Décimas
para El Guernica
“La
sangre gris en el lienzo
Clava
su lanza y salpica
No
hay rojo más intenso
Que
los grises del Guernica”
André
Romero
Décimas
para Guernica
O
sangue cinza na tela
Clava
a lança e salpica
Não
há vermelho mais intenso
Que os cinzas de Guernica
André
Romero
___________
Vermelhos de Guernica
Por
Cida Alves
“Não sou hipócrita, não desejo ao fascista pronto reestabelecimento. Sou justo, desejo a ele exatamente o que ele deseja a negros, índios, militantes de esquerda, do movimento sem-terra, aos transexuais, aos homossexuais e aos que dele divergem. Desejo exatamente o mesmo. Em gênero, número e grau” (Fernando Horta).
“A
farsa do atentado do Bolsonaro” é mais um dos brilhantes artigos de Fernando Horta.
Sem reparos em seus apontamentos sobre as verdades do atentando ao senhor messias
e a farsas das narrativas construídas depois do ato criminoso. Entretanto, não
concordo com o desfecho final. Não sou hipócrita, compreendo a indignação e até
mesmo o ódio em casos como o do candidato a presidente - político que foi eleito
o “mais repulsivo do mundo” pelo site australiano News.
Ódio,
raiva, medo são sentimentos legítimos, como todos os demais. Sentimentos e
desejos não são regidos pela ordem moral. Eles aparecem em nossa psique e
pronto. O problema não é o sentimento de ódio em si, mas sim a sua não
elaboração. Não tenho dúvida que a obra “Guernica”, foi pinta por Picasso com
um ódio retumbante aos senhores da Guerra. Acredito que havia vestígios de ódio aos
racistas estadunidenses no magistral discurso “Eu tenho um sonho” de Martin Luther
King. Alias, semelhante a Jean Paul Sarte, eu “odeio as vítimas que respeitam
os seus carrascos”.
O messias - minúsculo mesmo, é uma figura
abjeta, grotesca, abominável, mas não desejo o que ele deseja. Não desejo pra
ninguém o que ele deseja para mim. Como mulher de esquerda, feminista e com
ancestralidade negra e índia, sei que estou na linha de tiro de seu ódio, todavia
não desejo sua eliminação. O fascismo é traiçoeiro, ele sabe capturar pela
emoção e a irreflexão. Não tolerar a existência do outro,
que valoro como diferente ou meu oponente, é um dos princípios do fascismo.
Combater o fascismo é matar sua semente, impedido que ele nasça em mim também.
Talvez seja presunção de minha parte, soberba
não sei, mas não me sinto igual às pessoas como o messias, pois jamais desejei
que:
- A Ditadura matasse e não apenas torturasse
seus opositores;
- A PM matasse 1.000 e não 111 presos, referindo
se a Chacina do Carandiru, pois “bandido bom é bandido morto”;
- Que um filho morresse num acidente para que
nunca aparecesse com um bigodudo por aí;
- Que a Dilma Rousseff, então presidenta do
Brasil, morresse de câncer ou infarto;
- Que a mesma Dilma, revivesse o trauma da
tortura, ao exaltar a memória do cruel torturador Brilhante Ustra no momento do
voto no golpe jurídico parlamentar de 2016;
- Que mulher ganhasse menos que homem por que
engravida;
- Que índios e quilombolas não tivessem seus
territórios respeitados e demarcados;
- Que o médico que acompanhava a Dona Marisa
realizasse um procedimento letal para matá-la;
- Que o ex-presidente Lula sofresse a perda da
mulher a amada sem direito a pranto, revolta ou luto;
- Que mulheres como Mariela nunca ocupassem
espaços de poder e prestígio;
- Que pretos e pobres não frequentassem os espaço
de distinção e prestígio social. Essa gentalha em aeroportos, shopping centers,
universidades, isso já é muito desaforo;
- Que pretos e pobres sigam tendo seus direitos negados
sistematicamente, para que eles sirvam de mão de obra barata, “carvão para
queimar”, mantendo assim o histórico privilégio da elite de alma escravocrata.
Meus desejos, mesmo os mais sombrios, não se
assemelham aos do messias, nem tão pouco dos de seus seguidores ou dos que se alinham
com suas ideias. O que desejo de verdade para abominável messias é o
ostracismo, que ele e seus filhos percam todas as eleições e nunca mais ganhem
a vida e se enriqueçam a custo dos recursos públicos. O mundo público – ação política
e riquezas coletivas, deve estar a serviço da construção do bem comum, que está indubitavelmente
alicerçado nos princípios da IGUALDADE, da JUSTIÇA e da LIBERDADE.
Foto: Clara Alves - Alvorecer no Morro do além, Goiânia, 27 de agosto de 2018.
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