17 de nov. de 2010

TV Serra Dourada discute práticas violentas na educação das crianças






Por Rosimar Silva


Nos dias 16 e 17 de novembro, a psicóloga Cida Alves, do Núcleo de Prevenção das Violências e Promoção da Saúde, da Secretária Municipal de Saúde de Goiânia, participou do “Programa do Meio dia”, da TV Serra Dourada, afiliada do SBT, em Goiânia.

No dia 16, Cida Alves foi entrevistada no estúdio do programa. O assunto foi o projeto de lei que proíbe os castigos físicos e humilhações na educação e no cuidado de crianças e adolescentes, enviado pelo governo federal ao congresso nacional. Na oportunidade, a TV convidou também Omar Borges de Souza, conselheiro Tutelar de Goiânia, que discorda da aprovação da lei. Segundo o conselheiro, “o Brasil tem coisas mais importantes para se preocupar”.

Na condição de entrevistada favorável à aprovação da lei e contra qualquer tipo de violência na educação das crianças, Cida Alves argumentou que “castigos físicos não contribuem na verdadeira educação das crianças, ao contrário prejudica a sua formação”.

Repercussão
Apesar do curto espaço de tempo do debate na televisão, houve uma grande repercussão entre os telespectadores e a direção de jornalismo resolveu continuar com o assunto no dia seguinte, 17 de novembro, e enviou um jornalista à casa da psicóloga Cida Alves para fazer uma entrevista sobre o assunto.

Nesta segunda oportunidade, Cida mostrou números que evideciam a gravidade, a freqüência e o risco de letalidade que envolve a violência física contra crianças e adolescentes no Brasil.

Espaço na TV
Cida Alves disse que “é importante contar com o apoio da grande mídia para fazer chegar até os pais e mães informações que esclareçam como a prática de bater para educar afeta negativamente a saúde e o desenvolvimento afetivo e intelectual das crianças e dos adolescentes”.

Cida disse também que “como profissional da saúde pública e pesquisadora tenho a tarefa de promover e facilitar a divulgação de informações que contribuam com a superação de práticas atrasadas que submetem crianças e adolescentes à dor e ao sofrimento em nome da educação familiar”, finaliza.


Atenção:
em breve será postado a reportagem completa.


Veja abaixo algumas consequências da violência física intrafamiliar contra crianças e adolescentes




Pesquisas científicas e observações clínicas apontam que os castigos físicos contra crianças e adolescentes:

1. Contribuem para o desenvolvimento de fusões patológicas ou disfuncionais (Teoria do duplo vínculo).

Nessa forma de disciplinamento há mensagens muito perigosas, em que se funde amor com dor, cólera e submissão: “eu te puno para o teu próprio bem, eu te machuco porque te amo”. A dupla mensagem que a punição física carrega pode levar ao desenvolvimento de:

• disfunções preceptivas,
• transtornos adaptativos; e
• comportamentos estereotipados na vida.

No trabalho terapêutico encontrei muitas mulheres que sofriam com os atos de violência do marido ou parceiro sem conseguirem se proteger ou encontrar uma alternativa de mudança para o seu padrão de relacionamento conjugal. Essas mulheres tinham, em comum, uma história de violência anterior, praticada pela família de origem. Muitas expressavam em seu comportamento submisso uma adaptação estereotipada às condutas violentas (psicológica, sexual ou física) que sofriam de seus pais ou cuidadores quando meninas. Porém, o impressionante é que elas traziam subjacentes a dor e o medo, a crença de que quem pune ou castiga com violência é porque tem sentimentos verdadeiros, porque ama (Cida Alves).

2. oferecem um modelo inadequado, por parte dos adultos, de lidar com situações de conflitos, que é o uso da força, da violência (Aprendizagem social da violência).

De acordo com os resultados de uma pesquisa, realizada por Simone Assis, os jovens que sofrem violências intrafamiliares do tipo físico severo, psicológico e sexual são:

a) 3,2 vezes mais transgressores das normas sociais;
b) 3,8 vezes mais vítimas da violência na comunidade; e
c) 3 vezes mais alvos de violência na escola do que os jovens cujo ambiente familiar é mais solidário e saudável.

Os resultados dessa investigação reforçam o entendimento de que a violência intrafamiliar potencializa a prática da violência social, pois sua dinâmica nutre um padrão de adaptação à agressão física e de resposta a ela (ASSIS, 2005).


4. Dificultam ou deteriora os vínculos afetivos entre pais e filhos.

Na pesquisa
A disciplina como forma de violência contra crianças e adolescentes (MARQUES et al., 1994), alguns depoimentos evidenciam o comprometimento do vínculo familiar em decorrência do padrão interacional violento. Dois relatos ilustram como a violência física afetou a vida dos sujeitos entrevistados. Em um depoimento um sujeito diz: “tive vários conflitos com meu pai, que era uma pessoa muito rígida. Saí de casa quando tinha 12 anos. Com 15 anos voltei para casa, mas meu pai continuava o mesmo. Por isso, fui embora e nunca mais voltei” (apud MARQUES et al., 1994). Em outra entrevista, um sujeito informa: “quando eu era pequena, eu era muito castigada. Meu pai era muito agressivo. Ele batia até tirar sangue, que era para a gente aprender. E por isso, eu casei muito cedo para fugir dele” (apud MARQUES et al., 1994). O casamento precoce ou o abandono do lar foi o caminho encontrado por esses dois sujeitos para romper com a relação familiar violenta.

O Estudo causal sobre o desaparecimento infanto-juvenil (SÃO PAULO, 2005), coordenado pelo Departamento de Medicina Legal da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), aponta que a violência física intrafamiliar pode conduzir a situações extremas de quebra de vínculos familiares. Esse estudo comparou o ambiente de 170 famílias que tiveram crianças e adolescentes desaparecidos (grupo caso) com duzentas famílias que não vivenciaram episódios de desaparecimento, mas moravam na mesma rua e possuíam filhos na mesma faixa etária (grupo controle).

De acordo com esse estudo as razões que provocaram a saída de casa das crianças e adolescentes foram:
agressões físicas (35%), alcoolismo dos pais ou dos jovens (24%), violência doméstica presenciada pela criança ou adolescente (21%), drogas usadas pelos filhos ou os progenitores (15%), abuso sexual/incesto (9%) e negligência (7%). Os demais casos registrados são de seqüestro e raptos (SÃO PAULO, 2005).

5. Promovem compromentimentos no rendimento intelectual.

Coeficiente intelectual

De acordo com uma investigação feita pelo professor Murray Straus, da Universidade de New Hampshire, nos Estados Unidos, meninos e meninas castigados fisicamente apresentam, depois de quatro anos, um coeficiente intelectual baixo em comparação com os que nada sofreram.

No grupo mais jovem, as crianças que não apanharam apresentaram 4 pontos a mais em seu coeficiente de inteligência do que as crianças que foram castigadas fisicamente.

No grupo de crianças entre os 5 e 9 anos de idade, aqueles que não apanharam tiveram 2.8 pontos a mais em seu coeficiente intelectual que do os que sofreram castigos físicos, depois de quatro anos.


6. Facilitam o surgimento de desvio no comportamento, como esconder ou dissimular por medo do castigo físico.

O comportamento desejado só ocorre na presença do punidor, pois o controle deste se dá por coação externa e não pela aceitação íntima da criança ou adolescente. Além de que a restrição imediata de um comportamento inadequado pelo uso da dor impede pais e filhos de conhecerem as origens das dificuldades e suas motivações, ficando mais difícil a real elaboração e superação dos mesmos.

7. possibilitam o surgimento de dificuldades na aprendizagem e na internalização das regras e dos valores de certo e errado, pois elas vêm associadas a sentimentos e sensações negativas.

8. aumentam as chances de aparecer dificuldades na aceitação da figura de autoridade

9. facilitam o desenvolvimento de auto-conceito negativo e baixa auto-estima.

10. promovem dificuldades no relacionamento com outras crianças e adultos.

11. desenvolvem uma
capacidade prejudicada de acreditar nos outros.

Estudos comparativos, coordenados pelo psiquiatra da Escola de Medicina de Harvard, professor Martin H. Teicher (saiba mais), demonstraram que as conseqüências das violências podem ir além das dificuldades afetivas e comportamentais. Suas pesquisas identificaram alterações na morfologia e fisiologia das estruturas cerebrais de pessoas que foram vítimas de maus-tratos em fases precoces de sua vida.

Pesquisadores fazem o seguinte alerta: filhos de pais dominadores, coercitivos, explosivos e espancadores
tendem a desenvolver uma reação complementar patológica. Ou tornam-se extremamente submissos, assustados, podendo desenvolver processos psicopatológicos graves como fobias, traços psicóticos e depressão. Ou caminham para outro extremo: rebelam-se, assumindo traços de delinquência.



Um comentário:

  1. Cida,

    Parabéns por contribuir e dividir com a sociedade goiana o seu estudo e sua experiência. Quero ter a oportunidade de assistir as entrevistas. Eu atendo muitas crianças e sempre sou questionada sobre os castigos físicos, já que são vistos culturalmente como requisito indispensável na educação. Mudar essa crença é uma tarefa árdua, afinal, o que colocar no lugar dos castigos/surras??? Os cuidadores precisam de dicas práticas, objetivas. Preciso de orientação nesse sentido!!!!

    Grande abraço.........................
    Sara Marques
    Psicóloga da Secretaria Municipal da Saúde de Goiânia

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