3 de ago. de 2011

José Helder: um pai essencial!



Poema: Divisa

"(...) Um encontro de dois: olhos nos olhos, face a face.
E quando estiveres perto, arrancar-te-ei os olhos e colocá-los-ei no lugar dos meus;
E arrancarei meus olhos para colocá-los no lugar dos teus;
Então ver-te-ei com os teus olhos
E tu ver-me-às com os meus.
Assim, até a coisa comum serve o silêncio
E nosso encontro permanece a meta sem cadeias:
O Lugar indeterminado, num tempo indeterminado,
A palavra indeterminada para o Homem indeterminado".

Jacob Levy Moreno



Carta aos filhos Pedro e Mariana,

O homem é sempre conhecido aos pedaços, a partir dos múltiplos olhares que habitam a sua existência. Os pais nunca saberão tudo que seu filho foi, os filhos jamais terão a dimensão total do ser que foi o pai. A pessoa amada conhecerá apenas parte do homem que a enlaçou em um compromisso profundo e duradouro. Os amigos e colegas de trabalho conheceram apenas uma das muitas facetas do José Helder.

Como amiga do José Helder - que não teve a oportunidade de se despedir e dizer o tanto que ele foi importante para mim, sinto a necessidade de fazer esse testemunho a vocês, Pedro e Mariana. Conheci seu pai em 1995, quando iniciei a formação em Psicodrama Terapêutico pela Sociedade Goiana de Psicodrama. Por exigência desse programa formativo fizemos juntos a terapia de grupo didática. Que grande encontro foi esse! Seu pai é daqueles homens que quanto mais próximos ficamos mais admiramos. Compartilhamos muitas aprendizagens e experiências preciosas nesse processo terapêutico.

Fomos colegas de grupo de estudo e, junto com outros participantes do curso, compusemos uma dramatização das As Palavras do Pai de J.L. Moreno. Essa obra escrita pelo jovem Moreno trata da relação entre o humano e o sagrado. Grávida de 8 meses da Cecília, representei a criação e ele o sol. Preparar essa apresentação foi uma grande oportunidade de vivenciar prazer e alegria. Primeiro foi a labuta de converter a poesia As Palavras do Pai em cenas dramáticas, depois confeccionar os figurinos e elaborar os efeitos especiais. Por fim, a dramatização no Congresso de Psicodrama que aconteceu em Caldas Novas. Inês, Dorothy, José Helder, Lívia, Malu, Neiva e quem pode estar presente nesta apresentação, com certeza viveu um momento mágico de encantamento e encontro humano.

Separamo-nos antes do término do curso, mas ficamos muito amigos. Vim a reencontrá-lo profissionalmente na secretaria de saúde de Goiânia, trabalhando como psicólogo do CAPS Novo Mundo. A sua dedicação ao trabalho e o compromisso com os usuários de saúde mental sempre foi admirável. Isso vocês já devem ter ouvido de muitas pessoas. Por isso quero contar sobre outras qualidades de seu pai, começarei pelo respeitável talento dramático. Quando fizemos a primeira performance dramática no Congresso de Psicodrama seu pai ainda era um iniciante inibido, de movimentos cortados e ríspidos. Porém, os anos passaram e muita água correu de baixo da ponte.

Certa vez, por saber que ele tinha feito o curso de contador de história, pedi que interpretasse antes de uma palestra sobre violência física contra crianças o conto Negrinha, de Monteiro Lobato. Ele, sempre gentil, topou me ajudar. Em um auditório lotado, o cerimonial anuncia o nome do psicólogo José Helder. Com seu jeito sempre discreto, inicia a história da Negrinha. Ao fim de sua apresentação, o auditório comovido pela vigorosa e emocionante interpretação, fica em um silêncio profundo por alguns instantes. Lágrimas sinuosas e lentas desceram dos olhos de muitos que o ouviram e, logo depois, uma explosão de aplausos tomou conta do lugar. Impressionada, como todos naquele evento, pensei comigo mesma: Deus do céu, meu amigo virou um artista mesmo! Daí para frente, além de um excelente profissional, seu pai tornou-se um artista dos palcos. Tive o prazer de assistir a sua interpretação de Morangos Mofados, de Caio Fernando Abreu. Que beleza de espetáculo! Quanto talento. Naquele dia, ele deixou todo o público apaixonado!

Mas de todas as qualidades que admirei em seu pai, uma me encantava mais. José Helder é um dos pais mais carinhosos que conheci. Era delicioso ouvir suas estórias paternas, como ele ninava o pequeno Pedro quando bebê ou da alegria que expressava ao contar as primeiras conquistas escolares da Mariana. Um pai muito amoroso que não media esforços para cuidar de seus filhos. Quando falava do Pedro e da Mariana o mais nublado dos dias se iluminava com a intensidade do brilho que irradiava de seu olhar. E veja bem, é muito raro eu encontrar um pai que provoque a minha admiração. O meu crivo é severo, pois nunca ninguém conseguiu superar a imagem que tenho de meu próprio pai. Para mim, ele sempre foi o melhor homem do mundo, o meu herói, pois com sua generosidade e mansidão oceânica, plantou em uma cova muito funda a paz em mim.

Mariana e Pedro, sem sombra de dúvidas, o José Helder foi um pai que despertou em mim muita admiração. Sinto que ele também plantou a paz em seus corações. Acredito que os pais que realizam esse plantio são os essenciais. Sei que a dor da perda é dilacerante. No entanto, carreguem consigo o orgulho e a honra de serem frutos de um homem como o José Helder Teixeira. Guardem com carinho a herança do amor incondicional que ele deixou para vocês e sigam o seu legado plantando paz nos corações dos seus filhos.

Com carinho Cida Alves


Veja um trecho da obra As palavras do Pai

Bendito aqueles que trabalham em silêncio
No anonimato de suas almas vivas,
Na obscuridade de suas noites.
São perseguidos e ameaçados,
Mas seu trabalho sobreviverá.

Que este penetre na palavra dos homens
E forje suas vitórias.
Que se abrigue no coração das pessoas.
Que inspire aos líderes e force aos maus
a se renderem.

As Palavras do Pai de J.L.Moreno
Traduzido por Dr. José Carlos Landini & José Carlos Vitor Gomes
Campinas, SP - Editorial Psy, 1992

Tradução a partir do original Inglês: The Words of The Father
Copyright by J.L.Moreno, 1971
Publicação original pela Beacon House Inc.

Um comentário:

  1. Cida, não a conheço, mas já te admiro pelo fato de amar tanto assim essa pessoa tão maravilhosa que é o meu irmão José Helder. Que para mim foi espelho, exemplo de vida. meu irmão foi tudo em minha vida, amigo, protetor, segurança, uma espécie de pai, meu porto seguro, uma pessoa que se eu fosse descrever não daria conta, porque palavras seriam insuficientes gastaria todo o dicionário e mesmo assim não serião suficientes pois era uma pessoa indescritivél não tenho palavras só sei que eu o amarei eternamente. Dolores.

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