9 de dez. de 2015

"Y todo, como el diamante..." - José Martí

“Todo es hermoso y constante,
Todo es música y razón,
Y todo, como el diamante,
Antes que luz es carbón”.
José Martí












O blog Educar Sem Violência fará um breve recesso em suas postagens. 

5 de dez. de 2015

#lute como uma garota – Para comemorar a primeira vitória do movimento de acupação das escolas de SP

Dondoca é uma espécie em extinção
Por isso não provoque
É cor de rosa choque..."

Rita Lee

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Foto: Marlene Bergamo/Folhapress

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Foto: Thiago Pompeu

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Foto: Reprodução/Twitter

 

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Foto: Marlene Bergamo/Folhapress

 

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Foto: Reprodução/Facebook

 

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Foto: Joel Silva/Folhapress

 

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Foto: Luiz Carlos Murauskas/Folhapress

 

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Foto: Marlene Bergamo/Folhapress


Fonte: QG em 4 de dezembro de 2015.

1 de dez. de 2015

A execução de adolescentes no Rio e o vídeo do Unicef que ninguém viu - Alceu Luís Castilho



O que separa o assassinato de cinco jovens por policiais, no Rio, e o depoimento de mães de adolescentes mortos? Como a opinião pública percebe esses dramas? 

Por Alceu Luís Castilho (@alceucastilho)

Durante 95 segundos, três mães – três mães negras – falam sobre seus filhos. Sorrindo. “Eu nunca vi uma pessoa igual a ele”, diz a mãe de Hítalo Gabriel, de 12 anos. “Todos os dias ele falava pra mim: ‘Você é a melhor mãe do mundo, te amo'”. A mãe de Cristian, de 13 anos, lembra que ele praticava vários esportes, era brincalhão, difícil vê-lo de cara feia. Queria estudar e ser bombeiro, como o tio. “Ele trabalhava, com 17 anos já tinha emprego registrado”, conta a mãe de Christian. “Era um menino cheio de sonhos. Era o primeiro em matemática. Era o primeiro na minha vida”.

Os depoimentos fazem parte de uma campanha que o Unicef – o Fundo das Nações Unidas para a Infância – lançou no dia 20, o Dia da Consciência Negra. Nos 40 segundos finais do vídeo, as mães baixam a cabeça. Fecham os olhos. Choram. Enquanto isso lemos que, todos os dias, 28 crianças e adolescentes morrem assassinados no Brasil. E que a maioria são meninos negros, pobres e moradores da periferia. A mãe de Christian completa: “Ele já tinha namorada. Já tinha emprego. E eu só tinha ele”.

Em dez dias, o vídeo teve apenas 1.000 visualizações no YouTube. E por que tão pouca gente viu? Porque a imprensa não divulgou.

NO RIO, A HISTÓRIA CONTINUA

Alguns internautas, porém (inclusive uma publicação de esquerda), não se acanharam em divulgar a imagem dos cadáveres dos cinco jovens abaixo: Carlos Eduardo da Silva de Souza, 16 anos; Roberto de Souza Penha, 16 anos; Cleiton Corrêa de Souza, de 18 anos; Wilton Esteves Domingos Júnior, de 20 anos; e Wesley Castro Rodrigues, de 25 anos. Não dessa foto com eles sorridentes, mas dos corpos.

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Todos eram negros. Estavam em um carro, na Estrada João Paulo, zona norte do Rio, e foram fuzilados pela polícia. Na noite do sábado (28), com 50 tiros. Douglas Belchior, naCartaCapital, informa que o crime foi cometido na comunidade da Lagartixa, no Complexo da Pedreira, bairro de Costa Barros. Parentes contaram ao jornal Extra que eles tinham ido comemorar o primeiro salário de Roberto como jovem aprendiz no Atacadão da avenida Brasil. No domingo, iriam à praia.
O site GuadalupeNews relatou que quatro policiais usaram luvas para pegar a chave do veículo e tentar abrir o porta-malas. Não conseguiram. Aí tentaram forjar a cena do crime de forma canhestra: colocaram uma arma de brinquedo sob o pneu esquerdo dianteiro. Não colou. Foram presos. Mesmo numa cidade e num país acostumado aos chamados “autos de resistência”, quando policiais executam e colocam a culpa nas vítimas, a cara-de-pau não passou batida.

GENOCÍDIO DE JOVENS NEGROS

O articulista da CartaCapital – militante do movimento negro e membro do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, o Conanda – observa que o grupo de jovens estava em um carro com documentação em dia, motorista habilitado e desarmados. E pergunta, antes de cobrar o secretário de Segurança Pública e o governador do Rio, Luiz Fernando Pezão (PMDB): “O que havia ali que pudesse justificar a ação dos policiais? Serem todos negros?”

A campanha do Unicef com as mães de crianças e adolescentes assassinados informa que, no caso dos adolescentes, o Brasil só fica atrás da Nigéria. Até 2019, mais 42 mil podem ser mortos – mantido o ritmo atual. “As crianças e adolescentes assassinados têm cor, classe social e endereço”, enfatiza o órgão da ONU. “São em sua maioria meninos negros, pobres, que vivem nas periferias e áreas metropolitanas das grandes cidades”.

A taxa de homicídio entre adolescentes negros é quase 4 vezes maior do que aquela entre os brancos. E suas mortes são justificadas, “de forma equivocada”, pelos conflitos entre facções ou pelo tráfico de drogas. O Unicef informa que entre 92% e 95% dos homicídios cometidos no Brasil – de todos os homicídios – não são solucionados. E que parte dessa estatística se deve aos tais “autos de resistência”. (E não somente no Rio, a cidade onde a polícia mais mata no país.)

NADA MAIS TEM IMPORTÂNCIA?

Se a notícia sobre os cinco executados no Rio correu as redes sociais, assim como ocorreu com outros assassinatos de crianças e adolescentes na cidade, em 2015, por que o vídeo do Unicef não teve repercussão? Haveria algum problema no formato? Alguma preferência pela exclamação efêmera (quando não, mórbida) em detrimento de uma reflexão séria, consistente e perene? Para o diretor do vídeo do Unicef, o publicitário Alex Ribondi, estamos anestesiados.

Ele conta que as histórias das mães emocionaram as nove pessoas que estavam no set de filmagem. Ele acredita que, diante do momento político, da quantidade de notícias e escândalos, o filme tenha perdido espaço “nesse universo de confusões transmitidos e propagados todos os dias”. “Infelizmente estamos vivendo um momento em que nada tem tanta importância mais”, reflete. “E se tiver alguma, não dura muito”.

Ele já tinha feito outros trabalhos que tocavam nesse tema. Alguns extremamente fortes e pesados. “Não há como ficar indiferente a essa realidade”, considera. “São histórias tristes, dolorosas e terrivelmente verdadeiras. Cada uma delas aumenta a percepção do quanto perdemos tempo com problemas irrelevantes e o quão anestesiada está a maior parte das pessoas. Acho que ainda vamos demorar muito até conseguirmos mudar a situação de verdade. Infelizmente”.

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CRÍTICA: O PAPEL DA MÍDIA

A campanha do Unicef não saiu na Globo e não ganhará menção do Criança Esperança. O Unicef já foi o parceiro da rede platinada no Criança Esperança, entre 1986 e 2003; desde 2004 é a Unesco. Mas não dá nem para comparar o alcance de sua campanha contra o genocídio infantojuvenil ao alcance do que a emissora abençoa. E isso diz muito sobre o país. A campanha lançada pelo Unicef no Dia da Consciência Negra vai direto ao ponto central: a matança de crianças e adolescentes existe e, se nada for feito, terá mais 42 mil mortos em cinco anos. Em outro planeta, a Globo perpetua a mensagem de “esperança”, despolitizada, como se fosse mais um quadro populista do Luciano Huck, jogando a responsabilidade pela política pública específica (aquela relativa a crianças e adolescentes) ao telespectador na sala de jantar, subitamente generoso, a investir em projetos isolados. E o Brasil faz de conta que purga suas responsabilidades.


Enquanto isso, a campanha do Unicef – politizada – atinge uma ou outra testemunha espalhada pelo país. A imprensa – toda ela – ignora. Mas depois noticia (como se fosse uma mercadoria perecível) mais uma execução de adolescentes negros no Rio. E mais uma. Mais uma. Outra. E outra. Mesmo na Globo. Não importa. Linearmente. Sem coesão, sem que o silêncio e a dor de cada pai sejam tomados como a ferida exposta de todo um país. Sem uma postura efetiva de quem queira tomar o assunto como prioridade absoluta. Em meio a uma ética de conveniência e ao progressivo abandono da estética. Numa palavra: a cobertura não é digna. A narrativa não é digna. A pulverização das notícias é indigna. Cada jornalista e cada internauta (mesmo aquele que não profanaria um cadáver) é também responsável por essa dor e por esse embotamento.

30 de nov. de 2015

O machismo seboso deixará de ser o must do intelectual charmoso - Karina Buhr

“Mulheres relatam violência trazida pelo desenvolvimento em Goiana e no Cabo”, diz o jornal. O culpado foi o desenvolvimento, o tamanho do vestido, o lugar em que ela foi se meter naquela hora da noite. Na notícia “mulher é morta” e não “marido mata”. A palavra “feminicídio” no jornal? Provavelmente se for pra criticar o termo. E seguimos sob o manto da naturalização da violência contra as mulheres.

“Desça daí, menina! Você vai cair!”. Começa assim. Quando o sexo entra em cena, o que nos ensinam vem na forma de obrigações e medos. A sorte é que a gente é desobediente. Um professor e promotor de justiça se referiu a Simone de Beauvoir como “baranga francesa”. Vereadores de Campinas, nervosíssimos, fizeram moção de repúdio à questão do Enem que cita a filósofa. Falaram que a inciativa de citar ela é “demoníaca”. Bom dia, 2015!

Tem também o apresentador, que se diz humorista, divulgando vídeo ironizando o tema da redação do Enem – “A persistência da violência contra a mulher na sociedade brasileira” – num show de machismo e transfobia, sob os aplausos e risos empolgados de umas dúzia de estúpidos que estavam no programa e o aval de mais de 230 mil curtidas/compartilhamentos rede social afora, além de outros tantos mil comentários nauseantes.

As proibições das mulheres quando o assunto é sexo é proporcional à naturalização do estupro contra elas. Vale tudo se for pela violência, vale até pai estuprar a filha e, por lei, ser o pai legítimo do neto. Se for pra gente gostar, não vale nada. A gente só tem o direito de ser violentada mesmo. Em graus variadíssimos, mas no fim é isso. Os mesmos homens que acham ok babar em cima da menina de 12 anos e chamar ela de vagabunda safada vão achar um absurdo se a filha de 12 anos pensar em sexo.

Não, elas não amadurecem mais cedo, só tem preocupações e responsabilidades demais, enfiadas goela abaixo desde muito cedo. Tudo parece tão simples, tão cotidiano… O quarto impecável, lavar sempre as calcinhas no banho, arrumar os cabelos direito, não falar palavrão, sentar de perna fechada, se for correr que seja não muito rápido, brincar de casinha, vassoura, panela e filhinho boneco bebê loiro, ouvir histórias de príncipes encantados, não se sujar, não brincar sozinha com meninos, não sair sem sutiã, não atrasar depilação, não namorar muito, mas não deixar de namorar, pra garantir o casamento e os filhos, ser uma mãe exemplar (enquanto o pai pode passar só pra levar pra tomar sorvete)… É tudo ligado e costurado, não vivemos num mundo legal com estupradores aqui e ali, a cultura do estupro é estabelecida e não dorme.

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Nesses dias, com a campanha do #primeiroassédio (parabéns, Think Olga!) foi cuspido na rua o que todas as mulheres sempre souberam: que todas nós, sem exceção, somos assediadas incessantemente durante toda a vida e a grande maioria desde muito cedo.

Roubando o poeta… um homem tem que ter
 “qualquer coisa além de beleza
, qualquer coisa de triste, qualquer coisa que chora”. E como foi bonito ver a tristeza explícita de muitos homens ao perceberem o que de fato acontece com toda e qualquer mulher brasileira.

Homens na ação, repensando falas, atos, suas presenças na vida das mulheres, isso é bonito de ver e também aconteceu por esses dias. Que cresça!

O machismo do amigo dói tanto quanto todos os outros e é tão nefasto quanto, porque crescemos, vocês e nós, acostumados com ele. Já passou da hora de perceber que machista não é só o que bate na mulher. O machismo é acostumado com máscaras, está nas músicas que a gente aprende a amar, livros que admiramos, nos nossos professores, nossos pais. Repito o que disse dia desses, que do machismo ogro é fácil se desfazer. Aguardamos o dia em que o machismo seboso deixe de ser o must do intelectual charmoso.

No meio desse movimento tão emocionante de mulheres juntas berrando pelas vidas delas mesmas e de todas, suando liberdade, é crucial pra mim ressaltar a importância de os homens todos perceberem que é muito fácil apontar o dedo pro estuprador, difícil é perceber a ligação entre ele e si próprio, de se ver no lugar de algoz. Perceber que existe uma linha contínua, que tem numa ponta o estuprador e na outra ponta você, homem tranquilo, pessoa relax, que acha que não é machista e que, quando lê a notícia que o estuprador foi preso, fala que ele vai virar mulherzinha na prisão.

Não, amigo, mulherzinha não foi feita pra ser estuprada e, essa idéia, te faz cúmplice no crime.

Quando era pequena, grupos de amigos gritavam “Mulherzinha! Mulherzinha”, pro menino que levava porrada e perdia na briga. E nós, mulherzinhas, assistíamos com dor silenciosa. Dói ainda a reverberação dos gritos. Algumas até gritavam junto com eles, embriagadas de submissão goela abaixo. E se alguma se opusesse era ridicularizada. Esse era o meu lugar, o de opositora ridicularizada.

Pulo pra 2015, vivendo um um momento histórico, emocionante e esquizofrênico também. De um lado mulheres, juntas e vibrantes, do outro, um poder opressor que quer nos tirar direitos conquistados há tanto tempo e a tanto custo. O grito nosso era pela legalização do aborto, faz tempo, mas o xadrez político nos tira direitos e reafirma que as mais pobres, maioria negra, devem permanecer na linha de tiro.

Na voz de Ana Paula Portella*, socióloga, amiga e musa, “um retrocesso que pode nos custar mais 60 anos de luta. O governo brasileiro levou quase 60 anos para garantir o direito ao aborto seguro para as mulheres nos casos previstos em lei: os permissivos legais estão no Código Penal de 1940 e a Norma Técnica do Ministério da Saúde que instituiu os serviços é de 1999. Sessenta anos. E garantir a norma foi uma luta de anos, que envolveu dezenas de organizações e centenas de ativistas e profissionais feministas e muita gritaria mundo afora denunciando o Brasil por colocar a vida das mulheres em risco… Precisamos de seis décadas para garantir que o Estado brasileiro cumprisse a lei e agora o PL 5069 pretende que o Estado volte à situação de descumprimento… de ilegalidade, portanto. Isso é caso para as Cortes Internacionais de Direitos Humanos”.

Desculpa, poeta, mas mulher não foi “feita apenas para amar, pra sofrer…e pra ser só perdão”.

Não passarão!

* Ana Paula Portella itegrou o grupo técnico pra elaboração da primeira Norma Técnica do Ministério da Saúde, pra Prevenção e Tratamento dos Agravos resultantes da Violência sexual contra Mulheres e Adolescentes, de 1999. Versão atualizada da Norma Técnica.

 


Fonte: Blog Leonardo Sakamoto, 3 de novembro de 2015.

28 de nov. de 2015

Oriente, Ocidente, Norte e Sul, onde está a civilização?

" Quando meus olhos estão sujos da civilização, cresce por dentro deles um desejo de árvores e pássaros "
Manoel de Barros






Colaboração: Mércia Carvalho, em 28 de novembro de 2015.

26 de nov. de 2015

O amigo é secreto. A dor tem que ser pública - Nádia Junqueira

 

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“Todas as tristezas podem ser suportadas se você as coloca numa história ou conta uma história a seu respeito.”

Hannah Arendt

 


Brasília - A gente sabe quando leva um tapa na cara e sabe dar nome a ele: agressão física. A gente sabe dar nome à violência quando alguém tira a vida de outra pessoa: homicídio. Sabe também falar “estupro” quando um desconhecido transa à força com uma mulher (quando é conhecido, dificilmente essa violência é reconhecida como estupro). Isso tudo na vida de milhares de mulheres é real, cotidiano e muito grave. Mas há outra realidade que é presente na vida não de algumas (milhares). Mas de todas. Sem exceção.

Dá um nó na garganta. Um frio na barriga. Uma confusão na cabeça. O chão some. Há de se fazer um esforço pra entender. Há um impulso em jogar a dor para seu colo assumindo uma culpa própria. Mas aos poucos vamos percebendo que é violência sim e só acontece porque somos mulheres. Essa percepção pode se dar mais cedo, mais tarde, pode nunca acontecer. Mas uma coisa é certa, uma mera campanha com hashtags na internet joga luz para aquilo que a gente leva para o travesseiro, junto com lágrimas antes de dormir. Leva para terapia. Ou, para as que já descobriram essa força, para o compartilhamento com outra ou outras mulheres que vão saber entender, acolher, refletir e confortar.  

Nessa primavera feminina que inclui milhares de mulheres nas ruas contra o projeto do Cunha (PL 5069/2013), outros milhares de jovens escrevendo sobre violência contra mulher e respondendo questões sobre Simone de Beauvoir nas provas do ENEM, a internet ofereceu de forma criativa uma forma das mulheres colocarem para fora essa violência calada, sutil e velada. Começou com #meuprimeiroassedio, quando as caixinhas da memória afetiva foram abertas retomando aquelas histórias doloridas que, muitas vezes, nem se sabia entender como assedio. (Eu mesma me dei conta de meu primeiro assédio, que foi aos seis anos de idade, com quase 18 anos).

Nos últimos dias tem sido a vez de #meuamigosecreto, quando as mulheres denunciam comportamentos machistas e preconceituosos de pessoas de seu convívio. A campanha é ainda mais interessante porque carrega as contradições destes amigos. Os que se dizem feministas (e de esquerda), mas que se recusam a compartilhar as atividades domésticas e paternidade. Os que defendem o amor livre e direito da mulher ao domínio de seu corpo, mas dizem como a namorada tem de se vestir, se comportar. Ou têm relações fora do relacionamento, mas não admitem que ela tenha porque morre de ciúmes. Ou os que se dizem superfamília e cristão, mas quando a namorada engravida a coage a abortar. As contradições são inúmeras e você aí do outro lado tem alguma para apontar. Por trás dessas campanhas há algumas coisas que queria compartilhar.

Pode parecer óbvio e natural para muitas mulheres que estamos diária e cotidianamente submetidas a relações de opressão patriarcalista. Mas eu diria que para maioria não é. Por essa razão, quando uma mulher está passeando livremente por sua timeline no Facebook e se depara com uma campanha como essa, reconhecendo histórias familiares, elas se voltam para si. Buscam em seu histórico o que já viveram. Pode ser, para muitas, o primeiro momento em que se dão conta de que foram e são violentadas. Que aquela tristeza que sentem nessas situações se chama opressão. Que não é sua culpa. E por mais que seja corriqueiro, não deve ser assim.

Elas não precisam carregar isso para si a vida inteira. Podem falar, podem compartilhar e vai ter muita mulher para acolher sua história e sua dor. Por isso mesmo, essa ferramenta que pode ser entendida como brincadeira, pode ser também poderosa para mostrar que várias dorzinhas juntas somam-se, como tijolos, formando um enorme muro que precisamos olhar. E precisamos desconstruir.

Essas campanhas exigem coragem. Porque é enorme a chance de seu amigo secreto ou de seu assediador estar entre seus amigos nas redes sociais e todos saberem a quem você se refere. Acontece que nossos amigos secretos e nossos assediadores não são monstros. Não são loucos. Sobretudo, não são desconhecidos. Pelo contrário, dividimos histórias com eles, compartilhamos sentimentos profundos, sinceros e bonitos. Porque eles estão ao nosso lado, o tempo todo. Dividimos casa com eles. A cama, a mesa do trabalho, a sala de aula, a militância. Eles ocupam os espaços que nos definem. Por esta razão, dói falar. Dói se dar conta de que quem você ama, admira ou compartilha experiências, é o mesmo que te machuca, te humilha, te indigna, te diminui, te faz sofrer.   

Quanto mais próximo, mais difícil enfrentar. Por isso, é compreensível o silêncio e imobilização de muitas mulheres. Não quer dizer, contudo, que tenhamos que aceitar e deixar passar. Há sim, de se desconstruir e isso começa com a exposição do que vivemos e sentimos. A dor, solitária, dá mão a outras dores e ganham visibilidade para que os opressores (nossos amigos, sim) vejam, se incomodem, se dêem conta de que nos fazem sofrer. 

Para violência física é preciso uma resposta: punição. Cadeia. Então, para os opressores que estupram, que batem, que matam não podemos exigir nada menos que um Estado fortalecido e rígido na punição contra esses crimes e na proteção das mulheres. Mas e para os opressores que assediam e que são nossos amigos secretos que machucam? O primeiro passo: eles têm de saber que provocam dor. Eles têm de ver estampada em sua timeline a sua contradição. Isso incomoda, sim.

Há um tempo, vivendo e pensando o machismo, me veio uma conclusão um pouco simplória. Não há nenhum homem que não seja machista. Se em casa a formação foi feminista, da porta para fora há um mundo que não é. Se no mundo descobriram que há muito machismo que deve ser descontruído, em casa tiveram uma formação difícil de ser abandonada. O que diferencia, então, um homem do outro em relação a seu machismo? O quanto o reconhecem e o quanto estão dispostos a enfrenta-lo e muda-lo. Há, aos montes, os que não reconhecem e muito menos estão dispostos a enfrenta-lo. Eles estão por aí latindo contra a campanha. Usando de todas as argumentações desonestas para não colocar a crítica no colo. Desses, amigas, a gente tem que correr.

Mas há os incomodados e eles são muitos. Porque reconhecer também dói. Ver a carapuça servindo perturba. E talvez não haja nada mais incômodo na construção de quem somos do que nos depararmos com nossas contradições. Com o descompasso do que fazemos e dizemos. Do que defendemos e do que fazemos quando estamos fora da luz pública. Nesse exercício, seria produtivo que nossos amigos secretos respondessem a isso como um rapaz na minha timeline. “Minha carapuça serviu em vários. Não vejo essa campanha como escracho, mas como pedagógica”.

E é sim um processo pedagógico. Para destruir esse muro que nos separa de um espaço de menos dor, mais respeito ao que somos, mais coerência, os tijolos desse enorme muro devem ser tirados um a um. Isso só pode acontecer se o machismo for percebido, reconhecido e encarado. Mas, para isso, temos que falar. Temos que expor. Temos que incomodar. Ou como diz Hannah Arendt, todas as tristezas podem ser suportadas se você as coloca numa história ou conta uma história a seu respeito. 

 

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Nádia Junqueira é jornalista e mestre em Filosofia Política (UFG). / njunqueiraribeiro@gmail.com

 


Fonte: a redação, em 25 de novembro de 2015.

Foto capturada no Library of Congress

23 de nov. de 2015

As mulheres vão derrubar Eduardo Cunha – por Nathalí Macedo

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Eu vivi para ver a luta feminista ganhar força. Vivi pra ver 3 mil mulheres na Marcha das Vadias. Sou contemporânea à PL 478/2007 (estatuto do nascituro), que está travada até hoje porque mulheres foram às ruas para dizerem que nossos úteros são laicos e que as leis de nosso país não podem nos violentar.

Vivi pra ver uma mulher lutar contra a ditadura e chegar à presidência, uma cantora produzir um clipe feminista com mais de sessenta mulheres e uma mulher chegar ao espaço. Pra ver uma das provas mais importantes do país abordando a violência contra a mulher como tema.

Faço parte, portanto, de uma geração de mulheres que percebeu que nós precisamos falar por nós mesmas. E que nós podemos fazer isso. O mundo tem compreendido: nós não estamos para brincadeira.

Enquanto isso, no Congresso, um deputado esconde dólares na Suíça e continua livre – e atuante, o que é ainda pior.

Cunha sabe que corrupção não dá em nada quando se tem poder – e que ele provavelmente continuaria roubando dinheiro público descaradamente sem maiores consequências, protegido por uma justiça omissa e tendenciosa.

Sua grande infelicidade foi mexer com as mulheres em uma época de tamanha efervescência feminista. Talvez numa tentativa de desviar o foco dos próprios escândalos, ele apresentou a PL 5069, que dificulta o atendimento a mulheres vítimas de violência sexual e proíbe a prescrição da pílula do dia seguinte.

Milhares de mulheres foram as ruas desde então, em vários estados do país. Em São Paulo, o ato contou com quinze mil mulheres. No Rio de Janeiro, outras cinco mil foram às ruas. Em Salvador ocorrerá o segundo ato Fora Cunha. As redes sociais estão tomadas por campanhas de protesto.

Nós já provamos que somos uma geração que não desiste, que não esmorece e que não foge à luta. Mostramos que nossa atenção e sensibilidade servem também para protagonizarmos a guerra pela nossa própria liberdade. E ainda que o Brasil esqueça os dólares na Suíça, nós não esqueceremos a PL 5069. E é justamente ela – talvez um simples e infeliz desvio de foco do deputado – que o derrubará.

Tenho dito: Eduardo Cunha é um trabalho nosso.

image174-300x295Sobre o Autora

Colunista, autora do livro "As Mulheres que Possuo", feminista, poetisa, aspirante a advogada e editora do portal Ingênua. Canta blues nas horas vagas.

 


Fonte: Diário do Centro do Mundo, 22 de novembro de 2015.

18 de nov. de 2015

Reflexões sobre desenvolvimento e proteção das crianças marcam Seminário Primeira Infância Livre de Violências -

Evento também discutiu a Carta de Goiânia, instrumento que busca a concretização da proteção às crianças e o desenvolvimento saudável e livre de violências


Foi realizado nos dias 9 e 10 de novembro o Seminário Primeira Infância Livre de Violências. O evento, que é uma parceria da Rede de Atenção a Crianças, Adolescentes e Mulheres em Situação de Violência de Goiânia com diversas instituições, teve como objetivo sensibilizar sobre o impacto das práticas violentas no desenvolvimento das crianças e discutir políticas públicas e prevenção das violências na primeira infância. No total, 473 pessoas participaram do seminário, como pais, profissionais e estudiosos da área de psicologia na infância, família e assuntos semelhantes, além de profissionais nas áreas de comunicação, assistência social, educação, saúde, judiciária e segurança.

O Seminário contou com palestras, debates e reflexões a respeito do tema, com a presença de profissionais da área da saúde, professores, representantes da área jurídica e de instituições de defesa da infância, para discutir a Carta de Goiânia, documento que pretende fortalecer ações de políticas públicas que buscam proteção de crianças das violências, com propostas para promover o desenvolvimento das crianças.

A abertura oficial aconteceu na terça-feira, 10 de novembro, e contou com a presença de representantes do Conselho Municipal dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes, Conselhos Tutelares, da Pastoral da Criança, Conselho Regional de Psicologia, do Ministério Público, do curso de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO), professores e os deputados Adriana Accorsi e Rubens Otoni, além de representações do governo estadual e da senadora Lúcia Vânia.

Território do Brincar

O primeiro dia do seminário foi marcado pela apresentação do filme “Território do Brincar”, resultado de um trabalho de pesquisa para sensibilização sobre a cultura da infância brasileira que foi produzido pelo Instituto Alana, organização que busca garantia de condições para uma boa vivência da infância.

Em seguida à exibição do filme, o psiquiatra Daniel Emídio de Souza e a coordenadora do Fórum Estadual de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil de Goiás Katleem Lima debateram a respeito da importância do ato de brincar para o desenvolvimento das crianças.

Debates

Uma das mesas de debates discutiu o tema “Caminhos do cuidado e da prevenção das violências na primeira infância”, contando com a presença da Professora Doutora Lucia Cavalcanti de Albuquerque Williams, da Universidade Federal de São Carlos, que apresentou a importância da família na prevenção às violências na infância, com a apresentação de casos de famílias que eram consideradas de risco.

Durante os debates também foram apresentadas as políticas do Programa Primeira Infância Melhor, do Rio Grande do Sul, que foi lançado em 2003 e atende mais da metade dos municípios do Estado, com intervenções a famílias em situação de risco e vulnerabilidade social, para educar e cuidar das crianças, e do Instituto da Primeira Infância, Organização Não-Governamental (ONG) dedicada à promoção do desenvolvimento na primeira infância.

A segunda mesa de discussões tratou dos desafios da proteção à primeira infância no Brasil, coordenada pela Representante da Rede de Atenção a Crianças, Adolescentes e Mulheres em Situação de Violência e técnica do Núcleo de Vigilância às Violências da SMS Railda Martins. Um dos temas discutidos foi a respeito da saúde e dignidade da criança, com uma palestra da pediatra Rachel Niskier, do Núcleo de Apoio aos Profissionais que atendem Crianças e Adolescentes vítimas de Violência no Rio de Janeiro.

Carta de Goiânia

A Carta de Goiânia, que foi lida e apresentada durante o Seminário, é um instrumento para que se busque a concretização primeira infância livre de violências. Durante o evento, houve uma mesa para que se fizessem reflexões e sugestões a respeito do conteúdo da Carta. A Carta contempla vários aspectos a respeito da busca e fortalecimento de políticas para a proteção e cuidado das crianças para o desenvolvimento saudável e livre de violências.

Miqueias Coelho

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Abaixo as apresentações:

"Crianças - crescer e se desenvolver com saúde e dignidade: tarefa de todos"
Dra. Rachel Niskier – Pediatra do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, Criança e Adolescente Fernandes Figueira da Fundação Oswaldo Cruz, coordenadora do Núcleo de Apoio aos Profissionais que atendem Crianças e Adolescentes vítimas de Violência (NAP - IFF/Fiocruz) e Membro da Diretoria da Sociedade Brasileira de Pediatria – Rio de Janeiro

 

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"Crianças Queimadas"
Vereadora Cristina Lopes Afonso – fisioterapeuta especialista em queimaduras

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