Foliãs unidas no carnaval 2016. Foto: Maurício Araújo
Conhecida ou não, vá para os blocos e festas preparada para oferecer ajuda para qualquer mulher que precise. E a gente dá umas ideias de como colocar a campanha em prática
Publicado 05/02/2017 por AMANDA NEGRI
ERRATA: Na
última versão da reportagem, esquecemos de mencionar
que a campanha do ano passado #CarnavalSemAssédio foi feita
em parceria com o Catraca Livre, o Vamos Juntas?, o #AgoraqueSãoElas
e o Nós, Mulheres da Periferia, que fizeram
que a campanha do ano passado #CarnavalSemAssédio foi feita
em parceria com o Catraca Livre, o Vamos Juntas?, o #AgoraqueSãoElas
e o Nós, Mulheres da Periferia, que fizeram
uma linda folia feminista
conosco.
Diariamente nos vemos expostas a
situações de assédio, medo e violência
simplesmente por sermos mulheres. O Brasil é o quinto país em que
mais mulheres são assassinadas no mundo e, por aqui, acontecem
mais de meio milhão de estupros anualmente. Agressões cuja
simplesmente por sermos mulheres. O Brasil é o quinto país em que
mais mulheres são assassinadas no mundo e, por aqui, acontecem
mais de meio milhão de estupros anualmente. Agressões cuja
culpa, frequentemente, é colocada sobre a mulher por causa de uma
cultura que nos educa a pensar assim: roupa
muito curta, estava bêbada,
estava querendo, ela dá pra qualquer um, e por aí vai…
Se no dia a dia isso já gritante, imagine
estava querendo, ela dá pra qualquer um, e por aí vai…
Se no dia a dia isso já gritante, imagine
no Carnaval!
Um período
que deveria ser leve e divertido com frequência acaba
se tornando um evento em que policiamos fantasias e comportamentos
por medo do que pode acontecer. E acontece, como foi com Tami Rodrigues,
enquanto tentava se recuperar da bebedeira, começou a ser
assediada por homens que tentavam beija-la à força.
se tornando um evento em que policiamos fantasias e comportamentos
por medo do que pode acontecer. E acontece, como foi com Tami Rodrigues,
enquanto tentava se recuperar da bebedeira, começou a ser
assediada por homens que tentavam beija-la à força.
“Depois
desses episódios eu passei a beber bem menos e a ficar
muito mais ligada em festas e bares, infelizmente.”
muito mais ligada em festas e bares, infelizmente.”
Mas isso não
é, nem de longe, normal. Por isso, no
ano passado
tentamos educar os homens para um #CarnavalSemAssédio,
junto com o Catraca Livre, o Vamos Juntas?, o #AgoraqueSãoElas e
o Nós, Mulheres da Periferia. E esperamos que o sucesso
ano passado
tentamos educar os homens para um #CarnavalSemAssédio,
junto com o Catraca Livre, o Vamos Juntas?, o #AgoraqueSãoElas e
o Nós, Mulheres da Periferia. E esperamos que o sucesso
das dicas de 2016 continue
repercutindo este ano.
Nosso foco,
neste ano, são as minas. Mesmo que o assédio continue
acontecendo, não precisamos encará-lo sozinhas. Afinal, um dos lemas
do feminismo é a sororidade, ou seja, a irmandade entre as mulheres.
E isso também é sobre socorrer uma mina passando mal no meio da rua.
É sobre se meter numa briga para defender outra mulher.
É sobre não concordar e lutar contra qualquer tipo de assédio,
abuso ou tentativas. É sobre oferecer companhia. É sobre prestar ajuda,
acontecendo, não precisamos encará-lo sozinhas. Afinal, um dos lemas
do feminismo é a sororidade, ou seja, a irmandade entre as mulheres.
E isso também é sobre socorrer uma mina passando mal no meio da rua.
É sobre se meter numa briga para defender outra mulher.
É sobre não concordar e lutar contra qualquer tipo de assédio,
abuso ou tentativas. É sobre oferecer companhia. É sobre prestar ajuda,
do jeito que for e pra quem for,
principalmente quando se trata de outras mulheres.
Nesse
carnaval, #UmaMinaAjudaAOutra.
E isso pode
fazer toda a diferença, como lembra Maria*. No último Carnaval, ela
foi
levada para uma delegacia por fazer xixi na rua, sendo agredida
verbalmente
pelos policiais. Tinha certeza que as coisas terminariam mal até que
uma advogada que ela nem sequer conhecia largou a
folia de lado e a resgatou.
pelos policiais. Tinha certeza que as coisas terminariam mal até que
uma advogada que ela nem sequer conhecia largou a
folia de lado e a resgatou.
Para
inspirar, confira mais histórias como essas, que rolaram em outros
Carnavais –
e vão crescer feito grama nesta aqui
Uma desconhecida me resgatou na delegacia
“Estava acompanhada de um amigo e tinha bebido duas latinhas de
cerveja e muita água, não estava alcoolizada ainda, mas me deu
muita vontade de urinar. As filas estavam gigantescas. Eu fiquei
muito desanimada pra encarar, mas era o que tinha.
cerveja e muita água, não estava alcoolizada ainda, mas me deu
muita vontade de urinar. As filas estavam gigantescas. Eu fiquei
muito desanimada pra encarar, mas era o que tinha.
Ai meu amigo disse:
— Tem uma
galera fazendo xixi nessa ruazinha, vamos lá
Retruquei:
— Não
vou arriscar fazer xixi na rua à luz do dia (devia ser uma ou duas da tarde).
Você é homem e fica de costas, mas mulher não dá, vou ter que agachar.
Eu sei que
ele fez, e eu fui ficando apertada. Então vi um lugar que tinham dois
carros
estacionados, uma área de recuo, mais discreta, e, no desespero,
pensei:
vou encarar. Enquanto eu to fazendo o xixi, ouço uma sirene de polícia.
De repente
para um carro ali, a galera toda começa a correr, e aparecem dois
caras do GOE
(Grupo de Operações Especiais de São Paulo), inteiros de preto.
Parei o xixi no meio,
subi meu short. Eles tiraram o meu amigo da frente e me
pegaram
com força no braço. Eu subindo meu short, foi humilhante, horrível.
Eu tentando abotoar a bargilha e ele me jogando no meio da rua.
Um deles destranca a porta da delegacia, me joga lá dentro e começa a gritar
muito comigo. Fui ficando com muito medo.
com força no braço. Eu subindo meu short, foi humilhante, horrível.
Eu tentando abotoar a bargilha e ele me jogando no meio da rua.
Um deles destranca a porta da delegacia, me joga lá dentro e começa a gritar
muito comigo. Fui ficando com muito medo.
Ameaçavam me prender
e ficavam entrando e saindo da delegacia, gritando comigo.
Eu
tive todos os medos do mundo, tanto deles levarem meu celular,
quanto deles me violentarem – esse foi o meu maior medo -, ou
me agredirem fisicamente.
Foi um monte de humilhação e ao mesmo
tempo uma sensação de culpa:
‘Por que eu fui fazer isso? Que estúpida que eu
fui por querer fazer
xixi na rua e perto de uma delegacia'.
A única hora
que eu achei que tinha ganhado um pouquinho de força lá foi quando
perguntei
porquê só eu tinha sido pega, sendo que havia mais gente fazendo xixi ali
na
frente. ‘É porque você deu azar’, ele dizia. Consegui firmar a
voz:
— Não, deve
ser porque eu sou mulher né, o resto era um monte de homem,
a mulher vocês
usam de força física pra botar aqui dentro.
De repente,
meu amigo volta com outra menina, amiga
dele, com a
cara cheia de glitter rosa, já chegou se impondo:
— O que
tá acontecendo? Eu sou advogada e ela é minha cliente.
Eles ficaram
argumentando que era atentado ao pudor e ela argumentava com
o código penal,
que já havia saído a resolução e isso não estava mais no código penal.
Eles
ficaram gritando e gritando. E, de repente, eles me soltaram e falaram
‘Quer
saber? Vai, vai embora, mas não passa mais aqui perto. Vaza, vaza’.
Eu sai da
frente deles e desabei de chorar. Agradeci muito a menina –
que eu nem
conhecia, na verdade -, ela foi incrível. Fiquei em choque por
tempo ainda com a questão da fragilidade do feminino naquela situação.
Meus
medos eram muito diferentes que os medos de um homem
naquela mesmo cenário.
No final eu
consegui rir de tudo, mas foram momentos de muita tensão que,
graças a
ela, eu consegui me livrar. Hoje, por conta disso tudo, ficamos
amigas e eu guardo o contato profissional dela para qualquer emergência
jurídica
que eu precisar ou para indicar”
Maria*, 34
anos
Eu meti a colher, sim!
“Estávamos
em um bloco em São Paulo e, no meio da folia, eu encontro uma
conhecida
do meu bairro discutindo com o namorado, uma briga feia.
Ele
ameaçava bater nelae, quando levantou a mão, eu entrei na frente
dela.
Quase apanhei, mas o empurrei de volta. Meus amigos seguraram
ele e
fiquei com a menina o dia todo. Ela chorava muito. O
motivo da briga?
cara deu em cima dela e ela não correspondeu, mas
não do jeito que ele
achava ideal, então foi brigar e querer bater nela. Vê
se pode!”
Catarina
Alves, 20 anos
Amigas me salvaram de caras que tentavam me beijar à força
“No Carnaval
do ano passado, eu fui com uma amiga a um bloco de
rua em São Paulo, durante a tarde. Lá encontramos mais outras meninas
e começamos a beber. Depois de algum tempo, comecei a passar muito mal,
de não conseguir parar em pé. Óbvio que chegaram babacas e tentaram
me agarrar, me beijar a força.
rua em São Paulo, durante a tarde. Lá encontramos mais outras meninas
e começamos a beber. Depois de algum tempo, comecei a passar muito mal,
de não conseguir parar em pé. Óbvio que chegaram babacas e tentaram
me agarrar, me beijar a força.
Nisso, minhas
amigas conseguiram me puxar, batendo neles,
xingando, empurrando. Elas me levaram para um centro
comercial e cuidaram de mim até eu conseguir voltar pra casa
minimamente. Depois desse episódio eu passei a beber bem menos
e a ficar muito mais ligada em festas e bares, infelizmente.
xingando, empurrando. Elas me levaram para um centro
comercial e cuidaram de mim até eu conseguir voltar pra casa
minimamente. Depois desse episódio eu passei a beber bem menos
e a ficar muito mais ligada em festas e bares, infelizmente.
Se eu
tivesse sozinha nesse dia – ou até mesmo tivesse me
perdido
das minhas amigas – eu poderia ter sido estuprada.
Dá muito medo pensar nessa possibilidade”.
das minhas amigas – eu poderia ter sido estuprada.
Dá muito medo pensar nessa possibilidade”.
Tami
Rodrigues, 21 anos
Em 15 minas, protestamos no banheiro e calamos as ofensas
“Eu estava
com um grupo de amigas num bloquinho e tinha uns
banheiros químicos teoricamente divididos por gênero, mas
o banheiro feminino estava com uma fila muito grande e o
masculino, que era ao lado, tinha uma fila menor.
banheiros químicos teoricamente divididos por gênero, mas
o banheiro feminino estava com uma fila muito grande e o
masculino, que era ao lado, tinha uma fila menor.
Uma mina entrou na fila do masculino e os homens que
ali estavam começaram
ali estavam começaram
a ofendê-la.
Falavam
coisas como “você é ‘traveco’ por acaso?” “mulher não entra
em banheiro de homem”, entre outras frases pesadas. De repente,
a gente percebeu a situação desigual: resolvemos todas da fila das mulheres
ir para a dos homens – coisa de 15 minas indo pra outra fila -, pra ver se
eles falariam algo. Eis que não se ouve a voz de mais ninguém. Depois
em banheiro de homem”, entre outras frases pesadas. De repente,
a gente percebeu a situação desigual: resolvemos todas da fila das mulheres
ir para a dos homens – coisa de 15 minas indo pra outra fila -, pra ver se
eles falariam algo. Eis que não se ouve a voz de mais ninguém. Depois
deixamos a menina como próxima no banheiro feminino e ela nos
agradeceu
por defendê-la.”
por defendê-la.”
Catarina
Alves, 20 anos
Ela tirou a blusa dela e me deu!
“Uma vez,
numa festa, uma amiga estava fazendo aniversário, bebeu muito
e começou a passar mal. Eu tive a brilhante ideia de colocar ela deitada
no meu ombro, quando ela vomitou, sujando toda a minha blusa!
Eu fui pro banheiro arrasada, porque significava fim de
noite pra todo mundo.
e começou a passar mal. Eu tive a brilhante ideia de colocar ela deitada
no meu ombro, quando ela vomitou, sujando toda a minha blusa!
Eu fui pro banheiro arrasada, porque significava fim de
noite pra todo mundo.
Comecei a
lavar minha camiseta, desesperada, e estava frio demais.
Eis que surge
uma moça, tira a blusa dela – nunca vou esquecer -,
uma blusinha cinza
de gola alta com manga comprida, e me dá. Depois,
ela fechou o
casaco dela e foi embora. Foi a anja da minha noite!”
Letícia Maia, 24 anos
Reconheci um assédio e intercedi
“Tinha
acabado de chegar em casa do bloco, já era noite. Eu tenho
um vizinho bem machista, sabia porque era amiga de infância
da filha dele. Quando era mais nova, ele ficava me olhando.
Quando passava pela portaria, o vi com uma menina mais
nova que eu, aparentemente alterada.
um vizinho bem machista, sabia porque era amiga de infância
da filha dele. Quando era mais nova, ele ficava me olhando.
Quando passava pela portaria, o vi com uma menina mais
nova que eu, aparentemente alterada.
Imaginei,
por um momento, que fosse alguma parente, conhecida,
talvez. Mas, depois, percebi que ele estava insistindo bastante pra
que ela subisse no apartamento dele e encostava nela. Ela visivelmente
não queria, então perguntei ‘quer que eu te chame um táxi?’ e ela fez uma
cara de ‘sim, pelo amor de Deus’.
talvez. Mas, depois, percebi que ele estava insistindo bastante pra
que ela subisse no apartamento dele e encostava nela. Ela visivelmente
não queria, então perguntei ‘quer que eu te chame um táxi?’ e ela fez uma
cara de ‘sim, pelo amor de Deus’.
Ele dizia
‘não, eu levo ela pra casa’, firmei a voz. Ele me estranhou e
subiu, bravo. Eu fiquei com a moça e conversamos. Ela tinha sido abandonada
pelo namorado no meio do bloco (nada seguro), depois de uma briga.
Meu vizinho havia abordado ela na rua, se oferecido para levá-la em casa,
mas chegando lá fez pressão pra outra coisa. Eu chamei um Uber e ela foi embora,
em segurança.”
subiu, bravo. Eu fiquei com a moça e conversamos. Ela tinha sido abandonada
pelo namorado no meio do bloco (nada seguro), depois de uma briga.
Meu vizinho havia abordado ela na rua, se oferecido para levá-la em casa,
mas chegando lá fez pressão pra outra coisa. Eu chamei um Uber e ela foi embora,
em segurança.”
Anônima, 29
anos
SOBRE @ AUTOR@: AMANDA NEGRI
Amanda é paulistana e estudante de Ciências Sociais,
porém muito encantada com o mundo da comunicação
e das artes, principalmente a fotografia, pela qual carrega
uma paixão antiga. Acredita que se tornou feminista ainda
pequena, quando sofria bullying por jogar futebol na escola.
Mas se rotula (e esse é o único rótulo que gosta) dessa
forma há poucos anos quando foi introduzida ao feminismo,
através principalmente de uma professora do Ensino Médio
e das redes sociais. Está sempre aberta (e muito animada! rs) para novos
aprendizados.
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