Julgamento de PMs pode ser federalizado
“eles serão punidos como criminosos”
Chamada na CapaTitular da Secretaria Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República, Maria do Rosário Nunes defende a federalização do julgamento dos policiais militares acusados de envolvimento em um grupo de extermínio e que foram presos pela Polícia Federal (PF) em Goiás na Operação Sexto Mandamento, em 15 de fevereiro passado. “Nós não queremos impunidade. Nós confiamos no Tribunal de Justiça de Goiás, mas a federalização poderá ter um papel importante”, argumentou. Em entrevista ao Face a Face, a ministra explicou que o pedido será analisado na próxima reunião do Conselho Nacional de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, ainda sem data confirmada. Maria do Rosário ainda considerou inaceitável a participação de policiais ou qualquer tipo de servidor público na violação de direitos humanos, conforme indicou a investigação da PF sobre as possíveis execuções. Sobre a discussão entre os direitos humanos das vítimas e dos PMs presos, destacou que a comparação é totalmente desigual, já que os policiais são acusados de usar a força do Estado para atingir pessoas. Além disso, ela explicou não tem qualquer informação sobre a violação dos direitos humanos dos policiais presos em Campo Grande (MS). A ministra tratou da Operação Sexto Mandamento, que segundo ela nasceu no âmbito da própria secretaria.
A secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Maria do Rosário Nunes, defende que os policiais militares goianos presos na Operação Sexto Mandamento, acusados de envolvimento com grupos de extermínio, devem ser julgados pelo Superior Tribunal de Justiça. Respondendo a leitores do Popular, que enviaram perguntas para o Face a Face, ela disse que a prisão realizada pela Polícia Federal é também uma forma de dar satisfação internacional para a questão da violência.
Reportagem: Almiro Marcos
Entrevista completa com Maria do Rosário abaixo:
Cida Alves – Acredito que antes de toda ação violenta existe uma omissão. O corporativismo vem protegendo os policiais que atuam criminosamente e as corregedorias não agem com rigor. Quais medidas podem ser tomadas para que as corregedorias atuem com autonomia e seriedade diante das denúncias de arbitrariedade policial?
Em primeiro lugar é inaceitável que policiais e qualquer outro servidor público participem de violação de direitos humanos. Porque trata-se de uma utilização da confiança que o Estado e a sociedade lhes conferem, de uma credencial que lhes foi entregue para agir contra os cidadãos e cidadãs. De fato, a autonomia das corregedorias e ouvidorias na área de segurança é fundamental para que elas possam agir coibindo abusos e prevenindo violência. Nós estamos atuando no governo brasileiro a partir de duas frentes. De um lado, a responsabilização de agentes públicos envolvidos nos grupos de extermínio e na violência. Eles não ficarão impunes. Do ponto de vista do Poder Executivo, nós vamos apoiar e desenvolver cada vez mais as investigações para identificar quem são esses agentes. Precisamos contar, cada vez mais, com o Ministério Público e com o Poder Judiciário para impedirmos a impunidade. Contamos com os governadores para afastamento imediato dos agentes policiais, quando envolvidos em crimes dessa natureza. A outra diz respeito à formação e valorização dos policiais civis e militares. Mais de 300 mil policiais no Brasil já receberam cursos voltados para formação em Cidadania e Direitos Humanos, na chamada rede Senasp (Secretaria Nacional de Segurança Pública), coordenada pelo Ministério da Justiça. Os policiais que participam desses cursos recebem bolsas que complementam os seus salários. É a chamada bolsa formação. Ser um bom policial é ser um bom cidadão, um homem e uma mulher honrados, a serviço da população. E os que desmerecem a atividade policial precisam ser responsabilizados com o rigor da lei.
Estevão Martins – Já ouvi falar algo a respeito de um serviço de proteção à testemunha. Mas que garantias para denunciar tem uma pessoa que tenha presenciado ou seja sobrevivente de um crime praticado por agentes públicos? Como funciona isso? A pessoa fica o resto da vida sob proteção do Estado? Afinal, há riscos de que um dia os denunciados voltem para cobrar o preço…
É uma situação muito difícil realmente ser incluído num programa de proteção a testemunhas. Mas muitas vezes é a diferença entre viver e morrer. Por isso, a Secretaria Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República coordena os programas de proteção a testemunha no Brasil. Nós temos três programas. Um programa nacional de proteção às testemunhas, um programa de apoio aos defensores de direitos humanos e um terceiro programa destinado às crianças ameaçadas de morte. Procuramos estabelecer uma possibilidade para que a pessoa não apenas sobreviva mas recupere o que lhe é devido pela sociedade, que é o direito de viver em segurança e com dignidade.
Diane Valdez – Me preocupo com a violência policial, que mata jovens pobres, sobretudo negros, nas periferias do Estado. Também me preocupo com programas (de televisão) sensacionalistas, que justificam atitudes truculentas da polícia goiana. A partir disso, lhe pergunto o que pode ser feito com relação a esses programas que enaltecem a violência, fazem chacotas com os pobres e ajudam a formar a opinião de que ‘bandido tem que morrer!’?
A violência não é natural das sociedades humanas e das comunidades. Ela é também ensinada e aprendida. E os meios de comunicação têm uma responsabilidade muito grande sobre isso. Portanto, ainda que tenhamos total ojeriza à censura, nós precisamos que a sociedade aja contestando os programas sensacionalistas. E não é dado a ninguém, a nenhum comunicador, que utiliza um veículo de comunicação, que é concessão pública, o direito de fazer apologia da violência, que é crime também. A violência uma vez instituída e justificada, como diz Martin Luther King, cresce em espiral e atinge a toda uma comunidade. Nós, do governo federal e da secretaria, queremos desenvolver neste ano uma política específica de diálogo e trabalho integrado aos meios de comunicação contra a apologia da violência nos meios de comunicação em todo o território nacional.
Ludimila Fonseca – Quero falar sobre a operação que resultou na prisão de policiais militares em Goiás. Muito se discute sobre direitos humanos das prováveis vítimas desses policiais e seus familiares e sobre direitos humanos dos próprios policiais e suas famílias. Como a secretaria se posiciona a respeito disso? Algum grupo deve ter prevalência?
Os policiais estão sendo acusados de utilizar armamento e a força do Estado para atingir pessoas, matar pessoas e estão sendo acusados de fraudar as circunstâncias do combate, o relato sobre as circunstâncias do combate, onde teriam produzido versões de confronto quando tudo indica que não tenha existido confronto. Pelo que consta, estes policiais não estão sendo violados nos seus direitos humanos. Eles estão presos porque é a legislação brasileira. Está sendo cumprida a lei. Portanto, se eles sofrerem alguma tortura na prisão, se forem ameaçados dentro da prisão, passa a ser uma das circunstâncias onde nós devemos agir. Eles estão presos porque há uma medida judicial diante da apuração de crimes que eles cometeram. Então não há nenhuma violação de direitos humanos. Se houver alguma violação aos direitos humanos deles, estamos aqui à disposição. A prisão pura e simples não é violação dos direitos humanos, é uma garantia da sociedade diante da violação dos direitos humanos que, tudo indica, eles cometeram. E que vai ser julgado pela Justiça.
Denival Silva – Qual a avaliação a senhora faz quanto ao fato de que, como informado pelo POPULAR, somente na última década, em plena democracia, houve mais desaparecidos no Estado do que durante todo a ditadura?
Isso é gravíssimo. A situação de Goiás nos chama a atenção para todo o Brasil. Temos denúncias de São Paulo, Paraíba, Espírito Santo, Amazonas e vários outros Estados. A ação policial violenta e os grupos de extermínio precisam saber no Brasil que eles serão punidos como criminosos. Os policiais quando agem dessa forma, organizando grupos de extermínio, se transformam em bandidos. Isso é inaceitável para o Brasil. Quero cumprimentar todos aqueles que em Goiás e em todo o Brasil estão enfrentando essas verdadeiras quadrilhas que tomam conta do Estado. Vou dizer que estamos dispostos nacionalmente a apoiar os governos estaduais, o Ministério Público, o Poder Judiciário e vamos estar irmanados contra essa violência. É preciso o empenho para a localização dos corpos e identificação da condição desses desaparecidos.
Francisco da Silva – Como a Secretaria Nacional de Direitos Humanos tem acompanhado o caso dos desaparecidos em Goiás nestes últimos anos, com fortes indícios de que tenha havido participação de agentes de segurança pública do Estado nestes eventos?
A Operação Sexto Mandamento nasceu dentro da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. As denúncias chegaram aqui e foram analisadas pelo jurista Dalmo Dallari, integrante e conselheiro do Conselho Nacional de Direitos da Pessoa Humana. Aqui também nasceu a demanda pela federalização de crimes contra os direitos humanos. Não está afastado, ao contrário, que venhamos a solicitar ao Superior Tribunal de Justiça a federalização sobre os crimes cometidos em Goiás, para que eles não sejam julgados exclusivamente no âmbito do Estado, mas sejam aceitos para o julgamento pelo STJ, como foi feito pioneiramente diante do crime contra o defensor de direitos humanos Manoel Matos, que foi morto na divisa do Pernambuco com a Paraíba num crime bárbaro. Agora, a nossa disposição é trabalhar na localização dos desaparecidos. Para isso vamos utilizar instrumentos que são pioneiramente utilizados por nós para localização dos desaparecidos do período militar. Nós criamos um banco de DNA de familiares daqueles que foram mortos e desaparecidos no período da ditadura militar. Essa experiência pretendemos estender para situações como essa de Goiás, estruturando um banco de DNA, buscando as informações necessárias, trabalhando com a proteção de testemunhas, analisando, com o Poder Judiciário e o Ministério Público, que opções podem ser tomadas para que as informações cheguem e possamos localizá-los, para que as famílias possam fazer as últimas homenagens aos seus familiares que foram mortos e desaparecidos pela ação do Estado em Goiás.
Almiro Marcos – Existe mesmo a possibilidade de pedir a federalização do julgamento desses crimes supostamente cometidos por militares?
Vamos analisar essa possibilidade na próxima reunião do Conselho Nacional de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, justamente porque se trata de um caso grave de violação dos direitos humanos. Não queremos impunidade. Confiamos no Tribunal de Justiça de Goiás, mas a federalização poderá ter papel importante. Porque o Brasil é cobrado também na área internacional pelas questões dos grupos de extermínio que envolvem policiais.
Cris Carmem – Qual a explicação para que mesmo após a construção de um presídio militar seguro, as autoridades insistem em permanecer com os PMs acusados de participação em grupo de extermínio em presídio federal, já que, pelas prerrogativas dos policiais militares, eles deveriam ficar presos em presídio militar? Isso não é arbitrário?
Eu desconheço as razões pelas quais eles estão em penitenciária de segurança máxima. Mas acredito que se foi tomada essa decisão, ela deve ter lastro importante. Afinal de contas, trata-se não mais de policiais, mas de uma quadrilha.
Débora Gomes – Gostaria de saber por quê os policiais estão sendo tratados como bandidos, como fossem tentar uma fuga?
A resposta deve ser da própria consciência de cada um de nós. Eles serão julgados. A Polícia Federal tem fortes indicações de que se trata de uma organização criminosa que teve como principal prática homicídios com simulação de que teriam sido praticados em confronto com as vítimas. E havia crianças e adolescentes, mulheres sem nenhuma prática e envolvimento criminoso, que foram mortas, e ainda ocultação de cadáveres. Os senhores e senhoras acreditam que de fato o Estado de Goiás, a República Federativa do Brasil, devem ser tolerantes com atos desse tipo? Ou devem ter o cuidado para que esse grupo que tinha a confiança do povo de Goiás, da comunidade, dos governadores, de todos, e abusou dessa confiança e se tornou uma organização criminosa. Certamente muitas pessoas hoje, até mesmo se sentem ameaçadas pelo fato deles estarem presos. Os policiais afastados podem estar em segurança máxima não só para proteção das informações mas para proteção deles próprios, já que talvez existam aqueles que, não querendo que eles falem, possam ameaçá-los. Se eles estão em uma penitenciária de segurança máxima e nas condições que estão é por determinação da Justiça.
Deejay Adriano Ferreto – Por que a Secretaria dos Direitos Humanos nunca se pronuncia quando algum deputado fala contra os direitos humanos? No dia 22 de março, em uma entrevista para o Jornal Hoje, o deputado João Campos (PSDB-GO) disse que agredir homossexuais é liberdade de expressão…
A secretaria coordena um programa chamado Brasil Território Livre da Homofobia. E tem plena atividade contra a homofobia. No que pesa a parlamentares, eu acredito que o protagonismo fundamental deve ser da própria Câmara dos Deputados. Nós não somos corregedores dos parlamentares.
Léo Mendes – Por quê a Secretaria Nacional de Justiça fechou o Grupo de Trabalho para Segurança LGBT, sendo que a cada dois dias um homossexual é assassinado no Brasil?
Já instituímos formalmente o Conselho de Direitos da População LGBT e lançamos o Programa Faça do Brasil um Território Livre da Homofobia e estamos atentos a todas as questões. Vamos fazer a Conferência Nacional LGBT neste ano e lançamos um módulo de denúncias onde através do número 100, que antes era para receber denúncias de violência contra a criança, mantemos o número para que as pessoas que tenham denúncias de violência contra a criança, mas também denúncias de violência que atinja a população LGBT, denúncias de violências contra idosos e vários outros grupos, como moradores de rua. O Ministério da Justiça e nós, e os Ministérios da Educação e da Saúde estamos integrados contra a violência homofóbica.
Antenor Pinheiro – Em que medida a função pericial do Estado, por meio da criminalística e da medicina-legal, pode se constituir ferramenta estratégica e efetiva no combate à impunidade, e qual a sua importância no contexto dos direitos humanos?
O trabalho dos peritos é de inteligência para a investigação. Se tivermos, realmente a valorização da perícia e a autonomia, nós poderemos ter uma atuação onde as denúncias e a busca da responsabilização diante de crimes não dependa exclusivamente da testemunha. Mas possa aferir fatos, personalizar fatos e possa recuperar a verdade de cada episódio. Observo isso de forma muito forte diante dos desaparecidos em Goiás e mesmo nos desaparecidos do período da ditadura militar. Quero dizer que nós precisamos estar integrados, os direitos humanos e os estudiosos das perícias para que possamos firmar no Brasil uma sociedade onde a verdade venha à tona e o crime não compensa.
Fonte: Jornal O Popular/ Foto: Agência Brasil em 26 de março de 2011.
Muito bem Cida,
ResponderExcluirParabéns pela contribuição na entrevista e pela luta na divulgação das informações e da entrevista por meio do blog.
Parabéns pela luta.
Rosimar Silva
Goiânia -GO
sou policial militar do rj, tenho 10 anos de policial, passei o pão que o diabo amasso com o governo do garotinho e rosinha, pois morria um policial por dia e eles não fizeram nada, aumento nem pensar, foram 9 anos com um reajuste de 10% parcelado, agora no governo de cabral que vemos alguma melhora, mais em compensação passamos por uma ditadura no momento, será que não temos direito de pedir um slario digno de expressar o que sentimos, o que nossas familias precisam...isto e verdade exelencia somos a pior escala do Brasil, dos funcionarios da segurança somos os que correm mais risco, trabalham mais horas e ganham menos...não e possivel que vocês doutores achem isto correto...por favor socorro, nos ajude.
ResponderExcluirrespeitosamente um Cb PM RJ.