29 de mar. de 2016

3º Seminário Nacional de Políticas Públicas para a Primeira Infância - 30 e 31 de março em Forquilhinha - SC




PROGRAMAÇÃO

30 de março de 2016

8h30 - ABERTURA

9h - Palestra Magna: Proteção integral dos direitos da criança na primeira infância na América Latina e Caribe

Palestrante: Rosa Ortiz (OEA)

10h - MESA 1: Tema: A Primeira Infância no Brasil e no mundo
        
Coordenador: Casimira Benge - Unicef

Painelistas:

Violências físicas na primeira infância - comparação dos dados do disque 100 - Benedito Rodrigues dos Santos (Unicef)

As entidades religiosas e a primeira infância no mundo - Clovis Boufler - Pastoral da Criança

12h - Intervalo para almoço

13h30 - MESA 2:

Tema: Uma Rede de organizações em defesa e promoção da Criança

Coordenador: Maria Mostafa - Coordenação da Secretaria Executiva da RNPI

Painelistas:

O PNPI - a grande novidade (concepção de criança e infância), impacto nas políticas integrais para a Primeira Infância, processo de elaboração - Vital Didonet - RNPI

A construção do PMPI de Nova Iguaçu, RJ - Edson Cordeiro, coordenador da elaboração do PMPI de Nova Iguaçu.

A participação da criança: técnicas de escuta e de participação. A experiência do Projeto Criança Fala.-  Nayana Brettas

Mesa 3:

Tema: A proteção integral na primeira infância e o sistema de garantia de direitos

Coordenador: Maristela Cizeski – Pastoral da Criança/CONANDA

Painelista:

A importância da intersetorialidade e o papel do Sistema de Garantia de Direitos – Carlos Nicodemos –MNDH

19h30        Cerimônia de entrega do prêmio medalha ZILDA ARNS de boas práticas para a primeira infância

Compromisso com a Primeira Infância

Além da entrega do prêmio Zilda Arns, a Cerimônia terá um momento onde Prefeitos da região devem assinar um documento da Rede Nacional pela Primeira Infância/RNPI e Rede Não Bata Eduque, garantindo um compromisso com a primeira infância e com a cultura da não violência.

31 de março de 2016

8h - Mesa 4:

Tema: Importância da implementação da Lei 13.010/2014 – Menino Bernardo na construção de uma sociedade menos violenta para nossas crianças

Coordenador: Ana Paula Rodrigues – Fundação Xuxa

- Impactos do Castigo Físico e Humilhante no Desenvolvimento Infantil – Dra Cida Alves – integrante da Rede de Atenção a Crianças, Adolescentes e Mulheres em Situação de Violência de Goiânia e Consultora Colaboradora da Área Técnica de Vigilâncias em Violências e Acidentes do Ministério da Saúde

- Desconstruindo os mitos sobre a Lei nº 13.010/2014 – Menino Bernardo - Dra. Priscila Pires - Advogada do Centro de Defesa Dom Luciano Mendes da Associação Beneficente São Martinho

- Ações de prevenção à violência voltadas para as famílias com o objetivo de interromper o ciclo de violência contra crianças - Márcia Oliveira - Rede Não Bata, Eduque

Mesa 5:

Tema: Os ODS e a Primeira Infância

Painelistas: 

Heloisa de Oliveira – Diretora Executiva da Fundação Abrinq

Flavio Debique - PLAN Internacional Brasil

13h - Mesa 6: Apresentação das experiências premiadas

Mesa 7

Fundamentos do marco legal da primeira infância, O papel do pai -   Senador José Medeiros – Vice-Presidente da Frente Parlamentar da Primeira Infância

Neurociencias – Deputado Osmar Terra – Presidente da Frente Parlamentar para a Primeira Infância e autor do Marco Legal da Primeira Infância

Pré-Natal do Pai – Angelita Hermann – Ministério da Saúde

A lei e as boas práticas já em curso – Ivania Ghesti


Atividades paralelas:

- Filme “O Começo da Vida” - Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal - apresentação de trailers sobre o documentário a ser lançado em maio.

- Semana do bebê

- Formação de adolescentes multiplicadores na cultura da não violência – Lei do menino Bernardo – pela Rede Não Bata Eduque



Veja mais sobre o Marco Legal da Primeira Infância



26 de mar. de 2016

Abraços roubados de Val e Jessica, de Maria de Lourdes e Wilton e “a escolha de Sofia” de Maria Fernandes, a mãe de Florestan





“Acho que a coisa mais difícil que fiz foi permanecer fiel à minha base de origem”
Florestan Fernandes


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CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (CONANDA) em defesa do do Estado Democrático de Direito

                                                            



NOTA PÚBLICA

O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente – CONANDA, órgão deliberativo e controlador da política de promoção e defesa dos direitos da criança e do adolescente, criado pela Lei Nº 8.242, de 12 de outubro de 1991, vem a público manifestar seu apoio em defesa da democracia e dos direitos humanos.

Consideramos grave toda e qualquer ameaça aos princípios básicos do Estado Democrático de Direito e entendemos que o Sistema de Justiça não pode exigir qualquer ação ou impor qualquer restrição aos cidadãos brasileiros, senão em virtude de lei. O Estado deve garantir o cumprimento do princípio da presunção da inocência de maneira absoluta, corrigindo legislativamente eventuais empecilhos que inviabilizem a responsabilização daqueles que atentam contra suas leis.

Consideramos inaceitável qualquer ameaça aos princípios básicos do Estado Democrático de Direito que alcança, ainda que de forma desigual, toda a sociedade brasileira. Não aceitaremos o retrocesso e a violação dos direitos conquistados a duras penas pela classe trabalhadora e movimentos sociais.

Como ponto de partida, o CONANDA respeita quaisquer manifestações populares entendendo-as como exercício máximo da democracia. A democracia no Brasil tem uma história recente. Vivemos em um país que, após 20 anos de Ditadura, conseguiu construir novas bases alicerçadas na garantia dos Direitos Humanos, preconizados pela Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) e pela Constituição Federal de 1988. Os Direitos Humanos compõem um projeto de sociedade inerente à democracia, baseado no diálogo e na participação social.

Para efetivar esses direitos, o Brasil implementou, nas três últimas décadas, uma série de políticas públicas com o objetivo de avançar na garantia de direitos a toda a população, inclusive beneficiando diretamente crianças e adolescentes. Todas essas políticas são resultados das lutas históricas dos movimentos populares e democráticos, porém ainda temos grandes desafios.

No entanto, o atual momento político, marcado por uma crescente onda conservadora, disseminada pela mídia e expressa no comportamento de diversas instituições, coloca em risco esse processo de conquistas democráticas e ameaça os direitos humanos, os quais essas instituições deveriam proteger. Tal ameaça evidencia-se no debate da redução da idade penal, redução da idade para o trabalho, revogação do Estatuto do Desarmamento, relativização das garantias democráticas por meio de ações que solapam os direitos e garantias individuais e coletivos, estabelecidos nas Cartas das Nações Unidas, de outros órgãos internacionais e da própria Constituição Federal, bem como nas tentativas de criminalização, midiática e judicial, de segmentos e movimentos sociais com rebatimentos que buscam fragilizar a organização da classe trabalhadora.

Não podemos aceitar tais ameaças e tais ações. Não podemos aceitar riscos aos princípios basilares do Estado Democrático de Direito. Não é possível pensar na defesa dos direitos de crianças e adolescentes em um contexto cada vez mais acirrado e contencioso. Consideramos urgente o repúdio a discursos antidemocráticos que intentam desconstruir os avanços conquistados pelo Brasil a partir de sua reabertura política e que alcança, ainda que de forma desigual, toda a sociedade brasileira. Não aceitaremos nenhum direito a menos e nenhum retrocesso.

Defender a democracia é defender os direitos humanos. Isso é inegociável. O CONANDA, enquanto instância de participação social, conclama a sociedade a unir forças nesta importante luta e projeto de emancipação. As garantias democráticas e constitucionais são imprescindíveis para a proteção de crianças e adolescentes, e o livre exercício de seus direitos civis, sociais e humanos.

Brasília, 18 de março de 2016.


CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - CONANDA


Vejam abaixo outras entidades que se manifestam em defesa da Democracia e o Estado de Direitos:

Fórum 21 

Promotores e procuradores de MP, MPF e MPT 

Entidades, Jornalistas Livres, blogueiros e ativistas digitais

Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (CEBES)

Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo (ANPARQ) 

Movimento Negro 

Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) 

Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC)

Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB)

Central Unica dos Trabalhadores (CUT Brasil) 

Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ)

Igreja Presbiteriana Unida do Brasil

Associação dos Docentes da USP (ADUSP)

Sindicato dos Arquitetos no Estado de São Paulo (SASP)      Associação de Docentes da UFABC  

Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil 

Universidade Federal do ABC (UFABC)

Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB)

Instituto de Arquitetura e Urbanismo (IAU) USP São Carlos

Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional (ANPUR) 

Igreja Povo de Deus em Movimento

Artistas e intelectuais 

Conselho de Secretários Municipais de Saúde do Estado de São Paulo 

Conselho Federal de Psicologia

Federação Nacional dos Arquitetos (FNA)

Conselho das Cidades (Concidades)

Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico (IBDU)

Mackenzistas pela Democracia

Evangélicos

Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP (FAU-USP)

Governadores do Nordeste

Povos e Comunidades Tradicionais do Sul do Brasil

Movimentos sociais, coletivos culturais, organizações da sociedade civil e ativistas que atuam nas periferias (periferias contra o golpe)

Escritores e profissionais do livro

Servidores públicos do Poder Judiciário e do Ministério Público da UniãoComunidade acadêmica da Faculdade de Direito do Recife (UFPE)

Movimento LGBT unificado

Cáritas do Brasil (Comissão Pastoral da Terra, Conselho Indigenista Missionário, Conselho Pastoral dos Pescadores, Serviço Pastoral dos Migrantes)

Professores de Gestão de Políticas Públicas da USP

Movimento Hip Hop do Brasil

Instituto de Estudos Socioeconômicos (INESC)

Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superios (ANDIFES) 

Sociedade Brasileira de Economia Política

Associação dos Docentes da UNICAMP



25 de mar. de 2016

PELO ESTADO DE DIREITO E PELO FORTALECIMENTO DA DEMOCRACIA, COM ENTENDIMENTO NACIONAL E PAZ SOCIAL - A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC)

A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) jamais se desvencilhou da vida nacional, nunca se omitiu, principalmente nos momentos mais agudos, e sempre esteve atenta e atuante diante dos temas mais caros ao Brasil e aos brasileiros. Assim, vínhamos dedicando a devida e merecida atenção aos acontecimentos decorrentes da operação Lava Jato e suas consequências na vida econômica e política do País. 

Contudo, a gravidade e a repercussão de fatos mais recentes estão trazendo consigo a capacidade de acirrar disputas no campo político, de fazer surgir divergências nas lides do judiciário e, mais preocupante ainda, de acentuar as já sentidas rupturas na sociedade brasileira. 

A gravidade do momento não está mais para nutrir ânimos já exaltados ou para ser apenas motivo de contemplação e análises. É hora de nossas lideranças – principalmente as políticas, empresariais e da classe trabalhadora – se disporem a construir os caminhos que levem rapidamente ao entendimento nacional e, com isso, possamos assegurar a manutenção da paz social e a retomada do crescimento econômico. Esse é o papel que se espera de nossos líderes.

E a sociedade também tem seu papel a desempenhar. Cidadãos de qualquer gênero, origem e credo; trabalhadores e profissionais liberais; professores e estudantes; militantes de qual seja a ideologia ou causa - todos precisamos cultivar a tolerância e respeitar a divergência de opiniões. 

Deve-se reconhecer, obviamente, que cada grupo político, cada segmento da vida social, cada setor da economia ou cada corrente ideológica têm o direito de buscar a consecução de seus objetivos e de lutar pela defesa de seus interesses. No entanto, toda conquista precisa ser alcançada em conformidade com o que estabelece a Constituição Federal, com o respeito às instituições, dentro das regras democráticas e seguindo os princípios da ética. O estado de direito não pode ser subjugado ao estado de ânimo. 

Junto de outras forças democráticas, a SBPC lutou para que as ações deletérias do regime ditatorial instalado em março de 1964 provocassem o menor efeito possível na vida nacional. Da mesma forma, lutamos para o restabelecimento do regime democrático e sua construção. 

Nesse momento delicado da vida nacional a SBPC se coloca novamente em campo e conclama a sociedade civil organizada a arregaçar as mangas. Desta vez, precisamos garantir a manutenção do estado de direito, transformar a crise atual em instrumento de fortalecimento da democracia, propugnar pelo entendimento nacional e garantir a paz social. 

Mais do que nunca, o Brasil está precisando da boa vontade dos brasileiros. 


São Paulo, 08 de março de 2016. 

Fonte: site da SBPC

24 de mar. de 2016

Nota pública sobre a situação política do Brasil - ONU Mulheres

A ONU Mulheres observa com preocupação o contexto político brasileiro e apela publicamente à salvaguarda do Estado Democrático e de Direito.
Aos poderes da República, a ONU Mulheres conclama a preservação da legalidade, como condição máxima das garantias estabelecidas na Constituição Federal de 1988 e nos tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil é signatário.
À sociedade brasileira, a ONU Mulheres pede serenidade nas manifestações e não-violência frente aos debates públicos necessários para a condução democrática dos rumos políticos do país. O debate saudável entre opiniões divergentes deve ser parte intrínseca da prática cidadã em uma democracia.
Nos últimos 30 anos, a democracia e a estabilidade política no Brasil tornaram reais direitos humanos, individuais e coletivos. São, sobretudo, base para políticas públicas – entre elas as de eliminação das desigualdades de gênero e raça – determinantes para a construção de uma sociedade inclusiva e equitativa.
Como defensora dos direitos de mulheres e meninas no mundo, a ONU Mulheres condena todas as formas de violência contra as mulheres, inclusive a violência política de ordem sexista contra a Presidenta da República, Dilma Rousseff. Nenhuma discordância política ou protesto pode abrir margem e/ou justificar a banalização da violência de gênero – prática patriarcal e misógina que invalida a dignidade humana.
Que o legado da democracia brasileira, considerado referência no mundo e especialmente na América Latina e Caribe, seja guia para as soluções da crise política.
Nadine Gasman
Representante da ONU Mulheres Brasil
Fonte: ONU Mulheres Brasil, em 24 de março de 2016

23 de mar. de 2016

Boaventura: Brasil ainda pode evitar o “novo” golpe - BOAVENTURA DE SOUSA SANTOS

Mc Sofia no palco Canto da Democracia em São Paulo. Foto Ninja

Judiciário e mídia ferem democracia. Lava Jato não é comparável a Mãos Limpas. Na raiz da crise, ilusão grosseira do PT. Guerra não está perdida, mas é preciso mudar já
Por Boaventura de Sousa Santos
Quando, há quase trinta anos, iniciei os estudos sobre o sistema judicial em vários países, a administração da justiça era a dimensão institucional do Estado com menos visibilidade pública. A grande exceção eram os EUA devido ao papel fulcral do Tribunal Supremo nas definições das mais decisivas políticas públicas. Sendo o único órgão de soberania não eleito, tendo um caráter reativo (não podendo, em geral, mobilizar-se por iniciativa própria) e dependendo de outras instituições do Estado para fazer aplicar as suas decisões (serviços prisionais, administração pública), os tribunais tinham uma função relativamente modesta na vida orgânica da separação de poderes instaurada pelo liberalismo político moderno, e tanto assim que a função judicial era considerada apolítica.
Contribuía também para isso o fato de os tribunais só se ocuparem de conflitos individuais e não coletivos e estarem desenhados para não interferir com as elites e classes dirigentes, já que estas estavam protegidas por imunidades e outros privilégios. Pouco se sabia como funcionava o sistema judicial, as características dos cidadãos que a ele recorriam e para que objetivos o faziam.
Tudo mudou desde então até aos nossos dias. Contribuíram para isso, entre outros fatores, a crise da representação política que atingiu os órgãos de soberania eleitos, a maior consciência dos direitos por parte dos cidadãos e o fa to de as elites políticas, confrontadas com alguns impasses políticos em temas controversos, terem começado a ver o recurso seletivo aos tribunais como uma forma de descarregarem o peso político de certas decisões. Foi ainda importante o fato de o neoconstitucionalismo emergente da segunda guerra mundial ter dado um peso muito forte ao controle da constitucionalidade por parte dos tribunais constitucionais. Esta inovação teve duas leituras opostas. Segundo uma das leituras, tratava-se de submeter a legislação ordinária a um controle que impedisse a sua fácil instrumentalização por forças políticas interessadas em fazer tábua rasa dos preceitos constitucionais, como acontecera, de maneira extrema, nos regimes ditatoriais nazis e fascistas. Segundo a outra leitura, o controle da constitucionalidade era o instrumento de que se serviam as classes políticas dominantes para se defenderem de possíveis ameaças aos seus interesses decorrentes das vicissitudes da política democrática e da “tirania das maiorias”. Como quer que seja, por todas estas razões surgiu um novo tipo de ativismo judiciário que ficou conhecido por judicialização da política e que inevitavelmente conduziu à politização da justiça.
Classes dominantes viram, na politização do Judiciário,
recurso para se defender dos “riscos” da democracia
e da suposta “tirania das maiorias”
A grande visibilidade pública dos tribunais nas últimas décadas resultou, em boa medida, dos casos judiciais que envolveram membros das elites políticas e econômicas. O grande divisor de águas foi o conjunto de processos criminais que atingiu quase toda a classe política e boa parte da elite econômica da Itália conhecido por Operação Mãos Limpas. Iniciado em Milão em abril de 1992, consistiu em investigações e prisões de ministros, dirigentes partidários, membros do parlamento (em certo momento estavam a ser investigados cerca de um terço dos deputados), empresários, funcionários públicos, jornalistas, membros dos serviços secretos acusados de crimes de suborno, corrupção, abuso de poder, fraude, falência fraudulenta, contabilidade falsa, financiamento político ilícito.
Dois anos mais tarde tinham sido presas 633 pessoas em Nápoles, 623 em Milão e 444 em Roma. Por ter atingido toda a classe política com responsabilidades de governação no passado recente, o processo Mãos Limpas abalou os fundamentos do regime político italiano e esteve na origem da emergência, anos mais tarde, do “fenômeno” Berlusconi. Ao longo dos anos, por estas e por outras razões, os tribunais têm adquirido grande notoriedade pública em muitos países. O caso mais recente e talvez o mais dramático de todos os que conheço é a Operação Lava Jato no Brasil.
Iniciada em março de 2014, esta operação judicial e policial de combate à corrupção, em que estão envolvidos mais de uma centena de políticos, empresários e gestores, tem-se vindo a transformar pouco a pouco no centro da vida política brasileira. Ao entrar na sua 24ª fase, com a implicação do ex-presidente Lula da Silva e com o modo como foi executada, está provocando uma crise política de proporções semelhantes à que antecedeu o golpe de Estado que em 1964 instaurou a uma odiosa ditadura militar que duraria até 1985. O sistema judicial, que tem a seu cargo a defesa e garantia da ordem jurídica, está transformado num perigoso fator de desordem jurídica. Medidas judiciais flagrantemente ilegais e inconstitucionais, a seletividade grosseira do zelo persecutório, a promiscuidade aberrante com a mídia ao serviços das elites políticas conservadoras, o hiper-ativismo judicial aparentemente anárquico, traduzido, por exemplo, em 27 liminares visando o mesmo ato político, tudo isto conforma uma situação de caos judicial que acentua a insegurança jurídica, aprofunda a polarização social e política e põe a própria democracia brasileira à beira do caos.
Com a ordem jurídica transformada em desordem jurídica, com a democracia sequestrada pelo órgão de soberania que não é eleito, a vida política e social transforma-se num potencial campo de despojos à mercê de aventureiros e abutres políticos. Chegados aqui, várias perguntas se impõem. Como se chegou a este ponto? A quem aproveita esta situação? O que deve ser feito para salvar a democracia brasileira e as instituições que a sustentam, nomeadamente os tribunais? Como atacar esta hidra de muitas cabeças de modo a que de cada cabeça cortada não cresçam mais cabeças? Procuro identificar neste texto algumas pistas de resposta.
Como chegamos a este ponto?
Por que razão a Operação Lava Jato está ultrapassando todos os limites da polêmica que normalmente suscita qualquer caso mais saliente de ativismo judicial? Note-se que a semelhança com os processos Mãos Limpas na Itália tem sido frequentemente invocada para justificar a notoriedade e o desassossego públicos causado pelo ativismo judicial. Mas as semelhanças são mais aparentes do que reais.
Há, pelo contrário, duas diferenças decisivas entre as duas operações. Por um lado, os magistrados italianos mantiveram um escrupuloso respeito pelo processo penal e, quando muito, limitaram-se a aplicar normas que tinham sido estrategicamente esquecidas por um sistema judicial conformista e conivente com os privilégios das elites políticas dominantes na vida política italiana do pós-guerra. Por outro lado, procuraram investigar com igual zelo os crimes de dirigentes políticos de diferentes partidos políticos com responsabilidades governativas.
Por sua partidarização, Lava-Jato não pode ser comparada
à Mãos Limpas. Talvez esteja instalando uma
República Judicial das Bananas
Assumiram uma posição politicamente neutra precisamente para defender o sistema judicial dos ataques que certamente lhe seriam desferidos pelos visados das suas investigações e acusações. Tudo isto está nos antípodas do triste espetáculo que um setor do sistema judicial brasileiro está a dar ao mundo. O impacto do ativismo dos magistrados italianos chegou a ser designado por República dos Juízes. No caso do ativismo do setor judicial lava-jatista, podemos falar, quando muito, de República judicial das bananas. Por que? Pelo impulso externo que com toda a evidência está por detrás desta específica instância de ativismo judicial brasileiro e que esteve em grande medida ausente no caso italiano. Esse impulso dita a escancarada seletividade do zelo investigativo e acusatório. Embora estejam envolvidos dirigentes de vários partidos, a Operação Lava Jato, com a conivência da mídia, tem-se esmerado na implicação de líderes do PT com o objetivo, hoje indisfarçável, de suscitar o assassinato político da Presidente Dilma Roussef e do ex-Presidente Lula da Silva.
Pela importância do impulso externo e pela seletividade da ação judicial que ele tende a provocar, a Operação Lava Jato tem mais semelhanças com uma outra operação judicial ocorrida na Alemanha, na República de Weimar, depois do fracasso da revolução alemã de 1918. A partir desse ano e num contexto de violência política provinda, tanto da extrema esquerda como da extrema direita, os tribunais alemães revelaram uma dualidade chocante de critérios, punindo severamente a violência da extrema esquerda e tratando com grande benevolência a violência da extrema direita, a mesma que anos mais tarde iria a levar Hitler ao poder. No caso brasileiro, o impulso externo são as elites econômicas e as forças políticas ao seu serviço que não se conformaram com a perda das eleições em 2014 e que, num contexto global de crise da acumulação do capital, se sentiram fortemente ameaçadas por mais quatro anos sem controlar a parte dos recursos do país diretamente vinculada ao Estado em que sempre assentou o seu poder. Essa ameaça atingiu o paroxismo com a perspetiva de Lula da Silva, considerado o melhor Presidente do Brasil desde 1988 e que saiu do governo com uma taxa de aprovação de 80%, vir a postular-se como candidato presidencial em 2018.
A partir desse momento, a democracia brasileira deixou de ser funcional para este bloco político conservador e a desestabilização política começou. O sinal mais evidente da pulsão anti-democrática foi o movimento pelo impeachment da Presidente Dilma poucos meses depois da sua tomada de posse, algo, senão inédito, pelo menos muito invulgar na história democrática das três últimas décadas. Bloqueados na sua luta pelo poder por via da regra democrática das maiorias (a “tirania das maiorias”), procuraram pôr ao seu serviço o órgão de soberania menos dependente do jogo democrático e especificamente desenhado para proteger as minorias, isto é, os tribunais.
A Operação Lava Jato, em si mesma uma operação extremamente meritória, foi o instrumento utilizado. Contando com a cultura jurídica conservadora dominante no sistema judicial, nas Faculdades de Direito e no país em geral, e com uma arma mediática de alta potência e precisão, o bloco conservador tudo fez para desvirtuar a Operação Lava Jata, desviando-a dos seus objetivos judiciais, em si mesmos fundamentais para o aprofundamento democrático, e convertendo-a numa operação de extermínio político. O desvirtuamento consistiu em manter a fachada institucional da Operação Lava Jato, mas alterando profundamente a estrutura funcional que a animava por via da sobreposição da lógica política à lógica judicial. Enquanto a lógica judicial assenta na coerência entre meios e fins ditada pelas regras processuais e as garantias constitucionais, a lógica política, quando animada pela pulsão anti-democrática, subordina os fins aos meios, e é pelo grau dessa subordinação que define a sua eficácia.
No poder, PT governou à moda antiga. E acreditou
que seria tratado com benevolência, ao
cometer as irregularidades de sempre
Em todo este processo, três grandes fatores jogam a favor dos desígnios do bloco conservador. O primeiro resultou da dramática descaracterização do PT enquanto partido democrático de esquerda. Uma vez no poder, o PT decidiu governar à moda antiga (isto é, oligárquica) para fins novos e inovadores. Ignorante da lição da República de Weimar, acreditou que as “irregularidades” que cometesse seriam tratadas com a mesma benevolência com que eram tradicionalmente tratadas as irregularidades das elites e classes políticas conservadoras que tinham dominado o país desde a independência. Ignorante da lição marxista que dizia ter incorporado, não foi capaz de ver que o capital só confia nos seus para o governar e que nunca é grato a quem, não sendo seu, lhes faz favores. Aproveitando um contexto internacional de excecional valorização dos produtos primários, provocado pelo desenvolvimento da China, incentivou os ricos a enriquecerem como condição para dispor dos recursos necessários para levar a cabo as extraordinárias politicas de redistribuição social que fizeram do Brasil um país substancialmente menos injusto ao libertarem mais de 45 milhões de brasileiros do jugo endêmico da pobreza.
Findo o contexto internacional favorável, só uma política “à moda nova” poderia dar sustentação à redistribuição social, ou seja, uma política que, entre muitas outras vertentes, assentasse na reforma política para neutralizar a promiscuidade entre o poder político e o poder econômico, na reforma fiscal para poder tributar os ricos de modo a financiar a redistribuição social depois do fim do boom das commodities, e na reforma da mídia, não para censurar, mas para garantir a diversidade da opinião publicada. Era, no entanto, demasiado tarde para tanta coisa que só poderia ter sido feita em seu tempo e fora do contexto de crise.
O segundo fator, relacionado com este, é a crise econômica global e o férreo controle que tem sobre ela quem a causa, o capital financeiro, entregue à sua voragem autodestrutiva, destruindo riqueza sob o pretexto de criar riqueza, transformando o dinheiro, de meio de troca, em mercadoria por excelência do negócio da especulação. A hipertrofia dos mercados financeiros não permite crescimento econômico e, pelo contrário, exige políticas de austeridade por via dos quais os pobres são investidos do dever de ajudar os ricos a manterem a sua riqueza e, se possível, a serem mais ricos. Nestas condições, as precárias classes médias criadas no período anterior ficam à beira do abismo de pobreza abrupta. Intoxicadas pela mídia conservadora, facilmente convertem os governos responsáveis pelo que são hoje em responsáveis pelo que lhes pode acontecer amanhã. E isto é tanto mais provável quanto a sua viagem da senzala para os pátios exteriores da Casa Grande foi realizada com o bilhete do consumo e não com o bilhete da cidadania.
O terceiro fator a favor do bloco conservador é o fato de o imperialismo norte-americano estar de volta ao continente depois das suas aventuras pelo Médio Oriente. Há cinquenta anos, os interesses imperialistas não conheciam outro meio senão as ditaduras militares para fazer alinhar os países do continente pelos seus interesses. Hoje, dispõem de outros meios que consistem basicamente em financiar projetos de desenvolvimento local, organizações não governamentais em que a defesa da democracia é a fachada para atacar de forma agressiva e provocadora os governos progressistas (“fora o comunismo”, “fora o marxismo”, “fora Paulo Freire”, “não somos a Venezuela”, etc, etc.). Em tempos em que a ditadura pode ser dispensada se a democracia servir os interesses econômicos dominantes, e em que os militares, ainda traumatizados pelas experiências anteriores, parecem indisponíveis para novas aventuras autoritárias, estas formas de desestabilização são consideradas mais eficazes porque permitem substituir governos progressistas por governos conservadores mantendo a fachada democrática. Os financiamentos que hoje circulam abundantemente no Brasil provêm de uma multiplicidade de fundos (a nova natureza de um imperialismo mais difuso), desde as tradicionais organizações vinculadas à CIA até aos irmãos Koch, que nos EUA financiam a política mais conservadora e que têm interesses sobretudo no setor do petróleo, e às organizações evangélicas norteamericanas.
Como salvar a democracia brasileira?
A primeira e mais urgente tarefa é salvar o judiciário brasileiro do abismo em que está entrando. Para isso, o setor íntegro do sistema judicial, que certamente é maioritário, deve assumir a tarefa de repor a ordem, a serenidade e a contenção no interior do sistema. O princípio orientador é simples de formular: a independência dos tribunais no Estado de direito visa permitir aos tribunais cumprir a sua quota parte de responsabilidade na consolidação da ordem e convivência democráticas. Para isso, não podem pôr a sua independência, nem ao serviço de interesses corporativos, nem de interesses políticos setoriais, por mais poderosos que sejam.
O princípio é fácil de formular, mas muito difícil de aplicar. A responsabilidade maior na sua aplicação reside agora em duas instâncias. O STF (Supremo Tribunal Federal) deve assumir o seu papel de máximo garante da ordem jurídica e pôr termo à anarquia jurídica que se está a instaurar. Muitas decisões importantes recairão sobre o STF nos próximos tempos e elas devem ser acatadas por todos qualquer que seja o seu teor. O STF é neste momento a única instituição que pode travar a dinâmica de estado de exceção que está instalada. Por sua vez, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça), a quem compete o poder de disciplinar sobre os magistrados, deve instaurar de imediato processos disciplinares por reiterada prevaricação e abuso processual, não só ao juiz Sérgio Moro como a todos os outros que têm seguido o mesmo tipo de atuação. Sem medidas disciplinares exemplares, o judiciário brasileiro corre o risco de perder todo o peso institucional que granjeou nas últimas décadas, um peso que, como sabemos, não foi sequer usado para favorecer forças ou políticas de esquerda. Apenas foi conquistado mantendo a coerência e a isonomia entre meios e fins.
A guerra não está perdida, mas não será ganha
se apenas se acumularem batalhas perdidas,
o que sucederá se se insistir nos erros do passado
Se esta primeira tarefa for realizada com êxito, a separação de poderes será garantida e o processo político democrático seguirá o seu curso. O governo Dilma decidiu acolher Lula da Silva entre os seus ministros. Está no seu direito de o fazer e não compete a nenhuma instituição, e muito menos ao judiciário, impedi-lo. Não se trata de fuga à justiça por parte de um político que nunca fugiu à luta, dado que será julgado (se esse for o caso) por quem sempre o julgaria em última instância, o STF. Seria uma aberração jurídica aplicar neste caso a teoria do “juiz natural da causa”. Pode, isso sim, discordar-se do acerto da decisão política tomada. Lula da Silva e Dilma Rousseff sabem que fazem uma jogada arriscada. Tanto mais arriscada se a presença de Lula não significar uma mudança de rumo que tire às forças conservadoras o controle sobre o grau e o ritmo de desgaste que exercem sobre o governo.
No fundo, só eleições presidenciais antecipadas permitiriam repor a normalidade. Se a decisão de Lula-Dilma correr mal, a carreira de ambos terá chegado ao fim, e a um fim indigno e particularmente indigno para um político que tanta dignidade devolveu a tantos milhões de brasileiros. Além disso, o PT levará muitos anos até voltar a ganhar credibilidade entre a maioria da população brasileira, e para isso terá de passar por um processo de profunda transformação.
Se correr bem, o novo governo terá de mudar urgentemente de política para não frustrar a confianças dos milhões de brasileiros que estão a vir para a rua contra os golpistas. Se o governo brasileiro quer ser ajudado por tantos manifestantes, tem que os ajudar a terem razões para o ajudar. Ou seja, quer na oposição, quer no governo, o PT está condenado a reinventar-se. E sabemos que no governo esta tarefa será muito mais difícil.
A terceira tarefa é ainda mais complexa porque nos próximos tempos a democracia brasileira vai ter de ser defendida tanto nas instituições como nas ruas. Como nas ruas não se faz formulação política, as instituições terão a prioridade devida mesmo em tempos de pulsão autoritária e de exceção antidemocrática. As manobras de desestabilização vão continuar e serão tanto mais agressivas quanto mais visível for a fraqueza do governo e das forças que o apoiam. Haverá infiltrações de provocadores tanto nas organizações e movimentos populares como nos protestos pacíficos que realizarem. A vigilância terá de ser total já que este tipo de provocação está hoje a ser utilizado em muitos contextos para criminalizar o protesto social, fortalecer a repressão estatal e criar estados de exceção, mesmo se com fachada de normalidade democrática. De algum modo, como tem defendido Tarso Genro, o estado de exceção está já instalado, de modo que a bandeira “Não vai ter golpe” tem de ser entendida como denunciando o golpe político-judicial que já está em curso, um golpe de tipo novo que é necessário neutralizar.
Finalmente, a democracia brasileira pode beneficiar da experiência recente de alguns países vizinhos. O modo como as políticas progressistas foram realizadas no continente não permitiram deslocar para esquerda o centro político a partir do qual se definem as posições de esquerda e de direita. Por isso, quando os governos progressistas são derrotados, a direita chega ao poder possuída por uma virulência inaudita apostada em destruir em pouco tempo tudo o que foi construído a favor das classes populares no período anterior. A direita vem então com um ânimo revanchista destinado a cortar pela raiz a possibilidade de voltar a surgir um governo progressista no futuro. E consegue a cumplicidade do capital financeiro internacional para inculcar nas classes populares e nos excluídos a ideia de que a austeridade não é uma política com que se possam defrontar; é um destino a que têm de se acomodar. O governo de Macri na Argentina é um caso exemplar a este respeito.
A guerra não está perdida, mas não será ganha se apenas se acumularem batalhas perdidas, o que sucederá se se insistir nos erros do passado.
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Boaventura de Sousa Santos

Boaventura de Sousa Santos é doutor em sociologia do direito pela Universidade de Yale, professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, diretor dos Centro de Estudos Sociais e do Centro de Documentação 25 de Abril, e Coordenador Científico do Observatório Permanente da Justiça Portuguesa - todos da Universidade de Coimbra. Sua trajetória recente é marcada pela proximidade com os movimentos organizadores e participantes do Fórum Social Mundial e pela participação na coordenação de uma obra coletiva de pesquisa denominada Reinventar a Emancipação Social: Para Novos Manifestos.

Fonte: Outras palavras, em 21 de março de 2016.