24 de jul. de 2015
22 de jul. de 2015
Aborto de “bandidos” no útero: Ou como o poço não tem fundo no Brasil - Leonardo Sakamoto
“Um dia, nós chegaremos a um estágio no qual seremos capazes de determinar se a criança no útero da mãe tem tendências criminais e, se sim, a mãe não será autorizada a dar à luz.''
A declaração teria sido por Laerte Bessa (PR-DF), relator do projeto de redução da maioridade penal, ao jornal inglês The Guardian e resgatada pela revista Fórum, no melhor estilo Minority Report – aquele filme em que Tom Cruise prende os bandidos antes deles cometerem os crimes. Uma outra declaração dada por ao jornal afirma que, em duas décadas, reduziremos a maioridade para 12 anos.
Em nota divulgada por sua assessoria de imprensa, ele disse que não falou em aborto e que a matéria escrita em inglês “ganhou interpretações erradas''.
Mas, vejamos: recebi, meses atrás, uma doce mensagem de leitor dizendo que “mãe de bandido deveria ser esterilizada''.
Não fiquei chocado porque, depois da popularização da internet, nada me choca. Ok, talvez Datena como possível candidato à prefeitura de São Paulo mas, fora isso, nada. O pior é que se perguntar para o missivista se é a favor de garantir às mulheres a autonomia sobre o próprio corpo, ele cospe na sua cara.
Daí, tentando seguir essa linha de pensamento ignorante e imbecil, ironizei o comentário do leitor, em um post em abril deste ano:
“Talvez seja essa a saída e não a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos: Esterilizar úteros que pariram criminosos de forma a interromper o terreno fértil para crimes. Ou, talvez, se nossa ciência permitir, descobrir com cálculos precisos os úteros ruins e impedir que deles brote algo.''
Um amigo jornalista, que leu o post na época, me alertou para tomar cuidado com textos ficcionais que forçavam a barra. “Tá louco, Saka? Quem toparia uma aberração dessas? Não viaja…''
Rá!
Leia também:
Ao invés de reduzir a maioridade, que tal esterilizar mães de bandidos?
Isso ensina uma lição, meu caro amigo: Pense no pior filme B de terror? Ele não se compara à realidade brasileira.
Escrevi naquele post também que, conhecendo nossa sociedade, os “úteros ruins'' passíveis de aborto forçado não serão úteros ricos, que sempre tiveram acesso a tudo e que repousam em lençóis de algodão egípcio – mesmo que de alguns deles tenha brotado os que põem fogo em indígenas em pontos de ônibus, espancam pessoas em situação de rua ou atropelam ciclistas.
Mas úteros negros e pardos, que lavam roupa, fazem faxina e não raro criam os filhos sozinhos. Úteros que andam de ônibus, ganham uma miséria, dividem-se entre o trabalho e a família. E, por isso, não vivem, apenas sobrevivem, enfileirando dias e noites, na periferia de alguma grande cidade.
Depois desse episódio profético, se eu fosse você, acreditaria no alerta que venho fazendo há tempos: com esse Congresso Nacional, nada está a salvo. Nem o direito das mulheres ao voto, nem a República, muito menos a Lei Áurea.
Fonte: Blog do Sakamoto
20 de jul. de 2015
Vendem-se milagres! - Luiz Ruffato
Aceitar que Eduardo Cunha paute as demandas da sociedade com suas ideias retrógradas é admitir melancolicamente que já não alimentamos sonhos de um futuro melhor
O presidente da Câmara, Eduardo Cunha. / FABIO RODRIGUES POZZEBOM (AGÊNCIA BRASIL)
Por Luiz Ruffato
Em agosto, a Câmara dos Deputados vota, em segundo turno, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos, projeto imposto pelo presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), como solução para a violência urbana no país. Cunha, com sua estreita visão populista, consegue mobilizar a parte da população que acredita poder resolver profundos problemas estruturais com rasas ideias salvacionistas. O que ele oferece ao Brasil são milagres – e quem busca milagres são aqueles que já perderam toda a esperança.
A questão é que aqueles que perderam a esperança não pensam racionalmente, mas agem por impulso na crença em algo improvável. É assim que crescem as seitas fundamentalistas, é assim que surgem as lideranças messiânicas. Uma sociedade desencantada é um organismo refém de aventureiros. Já vivenciamos situação semelhante em tempos recentes, quando, em 1990, com o país destruído pelos militares e pela gestão desastrosa de José Sarney, entregamos a Presidência da República a Fernando Collor de Melo, um político obscuro que transformou a administração pública num balcão de negócios.
Aquele conturbado período de desmandos provocou um sério desvio de conduta na jovem democracia brasileira. Se num primeiro momento pensamos que aoperação que forçou Collor a renunciar extirpara de vez o tumor da corrupção, logo o vimos ressurgir, agressivo e devastador, alastrando por todos os setores da sociedade e atingindo até mesmo políticos e partidos que julgávamos imunes àdoença, como o PSDB de Fernando Henrique Cardoso e o PT de Luiz Inácio Lula da Silva. Hoje, as metástases desse câncer colocam em risco a própria sobrevivência da nossa democracia.
Aceitar que Eduardo Cunha paute as demandas da sociedade com seu catálogo de ideias retrógradas é admitir melancolicamente que já não alimentamos sonhos de um futuro melhor. Cunha, que surgiu para a política pelas mãos do então tesoureiro de Collor, Paulo Cesar Faria, de funesta memória, possui extensa ficha corrida na Justiça, incluindo citação no processo daOperação Lava Jato. Seu discurso oportunista viceja entre os despossuídos sociais, os desamparados ideológicos, os fracos de vontade, os ignorantes.
A primeira e necessária condição para tentar resolver um problema é aceitar que temos um problema. Nossa sociedade, individualista e narcisista, embora perceba que algo não vai bem no seu entorno, prefere responsabilizar o próximo pelas mazelas e aguardar de braços cruzados soluções mágicas. A violência urbana não é enfermidade, mas sintoma. A inacreditável taxa de homicídios – 29 assassinatos a cada 100 mil habitantes, a 11º do ranking mundial – tem que ser compreendida de maneira ampla. São várias as suas causas: o tráfico de drogas, a desigualdade social, a disseminação de armas de fogo, o álcool, a corrupção, a educação de péssima qualidade, o desemprego, a impunidade, a aceitação pela população da ruptura jurídica (chacinas, execuções sumárias, tortura), a desestruturação dos núcleos familiares, o racismo, o machismo, a homofobia, o desrespeito aos direitos básicos dos cidadãos.
Chega a ser patético pensar que a maior parte da população acredita – pois trata-se de questão de fé – que a diminuição da maioridade penal de 18 para 16 anos significará um passo adiante no enfrentamento do complexo tema da violência urbana. Enquanto nos mantemos alienados, recusando a assumir nossa cota de responsabilidade, delegamos a solução do problema a curandeiros, que oferecem milagres a baixo custo. O ponto é que, atuando assim, nos tornamos dependentes de ações complementares, e o curandeiro ganhará mais e mais espaço em nossa vida. Vivemos numa democracia, imperfeita, mas em curso. Resta saber o queremos legar aos nossos descendentes. Podemos pensar grande e nos orgulharmos de deixar para eles um país mais decente, mais justo, mais solidário. E podemos assumir nossa mediocridade, acatando as promessas que o camelô espiritual da esquina nos oferece.
Fonte: El país em 15 de julho de 2015
17 de jul. de 2015
Cora Coralina, do século passado e do umbigo do mundo – Goiás\Brasil ¬ Cora Coralina, del siglo pasado y del ombligo del mundo - Goiás\Brasil
Colaboração: Osair Manassan e Ademar de Queiroz