"'Ela (a juíza) vai ter sangue em suas mãos se fizer isso', havia dito Neal Gray, o avô materno - segundo a imprensa britânica, o casal gastou todas as suas economias, que totalizavam 70 mil libras (cerca de R$ 350 mil), lutando contra o pai nos tribunais.Ao absolver Butler, a juíza Mary Hogg escreveu: 'É uma alegria para mim ver o retorno de uma filha para os braços de seus pais. Essa história não acaba hoje, ainda há trabalho a ser feito'" (G!).
___________________
Violências Intrafamiliares - o despreparo para
julgar crimes cometidos por familiares não é uma realidade exclusiva do Brasil.
A menina de seis anos foi encontrada morta na casa da família em Sutton, a sudoeste de Londres, em 28 de outubro de 2013. Segundo a acusação, Butler teve um surto de raiva e aplicou golpes na cabeça de Ellie até que ela morresse.
A investigação sobre a morte de Ellie fez com que a Justiça revisasse o caso que absolveu Ben Butler no passado. Com isso, novas informações vieram à tona.
A
britânica Ellie foi morta em 2013; Ben Butler foi condenado nesta semana pelo
assassinato, e a mãe, Jennie Gray, foi considerada cúmplice.
Um caso envolvendo o assassinato brutal de uma
menina de seis anos pelo próprio pai chegou ao fim nesta terça-feira na
Inglaterra, após um julgamento dramático.
Ellie foi morta dentro de casa, em outubro de 2013.
Por unanimidade, o júri considerou seus pais, Ben Butler e Jennie Gray,
culpados. Ele foi condenado a no mínimo 23 anos de prisão, e ela, considerada
cúmplice, a 42 meses.
O crime consternou os britânicos pela violência - a
criança apresentava lesões no crânio e na coluna comparáveis às encontradas em
pessoas que sofrem acidentes de carro em alta velocidade - e também pelo fato
de Butler já ter sido acusado de agredir a filha quando ela ainda era um bebê.
Ele havia conseguido reaver a guarda da menina
apenas 11 meses antes de ela ser morta, o que levantou discussões sobre a
atuação da Justiça no episódio.
'Pai perfeito'
Em fevereiro de 2007, quando Ellie tinha pouco mais de um mês de vida, exames constataram graves ferimentos em seu corpo.
Em fevereiro de 2007, quando Ellie tinha pouco mais de um mês de vida, exames constataram graves ferimentos em seu corpo.
O pai foi considerado culpado pelas agressões e
condenado a 18 meses de prisão em 2009, mas três anos depois a Justiça
britânica o inocentou - a conclusão foi de que os machucados na menina haviam
sido "acidentais".
Butler e Gray foram a programas de TV para reaver guarda da filha (Foto: Met Police/ BBC)
Isso ocorreu após uma pesada campanha pela absolvição
de Butler, comandada pelo famoso agente publicitário britânico Max Clifford -
que mais tarde seria condenado por assédio sexual.
Pouco antes de conseguir a vitória, o casal
participou de programas de TV britânicos - na ocasião, Gray dizia que o marido
"estava tentando ser o pai perfeito".
A decisão de devolver a guarda, no fim de 2012,
ocorreu mesmo após assistentes sociais e os próprios avós de Ellie, com quem a
menina estava vivendo, tecerem críticas ao pai.
"Ela (a juíza) vai ter sangue em suas mãos se
fizer isso", havia dito Neal Gray, o avô materno - segundo a imprensa
britânica, o casal gastou todas as suas economias, que totalizavam 70 mil
libras (cerca de R$ 350 mil), lutando contra o pai nos tribunais.
Ao absolver Butler, a juíza Mary Hogg escreveu:
"É uma alegria para mim ver o retorno de uma filha para os braços de seus
pais. Essa história não acaba hoje, ainda há trabalho a ser feito".
Com a decisão, o serviço de proteção dos
assistentes sociais à garota foi suspenso e substituído por uma agência
independente, responsável pelo acompanhamento do retorno da criança ao convívio
dos pais.
Na imprensa, foram publicadas várias reportagens
sobre a "família injustiçada" e o primeiro Natal que eles passariam
juntos - poucos meses depois, ela seria assassinada.
Surto de raiva
A menina de seis anos foi encontrada morta na casa da família em Sutton, a sudoeste de Londres, em 28 de outubro de 2013. Segundo a acusação, Butler teve um surto de raiva e aplicou golpes na cabeça de Ellie até que ela morresse.
Jennie Gray, afirmou a Promotoria, foi chamada pelo
companheiro quando estava no trabalho. Ao chegar em casa, viu a filha morta,
mas não ligou imediatamente para o serviço de emergência. Ela acabou condenada
por crueldade infantil e por ter encoberto o homicídio.
O casal também inventou um plano para tentar
destruir as provas do crime e encenar uma queda acidental antes de chamar a
ambulância, uma farsa que envolvia o irmão mais novo de Ellie.
Eles mandaram a criança ir ao quarto da menina
chamá-la para comer bolo - quando chamaram a emergência, duas horas após a
morte da filha, era possível ouvir o menino dizer que "Ellie não estava
acordando".
O juiz do caso, Alan Wilkie, disse a Gray que ela
havia sido "excepcionalmente inocente e boba" para acreditar em
Butler e aceitar ser cúmplice dele na morte da filha.
Ele afirmou ainda que a mulher, que era verbal e
fisicamente abusada pelo marido, tinha uma dependência tão profunda dele que
estava disposta a fazer qualquer coisa pelo companheiro, inclusive participar
daquela "farsa grotesca".
Sobre Butler, Wilkie disse: "Você é um homem
egoísta, de temperamento difícil, violento e dominador, que considera seus
filhos e sua parceira como troféus, como se eles não tivessem qualquer função a
não ser satisfazer suas fantasias infantis e sentimentalizadas na vida familiar
- com você como patriarca a quem todos deveriam obedecer."
Revisão
A investigação sobre a morte de Ellie fez com que a Justiça revisasse o caso que absolveu Ben Butler no passado. Com isso, novas informações vieram à tona.
Ao considerar que o pai da menina não havia sido
responsável pelos ferimentos em Ellie quando bebê, a juíza Mary Hogg afirmou
que havia ocorrido um "erro judicial".
O efeito disso foi a revogação de qualquer forma de
proteção à menina, que retornou à casa dos pais sem qualquer acompanhamento
para saber se ela estava sendo bem cuidada.
"A ordem da juíza deu permissão a Butler para
apresentar o documento emitido por ela a qualquer escola, médico, assistente
social, enfermeiro ou policial que viesse a entrar em contato com a
família", explicou o repórter da BBC que cobriu o caso, Gaetan Portal.
"Butler teve, como efeito disso, a garantia de
uma poderosa arma legal contra qualquer um que levantasse questionamentos ou
preocupações sobre o bem-estar de Ellie no futuro. A juíza também determinou
que os assistentes sociais locais não poderiam mais supervisionar a
menina."
Profissionais independentes ficaram com a missão de
acompanhar o caso, mas nunca receberam informações sobre o histórico da família
ou sobre as questões que pairavam sobre Butler, que tinha outros históricos de
violência.
Eles foram orientados apenas pela decisão de Hogg,
que classificava todas as acusações contra o pai como "um erro".
A equipe de assistentes sociais independentes
acompanhou o retorno de Ellie para casa por três meses e não reportou nenhum
problema familiar. Eles entregaram o relatório final à Justiça em abril de
2013, seis meses antes do crime.
Segundo funcionários da escola da menina, ela
faltou bastante à escola nos meses anteriores a seu assassinato. Ao ser cobrada
pelo envio de atestados médicos que comprovassem os motivos das ausências, Grey
ficou "brava e agressiva", disse ao júri a assistente administrativa
Kelly Vennard.
O avô materno de Ellie critica o sistema que
permitiu a devolução da guarda da neta a seu assassino.
"O sistema falhou com ela, e conosco também. É
tarde demais para Ellie, mas não para salvar outras crianças", afirmou ao
jornal The Guardian.
"Quero garantir que isso jamais ocorra com
outra criança."
Fonte: G1, em 21 de junho de 2016.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Participe! Adoraria ver publicado seu comentário, sua opinião, sua crítica. No entanto, para que o comentário seja postado é necessário a correta identificação do autor, com nome completo e endereço eletrônico confiável. O debate sempre será livre quando houver responsabilização pela autoria do texto (Cida Alves)