22 de jan. de 2018

Natalie Portman contra Hollywood: “Vivi num ambiente de terrorismo sexual aos 13 anos” - El país


Natalie Portman fala em poucas palavras do papel que a "violência sexual", mesmo enquanto ameaça, cumpre em nosso modelo societário: que é inibir ou bloquear o desenvolvimento e a autonomia sexual das mulheres.
Quantas de nós já não fez como a menina Portman, deixar de expressar nossa sensualidade (força propulsora de afetos e vínculos essenciais no desenvolvimento humano - veja abaixo a teoria de Maturana sobre neotenização) para se proteger dos assédios ou ser respeitada em seus espaços sociais - estudos, profissão, ativismo dentro outras atividades? (Cida Alves).

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De acordo com Maturana (2000), a espécie humana pertence a uma linhagem neotênica¹, nela ocorreu uma progressiva expansão das características da infância na vida adulta. Além de conservar os traços anatômicos e fisiológicos da infância na vida adulta esse processo também conservou nessa fase as dinâmicas relacionadas à relação materno-infantil. Segundo ele é na dinâmica da relação materno-infantil que surge o amor². Esse sentimento é primário da cultura humana, pois é ele que institui 

O domínio daquelas condutas nas quais o outro surge como um legítimo outro em coexistência com alguém. O amor implica na aceitação mútua e, na relação materno-infantil, em confiança e a aceitação total da proximidade e contato corporal do outro, de qualquer sexo, sem utilização nem instrumentalização das relações, isto é, sem o emocionar que nega o outro em benefício próprio. Nós, os seres humanos modernos, somos animais dependentes do amor em todas as idades, e pensamos em nossa linhagem como uma característica neotênica (MATURANA, 2000, p. 70).


Outra característica da neotenização de nossa linhagem está associada a expansão da sexualidade da fêmea. O sexo como fonte de prazer promove a aceitação e desejo da proximidade do corpo do outro. Essa aceitação abriu espaço para a intimidade do conhecimento mútuo numa convivência muito próxima. A expansão da sexualidade da fêmea gerou espaços de intimidade estável que instituiu vínculos e convivências de caráter cooperativo que agregou fêmeas, machos e filhos em pequenas famílias. As características neotênicas da linhagem humana propiciaram a expansão da sensualidade e da ternura, que eram específicas da relação materno-infantil, para a fase adulta.

Maturana (2000) define sensualidade com uma abertura sensorial e a ternura como o comportamento de cuidado em relação com os outros. Nesse sentido, a sexualidade, a ternura e a sensualidade são as dimensões relacionais básicas que constituíram as unidades, pequenas famílias, de um viver em cooperação e consensualidade. Sensualidade, intimidade, ternura, são os fundamentos primários da cultura humana. De acordo com esse autor, esses fundamentos são antagônicos à maneira de viver da instrumentalização patriarcal, que se fundamenta em relações de domínio e sujeição.

A forma de viver que se concentra na apropriação e na luta pela dominação e sujeição converte a experiência sexual (hetero ou homossexual), que deveria ser fonte de intimidade e prazer, em uma forma de manipulação. A sociabilidade que se configura em uma relação dominação/sujeição

Restringe a sensualidade, a ternura e a inteligência devido ao fato de se focalizar a atenção principalmente num só tema fundamental, o tema da dominação e da sujeição. O crescimento epidêmico do patriarcado, na expansão da instrumentalização de todas as relações no domínio das dinâmicas políticas e comerciais, torna impossível que a relação primária mãe-filho e o crescimento das crianças no respeito por si mesmas e na consciência moral tenham lugar de maneira espontânea na conservação do humano. Nessas circunstâncias, é necessária a reflexão que expande o entendimento para levar a uma convivência amorosa que conserve o humano (MATURANA, 2000, p. 80).

1 - O termo neotônia, junção do vocábulo neo (novo) com o tenia (estender), denomina uma característica presente na cultura humana que consiste em estender as funções materno-infantis para além da primeira fase de vida dos filhos. Os pais humanos estendem até a fase adulta os cuidados maternos-infantis que na maioria das linhagens animais se restringe aos primeiros meses de vida dos filhotes.
2- “O amor não tem fundamento racional, não se baseia num cálculo de custos e benefícios, não é bom, não é virtude, nem dom divino, mas simplesmente o domínio dos comportamentos que constituem o outro como legítimo outro em convivência com alguém” (MATURANA, 2000, p. 85).

Veja sobre a função da sensualidade\sexualidade no desenvolvimento da cultura humana no item 4.3.1 Educar sob a ordem da mãe: cuidado e conexão com a vida e o mundo do capítulo IV da minha tese “Alforriapelo sensível: corporeidade da criança e formação docente”.


Natalie Portman contra Hollywood: “Vivi num ambiente de terrorismo sexual aos 13 anos”

Atriz revelou os traumas que sofreu ao conseguir a fama com seu papel em ‘O Profissional’




A atriz Natalie Portman attends na marcha das mulheres em Los Angeles.
A atriz Natalie Portman attends na marcha das mulheres em Los Angeles. AFP
 



Natalie Portman é um dos rostos mais visíveis da plataforma contra o assédio sexual e a discriminação Time’s Up. Semana passada, ela expressou ante Oprah Winfrey a sentença “Dylan, eu acredito em você” que outros artistas agora entoam. É também a artífice do “E aqui estão todos os homens indicados” que anunciou — e viralizou — no Globo de Ouro, ao apresentar o prêmio de melhor direção. A atriz também subiu ao palco da Marcha das Mulheres realizada em Los Angeles no sábado passado, junto com artistas como Viola Davis e Eva Longoria. Diante da multidão, decidiu dividir suas experiências traumáticas na indústria do cinema, especialmente no início, quando filmou O Profissional aos 12 anos e viveu um “terrorismo sexual” aos 13, pouco depois da estreia.

Vencedora do Oscar, Portman compareceu à marcha ao lado da senadora democrata Kamala Harris. E contou que, quando o filme estreou, finalmente pôde abrir a primeira carta de um fã: “uma fantasia de um estupro” escrita por um homem. “Numa rádio local, faziam contagem regressiva para meu 18.o aniversário. Eufemisticamente, era a data em que já poderiam dormir comigo porque seria legal. Os críticos falavam de meus ‘seios incipientes’ em suas resenhas. Entendi rapidamente, mesmo sendo uma menina de 13 anos, que, se eu me expressasse sexualmente, me sentiria insegura e os homens se sentiriam no direito de discutir e coisificar meu corpo, apesar do grande desconforto que isso me provocaria.” A atriz afirmou no discurso que chegou a modificar seu comportamento, rejeitou papéis que incluíssem beijos e enfatizou seu lado “intelectual e sério”. Denunciou que teve de construir uma reputação baseada numa moral “recatada, conservadora, nerd e séria” para poder sentir que seu “corpo estava a salvo” e que seus pares a “escutariam”.

“Com 13 anos, a mensagem de nossa cultura foi clara para mim: senti a necessidade de cobrir meu corpo, inibir minhas emoções e meu trabalho para enviar a minha própria mensagem ao mundo de que era alguém que merecia respeito e segurança. A resposta a essa forma de ser, de pequenos comentários sobre meu corpo até frases muito mais ameaçadoras, serviram para controlar meu comportamento num ambiente de terrorismo sexual”, completou. (El país - acesse a reportagem completa AQUI).


Foto: divulgada no site Por dentro da bolha

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