13 de fev. de 2017

#UmaMinaAjudaAOutra - AzMina, Carnaval 2017


Foliãs unidas no carnaval 2016. Foto: Maurício Araújo


Conhecida ou não, vá para os blocos e festas preparada para oferecer ajuda para qualquer mulher que precise. E a gente dá umas ideias de como colocar a campanha em prática




Publicado 05/02/2017 por AMANDA NEGRI
ERRATA: Na última versão da reportagem, esquecemos de mencionar 
que a campanha do ano passado #CarnavalSemAssédio foi feita 
em parceria com o Catraca Livre, o Vamos Juntas?, o #AgoraqueSãoElas 
e o Nós, Mulheres da Periferia, que fizeram 
uma linda folia feminista conosco.

Diariamente nos vemos expostas a situações de assédio, medo e violência
simplesmente por sermos mulheres. O Brasil é o quinto país em que 
mais mulheres são assassinadas no mundo e, por aqui, acontecem 
mais de meio milhão de estupros anualmente. Agressões cuja
culpa, frequentemente, é colocada sobre a mulher por causa de uma
cultura que nos educa a pensar assim: roupa muito curta, estava bêbada, 
estava querendo, ela dá pra qualquer um, e por aí vai… 
Se no dia a dia isso já gritante, imagine
no Carnaval! 

Um período que deveria ser leve e divertido com frequência acaba 
se tornando um evento em que policiamos fantasias e comportamentos
por medo do que pode acontecer. E acontece, como foi com Tami Rodrigues, 
enquanto tentava se recuperar da bebedeira, começou a ser 
assediada por homens que tentavam beija-la à força.

“Depois desses episódios eu passei a beber bem menos e a ficar 
muito mais ligada em festas e bares, infelizmente.”

Mas isso não é, nem de longe, normal. Por isso, no
ano passado
 tentamos educar os homens para um #CarnavalSemAssédio, 
junto com o Catraca Livre, o Vamos Juntas?, o #AgoraqueSãoElas e 
o Nós, Mulheres da Periferia. E esperamos que o sucesso 
das dicas de 2016 continue repercutindo este ano.


Nosso foco, neste ano, são as minas. Mesmo que o assédio continue
acontecendo, não precisamos encará-lo sozinhas. Afinal, um dos lemas
do feminismo é a sororidade, ou seja, a irmandade entre as mulheres
E isso também é sobre socorrer uma mina passando mal no meio da rua
É sobre se meter numa briga para defender outra mulher. 
É sobre não concordar e lutar contra qualquer tipo de assédio, 
abuso ou tentativas. É sobre oferecer companhia. É sobre prestar ajuda,
do jeito que for e pra quem for, principalmente quando se trata de outras mulheres.
Nesse carnaval, #UmaMinaAjudaAOutra.
E isso pode fazer toda a diferença, como lembra Maria*. No último Carnaval, ela foi
levada para uma delegacia por fazer xixi na rua, sendo agredida verbalmente 
pelos policiais. Tinha certeza que as coisas terminariam mal até que 
uma advogada que ela nem sequer conhecia largou a 
folia de lado e a resgatou.


Para inspirar, confira mais histórias como essas, que rolaram em outros Carnavais –
e vão crescer feito grama nesta aqui 
Uma desconhecida me resgatou na delegacia
“Estava acompanhada de um amigo e tinha bebido duas latinhas de 
cerveja e muita água, não estava alcoolizada ainda, mas me deu 
muita vontade de urinar. As filas estavam gigantescas. Eu fiquei
muito desanimada pra encarar, mas era o que tinha. 
Ai meu amigo disse: 

— Tem uma galera fazendo xixi nessa ruazinha, vamos lá
Retruquei:

— Não vou arriscar fazer xixi na rua à luz do dia (devia ser uma ou duas da tarde). 

Você é homem e fica de costas, mas mulher não dá, vou ter que agachar. 
Eu sei que ele fez, e eu fui ficando apertada. Então vi um lugar que tinham dois 
carros estacionados, uma área de recuo, mais discreta, e, no desespero, pensei: 
vou encarar. Enquanto eu to fazendo o xixi, ouço uma sirene de polícia. De repente 
para um carro ali, a galera toda começa a correr, e aparecem dois caras do GOE 
(Grupo de Operações Especiais de São Paulo), inteiros de preto. Parei o xixi no meio, 
subi meu short. Eles tiraram o meu amigo da frente e me pegaram 
com força no braço. Eu subindo meu short, foi humilhante, horrível. 
Eu tentando abotoar a bargilha e ele me jogando no meio da rua. 
Um deles destranca a porta da delegacia, me joga lá dentro começa a gritar
muito comigoFui ficando com muito medo

Ameaçavam me prender e ficavam entrando e saindo da delegacia, gritando comigo. 
Eu tive todos os medos do mundo, tanto deles levarem meu celular, quanto deles me violentarem – esse foi o meu maior medo -, ou me agredirem fisicamente
Foi um monte de humilhação e ao mesmo tempo uma sensação de culpa: 
Por que eu fui fazer isso? Que estúpida que eu fui por querer fazer 
xixi na rua e perto de uma delegacia'. 

A única hora que eu achei que tinha ganhado um pouquinho de força lá foi quando 
perguntei porquê só eu tinha sido pega, sendo que havia mais gente fazendo xixi ali 
na frente. ‘É porque você deu azar’, ele dizia. Consegui firmar a voz: 

— Não, deve ser porque eu sou mulher né, o resto era um monte de homem, 
a mulher vocês usam de força física pra botar aqui dentro.
De repente, meu amigo volta com outra menina, amiga dele, com a 
cara cheia de glitter rosa,  já chegou se impondo: 

— O que tá acontecendo? Eu sou advogada e ela é minha cliente. 
Eles ficaram argumentando que era atentado ao pudor e ela argumentava com 
o código penal, que já havia saído a resolução e isso não estava mais no código penal. 
Eles ficaram gritando e gritando. E, de repente, eles me soltaram e falaram 
‘Quer saber? Vai, vai embora, mas não passa mais aqui perto. Vaza, vaza’.

Eu sai da frente deles e desabei de chorar. Agradeci muito a menina – 
que eu nem conhecia, na verdade -, ela foi incrível. Fiquei em choque por 
tempo ainda com a questão da fragilidade do feminino naquela situação.  
Meus medos eram muito diferentes que os medos de um homem 
naquela mesmo cenário.

No final eu consegui rir de tudo, mas foram momentos de muita tensão que, 
graças a ela, eu consegui me livrar. Hoje,  por conta disso tudo, ficamos 
amigas e eu guardo o contato profissional dela para qualquer emergência jurídica 
que eu precisar ou para indicar”
Maria*, 34 anos
Eu meti a colher, sim!
“Estávamos em um bloco em São Paulo e, no meio da folia, eu encontro uma 
conhecida do meu bairro discutindo com o namorado, uma briga feia. 
Ele ameaçava bater nelae, quando levantou a mão, eu entrei na frente dela. 
Quase apanhei, mas o empurrei de volta. Meus amigos seguraram ele e 
fiquei com a menina o dia todo. Ela chorava muito. O motivo da briga? 
cara deu em cima dela e ela não correspondeu, mas não do jeito que ele 
achava ideal, então foi brigar e querer bater nela. Vê se pode!”
Catarina Alves, 20 anos
Amigas me salvaram de caras que tentavam me beijar à força
“No Carnaval do ano passado, eu fui com uma amiga a um bloco de
rua em São Paulo, durante a tarde. Lá encontramos mais outras meninas 
e começamos a beber. Depois de algum tempo, comecei a passar muito mal
de não conseguir parar em pé. Óbvio que chegaram babacas e tentaram
 me agarrar, me beijar a força.

Nisso, minhas amigas conseguiram me puxar, batendo neles, 
xingando, empurrando. Elas me levaram para um centro 
comercial e cuidaram de mim  até eu conseguir voltar pra casa 
minimamente. Depois desse episódio eu passei a beber bem menos 
e a ficar muito mais ligada em festas e bares, infelizmente
Se eu tivesse sozinha nesse dia – ou até mesmo tivesse me perdido 
das minhas amigas – eu poderia ter sido estuprada. 
Dá muito medo pensar nessa possibilidade”.
Tami Rodrigues, 21 anos
Em 15 minas, protestamos no banheiro e calamos as ofensas
“Eu estava com um grupo de amigas num bloquinho e tinha uns 
banheiros químicos teoricamente divididos por gênero, mas 
o banheiro feminino estava com uma fila muito grande e o 
masculino, que era ao lado, tinha uma fila menor
Uma mina entrou na fila do masculino e os homens que 
ali estavam começaram 
a ofendê-la. 

Falavam coisas como “você é ‘traveco’ por acaso?” “mulher não entra
em banheiro de homem”, entre outras frases pesadas. De repente, 
a gente percebeu a situação desigual: resolvemos todas da fila das mulheres 
ir para a dos homens  – coisa de 15 minas indo pra outra fila -, pra ver se 
eles falariam algo. Eis que não se ouve a voz de mais ninguém. Depois
deixamos a menina como próxima no banheiro feminino e ela nos agradeceu
por defendê-la.”

Catarina Alves, 20 anos
Ela tirou a blusa dela e me deu!
“Uma vez, numa festa, uma amiga estava fazendo aniversário, bebeu muito 
e começou a passar mal. Eu tive a brilhante ideia de colocar ela deitada 
no meu ombro, quando ela vomitou, sujando toda a minha blusa
Eu fui pro banheiro arrasada, porque significava fim de 
noite pra todo mundo.

Comecei a lavar minha camiseta, desesperada, e estava frio demais. 
Eis que surge uma moça, tira a blusa dela – nunca vou esquecer -, 
uma blusinha cinza de gola alta com manga comprida, e me dá. Depois, 
ela fechou o casaco dela e foi embora. Foi a anja da minha noite!”

Letícia Maia, 24 anos
Reconheci um assédio e intercedi
“Tinha acabado de chegar em casa do bloco, já era noite. Eu tenho 
um vizinho bem machista, sabia porque era amiga de infância 
da filha dele. Quando era mais nova, ele ficava me olhando. 
Quando passava pela portaria, o vi com uma menina mais 
nova que eu, aparentemente alterada.

Imaginei, por um momento, que fosse alguma parente, conhecida, 
talvez. Mas, depois, percebi que ele estava insistindo bastante pra 
que ela subisse no apartamento dele e encostava nela. Ela visivelmente 
não queria, então perguntei ‘quer que eu te chame um táxi?’ e ela fez uma 
cara de ‘sim, pelo amor de Deus’.

Ele dizia ‘não, eu levo ela pra casa’, firmei a voz. Ele me estranhou e 
subiu, bravo. Eu fiquei com a moça e conversamos. Ela tinha sido abandonada 
pelo namorado no meio do bloco (nada seguro), depois de uma briga. 
Meu vizinho havia abordado ela na rua, se oferecido para levá-la em casa, 
mas chegando lá fez pressão pra outra coisa. Eu chamei um Uber e ela foi embora, 
em segurança.

Anônima, 29 anos

SOBRE @ AUTOR@:

Amanda Negri
Amanda é paulistana e estudante de Ciências Sociais, 
porém muito encantada com o mundo da comunicação 
e das artes, principalmente a fotografia, pela qual carrega 
uma paixão antiga. Acredita que se tornou feminista ainda 
pequena, quando sofria bullying por jogar futebol na escola. 
Mas se rotula (e esse é o único rótulo que gosta) dessa 
forma há poucos anos quando foi introduzida ao feminismo,
através principalmente de uma professora do Ensino Médio 
e das redes sociais. Está sempre aberta (e muito animada! rs) para novos 
aprendizados.

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