"bate neu, tháa, tháa. Faça isso não mãe [...] Meu pai que nunca tinha me batido, acuda êhhh pai, solta Gonzaga, Santana! [...] Minha mãe me soltô e meu pai emendô. Olha só, aí eu fiquei triste. Aí eu dei no pé. Fugi!"
Luiz Gonzaga
“No entendimento de Azevedo e Guerra (1995), a
punição física interfere muito nos vínculos entre pais e filhos. Esse tipo de
disciplinamento gera sentimentos de raiva, cólera, de angústia dos filhos em
relação aos que lhes causam dor e sofrimento físico. Muitos pais acreditam que
esse método é funcional no controle do comportamento de seus filhos, no
entanto, ele é obtido por meios não-educativos, como ‘o medo e a intimidação.
Portanto, o relacionamento pais-filhos não está se dando num plano de cooperação,
de respeito mútuo’ (AZEVEDO; GUERRA, 1995, p. 26).
Na pesquisa A disciplina como forma de violência
contra crianças e adolescentes (MARQUES et al., 1994), alguns depoimentos
evidenciam o comprometimento do vínculo familiar em decorrência do padrão
interacional violento. Dois relatos ilustram como a violência física afetou a
vida dos sujeitos entrevistados. Em um depoimento um sujeito diz: ‘tive vários
conflitos com meu pai, que era uma pessoa muito rígida. Saí de casa quando
tinha 12 anos. Com 15 anos voltei para casa, mas meu pai continuava o mesmo.
Por isso, fui embora e nunca mais voltei’(apud
MARQUES et al., 1994). Em outra entrevista, um sujeito informa: ‘quando eu era pequena,
eu era muito castigada. Meu pai era muito agressivo. Ele batia até tirar
sangue, que era para a gente aprender. E por isso, eu casei muito cedo para
fugir dele’(apud MARQUES et al.,
1994). O casamento precoce ou o abandono do lar foi o caminho encontrado por esses
dois sujeitos para romper com a relação familiar violenta.
A fuga de casa foi também a opção do jovem cantor e
compositor nordestino, Luiz Gonzaga, após ter sido surrado pela mãe e pelo pai.
Em uma gravação ao vivo, no show Volta pra curtir de 1972, ele conta como
ocorreu a sua arribada de casa (anexo V). O cantor conhecido como o Rei do
Baião conta a sua história ao som do triângulo e da zabumba:
‘Só voltei em casa 16 anos depois da minha
arribada. Só fugi de casa porque eu queria casar. Mãe era mulher violenta,
casar haaam! Mas eu era tocadozinho pé de serra, namorador como o diabo, neguim
fiota...Namorei uma estudante. Aí menino quando o pai da moça soube deu uma
polpa da moléstia. (...) Na mesma hora mãe, nós voltamos pra casa (...). Daí a
pouco menino foi um São João de Rei lá dentro da Camarinha, tháa, tháa
[imitando sons secos de pancadas], (...) toma, toma valente, tháa, tháa [sons
de pancadas]. (...) meu pai que nunca tinha me batido aproveitou e emendou...
Ah menino só voltei 16 anos depois (...)’ (GONZAGA, 1972).”
Fragmento da dissertação
de SILVA, Maria Aparecida A. da. A violência física intrafamiliar como método educativo punitivo disciplinar e os saberes docentes. 2008. 224 p. Dissertação (Mestrado em Educação) -Universidade
Federal de Goiás, Goiânia, 2008.
Foto:
cena do filme “De pai para filho” de Breno Silveira
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