouvi, toquei e cheirei relatos de puro horror que irremediavelmente me faziam sentir a mesma tristeza azul.

O seu mundo de açúcar e de certezas desabaria sob seus pés, se um dia os olhos das crianças pudessem projetar o que os adultos já fizeram com elas!

Assisti as violências perpetradas contra Arthur Fleck como uma concretização ultrarrealista dessa projeção imaginária de muitos olhinhos de crianças que atendi ou que conheci por meio de relatos apresentados por colegas de trabalho, notícias de jornais e estudos científicos.  Não existe leveza possível ao adentrar no assombroso mundo de memórias daqueles que viveram o que o pequeno Arthur sofreu em sua infância. 

O mundo adulto pode ser absolutamente perverso com as crianças. As crianças podem ser cruéis com seus pares. As pessoas podem sentir prazer no sofrimento do outro, elas podem gargalhar com a dor daqueles que julgam desajustados, estranhos, fora de seus padrões de sucesso, aqueles que os estadunidenses chamam de perdedores.  

Não devo justificar nenhuma forma de violência, todavia compreendo como surgem os violentos. O corredor polonês de violências por que passam desde muito cedo algumas pessoas me fez compreender, concreta e profundamente, como o humano se desmorona. As violências provocam fissuras, rachaduras nas pessoas, em alguns casos elas quebram tanto por dentro que a pessoas se convertem em escombros. 

Violências Estruturais que roubam a dignidade humana, privando muitos de direito elementares como trabalho, moradia digna e saúde de qualidade. Violências Simbólicas que hierarquizam pessoas, valorizando poucas e descartando ou eliminando tantas sem que haja um único grão de culpa, remorso ou luto. Violências de Gênero que institui identidades masculinas por meio de valores violentos de supremacia e controle sobre os demais, infestando o mundo de masculinidades tóxicas. Violências Intrafamiliares que se sedimentam no arbítrio do pátrio poder, objetivando filhos e filhas ao transformar seus pequenos corpos em continentes a serem invadidos por descargas de frustrações e projeções de toda espécie de sentimentos hostis e aniquiladores. Quantas violências provocaram abalos sísmicos na crosta continental de Arthur Fleck? 

Não existiriam Coringas sem o desmoronamento provocado por inúmeras violências. Infelizmente, histórias que mortificam Arthur Fleck, parindo assim Coringas não existem apenas em obras de ficção, ao contrário, elas são mais comuns do que queremos acreditar. Os olhos das crianças ainda não possuem o poder de projeção de memórias, por isso peço a vocês que assistam Coringa como se ele fosse um sismógrafo que prenuncia desmoronamentos cuja erupção de magmas devastadores é sempre um risco possível.  Oxalá o filme Coringa se impregne em sua mente como uma bandeira por uma Infância Livre de violências.

Cida Alves

Recomendo a leitura da entrevista


"Raine listou os fatores presentes em Coringa que definem o declínio de Arthur Fleck: abuso físico, negligência e subnutrição na infância. A pobreza é um fator que aumenta o risco" (Rolling Stone).

17 de out. de 2019

Luna Grande, Un Tango Por García Lorca




Pequeño Vals vienés

En Viena hay diez muchachas,
un hombro donde solloza la muerte
y un bosque de palomas disecadas.
Hay un fragmento de la mañana
en el museo de la escarcha.
Hay un salón con mil ventanas.
¡Ay, ay, ay, ay!
Toma este vals con la boca cerrada.

Este vals, este vals, este vals,
de sí, de muerte y de coñac
que moja su cola en el mar.

Te quiero, te quiero, te quiero,
con la butaca y el libro muerto,
por el melancólico pasillo,
en el oscuro desván del lirio,
en nuestra cama de la luna
y en la danza que sueña la tortuga.
¡Ay, ay, ay, ay!
Toma este vals de quebrada cintura.

En Viena hay cuatro espejos
donde juegan tu boca y los ecos.
Hay una muerte para piano
que pinta de azul a los muchachos.
Hay mendigos por los tejados.
Hay frescas guirnaldas de llanto.
¡Ay, ay, ay, ay!
Toma este vals que se muere en mis brazos.
Porque te quiero, te quiero, amor mío,
en el desván donde juegan los niños,
soñando viejas luces de Hungría
por los rumores de la tarde tibia,
viendo ovejas y lirios de nieve
por el silencio oscuro de tu frente.
¡Ay, ay, ay, ay!
Toma este vals del “Te quiero siempre”.

En Viena bailaré contigo
con un disfraz que tenga
cabeza de río.
¡Mira qué orilla tengo de jacintos!
Dejaré mi boca entre tus piernas,
mi alma en fotografías y azucenas,
y en las ondas oscuras de tu andar
quiero, amor mío, amor mío, dejar,
violín y sepulcro, las cintas del vals.


Frederico García Lorca




Os quatro (des)amores de Federico García Lorca

La canción Take this waltz de Leonard Cohen es un poema de Frederico García Lorca

Dez  jeitosde amar Federico García Lorca