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Carla Regina Calderoni*
Uma das características do ser humano é necessitar de cuidados de outro ser humano para sobreviver em seus primeiros anos de vida. Precisamos de outro ser humano maior que nós, para que possamos sobreviver. Esse “maior que nós” permeia nossas relações por um tempo: da infância à adolescência. Na relação entre adulto e criança/adolescente, o adulto não somente é maior em tamanho físico, mas está superior, pois é ele quem está no comando.
Existem coisas que somente os adultos podem e sabem fazer. Durante um bom tempo de nossa vida infantil, é o adulto quem decide nosso destino, seja este a mãe, o pai, um irmão mais velho, um tio, a Justiça, etc. Logo, o adulto tem o poder, no sentido próprio do verbo: ele pode, o adulto pode, e esse poder é essencial para a sobrevivência do ser humano infantil. O adolescente, embora “sobreviva” sem o adulto, ainda necessita de seus cuidados até tornar-se um adulto também e guiar sua própria vida.
O adulto, além de ser aquele que toma decisões para a criança e o adolescente, é, ao mesmo tempo, aquele que lhe apresenta o mundo e suas regras sociais. Quando o adulto, em sua intenção de educar a criança/adolescente, utiliza de agressão física, por mais “inofensiva” que esta seja, está mostrando que “bater” faz parte da educação e que a criança não tem escolha, a não ser aceitar o que está sendo imposto a ela.
O que são palmadas? O que são beliscões? São tipos de agressão física. São modos de chegar ao corpo do outro de maneira intrusa. O movimento das palmadas é o de empurrar e bater repetidas vezes num corpo. Os beliscões são torções de algum corpo. Então, estamos falando de empurrar, bater repetidas vezes e torcer corpos. Mesmo que a palmada e o beliscão sejam “fracos” são esses movimentos em corpos pequenos. Pequenos não somente fisicamente, pois existem crianças e adolescentes grandes em tamanho físico, mas pequenos em possibilidades de se defender, pois a relação de poder entre esses corpos, o do adulto e o da criança/adolescente, é o que está em jogo nesse momento. E isso vale para as agressões verbais também.
Agressões verbais podem ser tão ou mais devastadoras que as agressões físicas. Mas que isso não justifique a deliberação das agressões físicas “fracas”. O contrário é igualmente lembrado: havendo proibição de “palmadas e beliscões” que não hajam “palmadas e beliscões verbais”, pois eles também machucam.
De que estamos falando? Estamos falando de relação de poder na educação. O adulto, enquanto a criança ou o adolescente está sob sua tutela, tem mais poder. Somente esse fato já seria o suficiente para que o adulto perceba que o ato agressivo, seja ele físico ou verbal, é uma covardia.
Mas o adulto, por outro lado, pode sentir-se perdido em meio à educação de seu filho, pois, afinal, precisa colocar limites na sua criança. Para o desenvolvimento sadio da criança e do adolescente é importante que haja limite sim, pois limite também é amor, é abrigo. Limite é demarcação de lugares e oferece referências para a criança e o adolescente. Através dos limites é que pode se conhecer também possibilidades e criar parâmetros para o que é bom e ruim. A falta de limites pode trazer consigo a sensação de desabrigo, de abandono.
No entanto, é possível que haja limites sem agressão física nem verbal, mas com firmeza. O que é ser firme? É conseguir estabelecer limites estando seguro daquilo que está fazendo, sem utilizar da agressão. Conversar com a criança e o adolescente, explicando os motivos das censuras, proibições, ou broncas, é um modo de educar, sendo firme. A firmeza traz a segurança que a criança e o adolescente necessitam para desenvolverem-se saudavelmente.
Quando o adulto é firme e não agressivo, ele está educando, colocando limites sem covardia.
*Carla Regina Calderoni é psicóloga, mestre em Psicologia Clínica, membro da Sociedade de Psicodrama de São Paulo
Fonte: Correio Popular online, 04/08/2010
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